Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/05/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_27.html antes
de ler esta postagem:
Voltando
ao questionamento de Adam Smith sobre “o nosso desejo de que os demais não se
prejudiquem”, ainda que para isso tenhamos de renunciar aos interesses
particulares, o filósofo destacava que isso se deve a alguma “força mais
forte”, a própria consciência (“a razão, o princípio, a consciência, o
habitante do peito, o homem interior, o grande juiz e árbitro de nossa conduta”).
A lista nos faz pensar a respeito da empatia e as motivações que nos
levam a agir a partir de um senso de solidariedade e “camaradagem”. Mas a
“heterogeneidade” nela contida pode ser indicativa de que o próprio autor
tivesse dificuldade para acertar uma definição mais categórica...
A autora sugere que Adam
Smith talvez imaginasse que os “apelos emocionais ao sentimento de camaradagem
pudessem tornar a empatia mais eficaz”. De acordo com Lynn Hunt, é mais ou menos
isso o que muitos ativistas dos direitos humanos de nosso tempo fazem. Tanto os
críticos do século XVIII, a época de Smith, quanto os atuais ressaltariam que,
para a empatia proporcionar alterações positivas nas relações entre as pessoas e
entre os grupos sociais, a religião tem importante papel, já que pode incutir “o
senso de dever religioso” nos fiéis.
Os críticos alegam que a “propensão interior à apatia
ou ao mal” é muito grande e que os indivíduos não conseguem anulá-la por si
mesmos. O livro destaca a frase de “um antigo presidente da Ordem dos advogados
dos Estados Unidos” que corrobora o anteriormente exposto, dando a entender que,
isoladamente, “a ideia dos atributos humanos comuns não é suficiente”. Segundo
ele: “quando os seres humanos não são vistos como semelhantes a Deus, os seus
direitos básicos podem muito bem perder a sua ‘raison d’etre’ metafísica”.
(...)
Ainda problematizando a reflexão de Adam Smith no fragmento de “teoria
dos sentimentos morais”, o texto nos leva a pensar a respeito da tese por ele
levantada... A empatia do “homem humanitário” em relação aos que sofrem em
localidades distantes é inspirada e “está na mesma categoria dos sentimentos
por aqueles que lhe são próximos”.
Uma primeira questão que podemos levantar a partir do
raciocínio é em relação a qual motivação nos leva “a agir com base em nossos
sentimentos pelos que estão distantes”. A outra que temos de considerar (dada a
crueldade cada vez mais frequente de determinados grupos contra outros que, por
motivos diversos, lhe são próximos), pretende entender “o que faz o sentimento
de ‘camaradagem’ entrar num tal colapso que pode levar a torturar, aleijar ou
até matar os que nos são mais próximos”.
(...)
Desde a segunda metade do século XVIII, quando os movimentos sociais
passaram a contar com uma noção filosoficamente mais embasada dos direitos
humanos, “as tensões se tornaram mais mortíferas”.
Para termos uma ideia, o
texto esclarece que ao tempo das “ações contra o escravismo, a tortura judicial
e os castigos cruéis”, os ativistas propagavam narrativas aterradoras que abalavam
emocionalmente. Evidentemente faziam isso com a intenção de “provocar a repulsa”
aos tratamentos degradantes. Mas muitas vezes os discursos, leituras e até a
apresentação de “gravuras explícitas do sofrimento” acabaram despertando
sensações adversas àquelas originalmente pretendidas... E o mesmo ocorreu com
os romances que mereceram destaque no início das postagens sobre “A Invenção
dos Direitos Humanos”.
(...)
Como sabemos, os romances
despertavam “atenção intensa para os sofrimentos de moças comuns”, todavia o enredo
também podia suscitar interpretações que agradavam aos masoquistas.
Ao final
do século foram produzidos textos que alimentavam a fantasia que atendia aos
anseios deste público.
O livro cita “The Mank”, de 1796, escrito por Matthew Gregory Lewis, e
dá conta de que este romance gótico se esmera pelas “cenas de incesto, estupro,
tortura e assassinato”. A narrativa parece apelar para o sensacionalismo e
cumpre essa função “em detrimento do estudo dos sentimentos interiores ou
resultados morais”.
Especialista no gênero foi o marquês de Sade,
mas sobre ele trataremos na próxima postagem.
Leia: A
Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um
abraço,
Prof.Gilberto