sábado, 31 de outubro de 2015

“Estado de Sítio”, de Albert Camus – terceiro ato – Peste tinha de passar o comando da cidade para o que restava de Diogo; últimas provocações em seu “discurso de despedida”; o incompreendido e obstinado regime sempre emergiria graças à ética medíocre das lideranças políticas tradicionais; os antigos governantes estão às portas da cidade; “o amor? que é isso?”

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/10/estado-de-sitio-de-albert-camus_42.html antes de ler esta postagem:

Sabemos que a auxiliar de Peste era a própria Morte... Por isso é que na última postagem resolvemos assim denominá-la... No entanto é bom que se saiba que em seu texto, Camus não faz essa alteração.
(...)
Também estava próximo o momento em que Peste se retiraria da cidade com sua equipe de governo...
Ele exigiu que Diogo se levantasse. Pela última vez chamou-o de imbecil e anunciou que a cidade passava ao seu controle.
No mesmo instante o coro deu gritos de alegria. Peste virou-se na direção do grupamento e proferiu que ninguém ali devia julgá-lo derrotado... Pelo contrário! Anunciou que havia trabalhado muito bem em Cádiz e sabia que as pessoas jamais se esqueceriam dele... Elas deviam aproveitar para contemplar o “único poder deste mundo” (ele próprio)... Era a sua última oportunidade... Deviam reconhecer o soberano e aprender o medo.
O brutamontes ria enquanto provocava os ouvintes... Antes eles eram tementes a Deus e aos “seus acasos”... Nada a ver com o método e rigor de Peste! Deus só podia ser comparado a um anarquista e sua “mistura de estilos”! Poderoso e Bom ao mesmo tempo?
(...)
Ele insistiu... Disse que depois da experiência vivenciada as pessoas poderiam fazer uma comparação e reconhecer que o seu estilo primava pela eficiência... Ele escolhera dominar, escolhera o poder...
Sua mensagem era definitiva... As pessoas tinham de aceitar que seu sistema era “mais sério do que o inferno”... Sua atuação milenar produziu vítimas que abarrotam cemitérios e campos... Líbia, Etiópia, Pérsia... Incontáveis são os locais que podem testemunhar os horrores por ele impetrados... Milhares de fogueiras fúnebres e atmosferas infestadas por cinzas humanas... Os “fogos de purificação” na antiga Atenas... Até os deuses ficaram enojados...
A matança prosseguiu depois que os templos foram substituídos por catedrais... “Cavaleiros negros” continuaram o serviço. Peste não descansou e matou sem desanimar. Povos inteiros deviam ajoelhar-se aos seus pés... Essa escravidão passou a ser obtida graças ao aperfeiçoamento de sua técnica... Cada vez mais um “número menor de mortos bem escolhidos”...
(...)
Peste queria deixar bem claro que não há povo de grandes e belas realizações históricas que possa conter o seu avanço... Um revés aqui ou acolá, é verdade, mas no final ele triunfaria “de tudo”.
A secretária observou que “nem de tudo”... Restaria triunfar sobre a altivez... Peste corrigiu-a dizendo que a altivez talvez se cansasse... O próprio homem faria as “escolhas certas”.
(...)
O som de trombetas anunciou que não muito longe dali os antigos governantes chegavam para reocupar o poder... Peste fez questão de se dirigir ao povo mais uma vez... Disse que aqueles tipos retornavam “cegos às feridas” de todos e “ébrios de imobilidade e esquecimento”. A estupidez em breve tomaria o lugar mais alto da cidade... E sem combate algum! Certamente todos ali se tornariam fatigados.
Não era sem demonstrar revolta que Peste insinuava que aquele tipo de governante (que os habitantes de Cádiz conheciam bem) preparava o seu caminho... Há muitos espalhados pelo mundo e é por isso que ele podia manter-se firme, com força e esperança.
Chegará o dia em que todos entenderão os sacrifícios como algo bom e necessário? Algum dia as sedições populares serão totalmente desprezadas? Peste garantiu que quando isso ocorrer, então, ele triunfará no “definitivo silêncio da servidão”.
O tipo pôs-se a rir... Aconselhou que não se entusiasmassem... Garantiu que se tratava de um obstinado, e é por isso que mantinha baixa a sua fronte.
(...)
A Secretária observou que também aqueles pobres homens e mulheres tinham sua obstinação alimentada pelo amor que nutriam pela simplicidade de sua existência.
Peste já estava se retirando...
Mas voltou-se para perguntar: “O amor? Que é isso?”.
Leia: Estado de Sítio. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

“Estado de Sítio”, de Albert Camus – terceiro ato – a verdadeira identidade da secretária; Morte e sua indignação com o procedimento mecânico imposto por Peste; a afeição pelo corajoso Diogo; o momento derradeiro do jovem se aproxima; Vitória sofrerá

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A secretária apresentou-se no mesmo instante em que foi convocada.
Sua fisionomia fatigada mudou completamente...
Enfim sua verdadeira identidade foi revelada. Seu rosto envelhecido... Ela era a própria Morte!
(...)
Peste chamou a atenção de Morte... Reclamou que, diferentemente dele, ela não manifestava o ódio próprio daqueles que necessitam de “vítimas frescas”.
Morte confirmou... O ódio não a sustentava e não estava em suas funções... Argumentou que, de certa forma, aquilo era resultado do “método” de Peste (que se apoiava em suas fichas de organização). O tratamento dispensado aos mortais era tão “mecânico” que se tornava impossível perceber se eles inspiravam algum tipo de sentimento...
Peste tinha pressa... Apontou para Diogo, que já estava de joelhos, e pediu para ela cumprir a sua função.
Morte deixou claro que não deixaria de exercer o seu ofício... Todavia manifestou que não se sentia “muito à vontade”... É claro que Peste vociferou e quis saber o motivo de suas ordens não serem prontamente atendidas.
(...)
Por essa o ditador não esperava... Morte explicou que também possuía memória. Disse que havia sido livre no passado, e que as pessoas a associavam ao acaso. Por isso não a odiavam... Viam-na como a senhora “que termina tudo, fixa os amores, que dá forma a todos os destinos”.
Que tipo de mudança drástica se operara em Morte desde que passara a trabalhar com Peste? Outrora podia ocorrer de manifestar compaixão... Mas a parceria com o facínora a tornara “serviçal da lógica e do regulamento”...
(...)
Mas então havia quem pedisse socorro à Morte?
Sim. Ela mesma confirmou que os desvalidos e “menos fortes do que a desgraça” dirigiam-lhe clamores. Ou seja, quase todas as pessoas.
Morte disse que trabalhava no consentimento... Existia à sua maneira... Tratava-se de uma “relação natural”, bem diferente do mecanismo adotado por Peste, que levava os viventes listados a negá-la “até seu último suspiro”.
Essas eram as razões que talvez explicassem a afinidade de Morte em relação ao Diogo. Ele a escolhera livremente...
A velha senhora disse que amava os que marcavam encontro com ela... Pode ser que em seu interior admitissem piedade por ela.
(...)
Peste irritou-se. Vociferou que ninguém ali precisava de piedade.
Com serenidade, Morte respondeu que apenas “aqueles que não sentem compaixão por ninguém” precisavam de piedade.
O amor por Diogo podia ser entendido como a inveja que Morte sentia dele. Para os conquistadores como Peste e ela própria, o amor tomava a miserável “forma de inveja”.
Peste devia saber! Era por isso que os viventes lamentavam-nos como entidades.
(...)
Aquela que fazia o papel de eficiente secretária de Peste durante suas investidas nas realidades dos pobres mortais teve de ouvir um “calai-vos”!
Como que a justificar-se, ela relatou que não era difícil de entender que (de tanto matar) terminasse amando a inocência dos sentenciados...
Morte manifestou sua repugnância em relação às sombras... Invejava aqueles miseráveis, e apontou para o corpo inerte de Vitória dizendo que ela voltaria a viver “para soltar gritos de animal” (porque teria de passar o resto de seus dias sem a companhia do amado Diogo).
Vitória viveria amargurada... Mas Morte levou em consideração que a jovem se apoiaria no próprio sofrimento. Esse tipo de drama era-lhe digno de inveja.
(...)
Diogo estava quase caído. Peste o reergueu porque seu fim não podia se efetivar se Morte não o cravasse.
Estava difícil para o ditador admitir todo o sentimentalismo que se apossou de Morte... Mas ele sabia que “o que é preciso” seria executado, pois ela conhecia a regra e a sua função.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/10/estado-de-sitio-de-albert-camus_31.html
Leia: Estado de Sítio. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

“Estado de Sítio”, de Albert Camus – terceiro ato – ao manter-se fiel à convicção de que a história do povo humilde tem sido marcada por crimes dos inescrupulosos detentores do poder, Diogo triunfou sobre Peste; o mal seguirá sua trilha; não antes de celebrar a agonia do jovem

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/10/estado-de-sitio-de-albert-camus_29.html antes de ler esta postagem:

Diogo manifestou o amor que nutria pela sua gente...
Pelo visto se manteria fiel aos seus mais altos propósitos até o fim de seu entrevero com Peste.
O ditador ressaltou que o desprezo era a única expressão de fidelidade que devia ser dispensada àquele povo... Apontando para o coro, cujos integrantes revelavam-se prostrados, quis saber de Diogo se o seu sacrifício realmente valia a pena.
O rapaz reafirmou que o seu desprezo se destinava aos carrascos... Não importava o que Peste fizesse, seria sempre inferior aos que ele explorava... Não havia como compará-los à aberração que Peste representava... É claro que ocorriam crimes de mortes entre as gentes do povo, mas eles eram resultados da “loucura de um instante”.
(...)
O que dizer dos crimes praticados pelo regime de Peste e os massacres impetrados segundo sua “lei e lógica”?
O maior dos crimes que as gentes do povo cometessem poderia sempre ser desculpado. Bem diferente dos crimes contra eles cometidos...
O que dizer da criminosa ideia de Peste de a tudo codificar na “imunda ordem” imposta por ele?
As gentes do povo sofriam há séculos... Isso Diogo fez questão de escancarar ao ditador. Ele não devia rir ou troçar “de suas cabeças curvadas, pois há séculos o cometa do medo passa por cima deles”; nem de seu temor, pois “há séculos eles morrem e seu amor é dilacerado”.
(...)
Essas palavras foram como que a “última prova”.
Diogo triunfou sobre Peste, que revelou que caso aceitasse entregar-lhe a cidade, acabaria também perdendo Vitória.
Nada havia mais a ser feito. Cádiz ficaria livre do regime que estava apenas em seu início...
Como classificar um tipo como Diogo?
Peste o chamou de insensato... Tipos como ele morriam para “salvar o resto”...
(...)
Aqueles que torciam para que Diogo conseguisse livrar a cidade das mãos tirânicas de Peste, o veem como personalidade heroica...
Um pouco como o “salvador da pátria”, que merece o abraço da mulher amada ao final da história.
Há quem pense como Peste...
Esses concordariam com ele quando, depois de pensar, sentenciou que “o resto não merece ser salvo”.
(...)
Também Diogo tornou-se reflexivo...
Repetiu o juízo de Peste: “o insensato morre”...
A reação do ditador foi a de observar a hesitação de seu oponente.
Amarga foi a conclusão de Diogo ao estender que a honra que buscara seria encontrada apenas “entre os mortos”.
Peste revelava-se fatigado de toda aquela falação... Disse que Diogo devia se preparar... Pelo visto chegavam ao final de seu acerto de contas.
Diogo respondeu que estava pronto... Peste imprimiu-lhe novas marcas de infecção... Elas provocaram intensa dor e não foi por acaso que o jovem começou a se contorcer com evidente padecimento.
(...)
O ódio manifestado por Peste não podia ser mensurado.
Ele não escondia seu prazer ao contemplar seu inimigo “assistir a própria morte”.
Diogo gemia...
Peste teria de deixar a cidade.
Foi a teimosia daquele rapaz que o impediu de prosseguir com o seu projeto político em Cádiz...
Teria de recomeçar em outra paragem.
Chamou a secretária para que aquele trabalho fosse finalizado.
Leia: Estado de Sítio. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

“Estado de Sítio”, de Albert Camus – terceiro ato – prossegue o debate entre o facínora e o libertador; para o primeiro, o povo comum deve satisfazer-se com a justiça que o regime oferece; para o segundo, conhecedor das limitações de sua gente, ninguém pode arrogar para si toda a virtude; a “inversão da lógica do poder”

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/10/estado-de-sitio-de-albert-camus_28.html antes de ler esta postagem:

Diogo deixou claro que conhecia a “receita” dos ditadores... Eles ordenavam a morte “para suprimir o assassínio”; violentavam “para reparar a injustiça”... Faziam isso há séculos... Peste representava os facínoras que se arrogam “líderes de nações”; do tipo que “apodrecem a chaga do mundo” ao mesmo tempo em que despontam como “salvadores da pátria e curandeiros de todas as moléstias sociais”...
Tipos como Peste vivem a se vangloriar e fingem não saber que os mais esclarecidos desejam rir diante de suas caras.
Ele não se importou com as palavras. Sentenciou que não tinham coragem de rir diante dele porque ele era realizador...
Diogo deu de ombros e ironizou que a eficácia de seu oponente só podia ser comparada à do machado... Muito prático!
Peste também não se importou com a interpretação do rapaz... Disse que bastava olhar os cidadãos para perceber que “a justiça é bastante boa para eles”...
(...)
Diogo estava bem à vontade para falar... Disse que após a instalação do estado de sítio os cidadãos ficaram confinados entre os muros da cidade... De certo modo isso possibilitou que ele tivesse mais condições de observá-los com atenção.
A ironia não abalou Peste, que completou seu raciocínio dizendo que Diogo podia ter certeza de que todos aqueles cidadãos submetidos sempre o deixariam só, e o homem “só” deve morrer.
(...)
A discussão prosseguiu. Diogo quis dizer que Peste não tinha razão... Se, de fato, ele fosse “só” tudo seria bem simples... Mas a questão era que “por bem ou por mal” o povo dominado confiava nele e estava com ele.
Foi a vez de Peste ironizar... Sobre o último juízo de Diogo, ele comentou que seu rebanho era “belo, mas cheirava mal”.
O que havia de mal naquilo? Diogo quis saber, afinal tinha consciência de suas origens... Vivia para a cidade onde nascera e entendia que nem ele nem seus concidadãos eram puros... Entendia-se como um “tipo entre os seus” e estava engajado em seu tempo.
(...)
Mas que tempo era aquele dos homens de Cádiz?
Peste sentenciou que viviam a “época dos escravos”!
Diogo não aceitou e insistiam que viviam o “tempo dos homens livres”!
Onde estariam os homens livres? Peste provocou...
Diogo respondeu que eles deviam ser procurados nas prisões do regime e nos cemitérios... Nos tronos estavam os escravos.
(...)
Como vemos, o jovem revolucionário invertia a lógica do poder... Então Peste o desafiou a imaginar os “homens livres” usando o uniforme da polícia do regime.
O próprio Diogo entendia que seus liderados eram covardes e cruéis... Isso se evidenciara em diversas ocasiões. Mas se eles não tinham “direito ao poder”, esse também era o caso de Peste. Afinal, quem poderia arrogar para si toda virtude e usá-la como justificativa para investir-se de poder absoluto?
Diogo acrescentou que os humilhados por Peste tinham “o direito à compaixão”... Isso era algo que certamente seria recusado ao opressor...
(...)
Peste desprezava o modo de ser dos habitantes de Cádiz. E fez questão de manifestar isso mais de uma vez... Disse que viviam como covardes e que eram “pequenos, necessitados, sempre na mediocridade”.
Diogo respondeu que nada daquilo diminuía o seu amor pelo povo. E é por isso que ele se mantinha fiel aos mais altos propósitos...
Eventualmente isso podia se resumir à “pobre verdade” que compartilhava com aquela gente.
Leia: Estado de Sítio. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

“Estado de Sítio”, de Albert Camus – terceiro ato – Peste podia trazer Vitória à vida, mas Diogo teria de renunciar sua luta contra o regime; ao ditador interessava apenas o poder total; o jovem rebelde entende que não pode colocar o seu prazer pessoal acima da liberdade do povo; pode-se ser feliz sem fazer mal aos demais?

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/10/estado-de-sitio-de-albert-camus_27.html antes de ler esta postagem:

O “remédio” para aquela constatação estava em renunciar o engajamento na luta em defesa dos outros. Peste afirmou isso, mas não conseguiu convencer Diogo...
O jovem explicou que, depois de se enveredar pelo caminho das lutas sociais, não tinha como retroceder... Garantiu que o ditador podia esperar perturbações, pois jamais seria poupado pelos que queriam o fim do regime.
(...)
A situação estava posta.
Diogo estava disposto a sacrificar a própria vida para que sua amada permanecesse entre os viventes de Cádiz... Peste pretendia dissuadi-lo, mas dada a insistência do rapaz, deixou claro que seria obrigado a aceitar a troca...
Então Vitória poderia voltar a viver.
No entanto, deixando claro que tinha outros projetos, apresentou uma alternativa. Devolveria a vida à moça e permitiria que ambos fugissem para longe, deixando a cidade livre para os “seus cuidados”.
Diogo não aceitou... Disse que “conhecia seus poderes”.
(...)
Peste não ficou nem um pouco satisfeito com o que ouviu... Disparou que das duas uma: ou se tornava senhor absoluto de tudo; ou não seria senhor de nada.
Se Diogo saísse de seu controle, toda a cidade lhe escaparia.
Infelizmente, para Peste, aquilo era uma das consequências de antigas regras... Nem mesmo ele sabia “de onde elas vinham”...
Diogo afirmou que vinham “do mais fundo das idades”... E que se tratava de “regra da natureza”... Aquilo significava que “o povo havia vencido”.
O ditador não se deu por rogado. Garantiu que estava negociando tendo ao seu favor o corpo da jovem...
Sua proposta considerava devolver a respiração à Vitória, porém Diogo deveria optar entre morrer ou entregar a cidade aos seus caprichos.
(...)
Ainda havia amordaçados na cidade... Era possível ouvi-los murmurando.
Diogo contemplou Vitória...
Depois se virou na direção do coro e disse que “é duro morrer”. Peste concordou e repetiu a frase.
Após breve silêncio, Diogo sentenciou que “a morte é dura para todos”.
(...)
Peste percebeu que estava difícil fazer o rapaz mudar de opinião. Chamou-o de imbecil e esbravejou que ele ganharia muito mais se decidisse viver com Vitória... Sentenciou que “dez anos do amor desta mulher valem mais do que um século de liberdade daqueles homens” de Cádiz.
Diogo emendou que o amor que nutria por Vitória era algo que apenas a ele pertencia... Aquilo era o “seu reino” e podia fazer o que bem entendesse a respeito... Por outro lado, a liberdade das pessoas não lhe pertencia.
(...)
O ditador ainda quis convencê-lo... Afirmou que “ninguém pode ser feliz sem fazer mal aos demais”, pois a justiça da terra era essa mesma.
Diogo redarguiu dizendo que não nascera para consentir naquela justiça.
De sua parte, Peste observou que ninguém pedia tal consentimento... Simplesmente essa era a ordem do mundo; não era porque o rapaz não se conformava que ela seria alterada.
(...)
Na sequência há o desabafo de Diogo.
Ele apresenta a antítese de tudo o que os poderosos de todos os tempos cimentaram sobre os que sofrem dominação.
Mas isso fica para a próxima postagem.
Leia: Estado de Sítio. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

terça-feira, 27 de outubro de 2015

“Estado de Sítio”, de Albert Camus – terceiro ato – Vitória morre; Diogo se desespera e o coro das mulheres sintetiza a sua dor; o rapaz propõe morrer no lugar da amada; Peste quer envolvê-lo em seu plano de restaurar o poder; “coisas boas da vida” que as pessoas sem ambições podem aproveitar

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Várias pessoas chegaram... Elas vinham como que em cortejo; traziam o corpo de Vitória estendido numa maca.
Só então conseguimos relacionar a fuga de sua irmã da casa dos pais, e a ansiedade da menina ao apoderar-se do caderno da secretária... Só então podemos adivinhar o nome que ela procurou e riscou.
(...)
Diogo se aproximou... Os sentimentos que despertaram de seu coração eram dúbios... Avistar a amada naquelas condições o impulsionava a matar ou a ansiar pela própria morte?
Difícil saber.
O rapaz implorou à amada que não o abandonasse; que não se deixasse conduzir ao “outro mundo”. A morte de Vitória significaria o fim também para ele.
O coro de mulheres registrou o seu momento de dor. Sintetizou que quando a “morte rasga a garganta daqueles que amamos” compreendemos amargamente que não temos mais tempo para o amor...
(...)
Era notório que Diogo havia se desprendido dessa relação enquanto esteve engajado na luta contra o regime de Peste... Mas havia essa contradição... O amor voltava ao seu coração quando o destino não lhe era mais favorável.
(...)
A situação de Vitória era muito delicada... Mas um frágil coração ainda palpitava em seu peito. Diogo escutou o seu tímido gemido e isso o empolgou... Enfim ela podia ouvir suas palavras de incentivo e reconhecimento por dar-lhe força nos momentos mais difíceis. Sim! Ele jamais deixou de pensar nela enquanto esteve em combate.
Vitória conseguiu manifestar o seu lamento. Tudo o que Diogo conseguiu ouvir foi que, para ela, era certo que seria esquecida por ele... Teve energia ainda para dizer que se sentia atormentada por isso naquele momento de morte.
(...)
A jovem disse isso e virou-se.
Tudo indicava que aqueles eram os seus estertores.
Enquanto a morte a levava, o coro de mulheres fez o comentário a respeito da “beleza real” que acabava de deixar este mundo...
Pobre Diogo... Podia apenas soltar a sua voz reclamando o impossível... Acusar-se equivaleria a reconhecer o arrependimento... O corpo da bela Vitória era a sua “pátria”... Sua memória não a resgataria.
(...)
Peste se aproximou de Diogo. Entre os dois jazia Vitória... O ditador quis saber se o rapaz renunciava ao seu projeto político... De sua parte, Peste desejava apenas o poder. Via que o moço estava fragilizado e com o olhar perdido.
Diogo propôs morrer no lugar de sua amada...
Peste desconversou e garantiu que aquelas palavras só podiam ser resultado de sua estafa... Garantiu que o pior para Vitória já estava feito.
Diogo insistiu que sua proposta era típica daqueles que são fortes.
Mais uma vez a questão sobre “quem tem a força” foi discutida... Peste insistiu que ele mesmo incorporava a força...
Diogo sugeriu-lhe que tirasse o uniforme militar.
O ditador disse que o rapaz só podia estar louco ao apresentar tal proposta. Diogo o provocou ao garantir que, despidos de seus uniformes, os “homens da força” não são nem um pouco belos.
(...)
Peste retornou ao assunto principal da conversa... Disse que “a vida tem coisas boas”. Talvez fosse melhor o rapaz pensar a respeito de seu projeto de “morrer no lugar de Vitória”.
Certamente o ditador arquitetava alguma manobra para reconquistar a cidade de modo definitivo e, de alguma maneira, esperava envolver Diogo em seus planos.
O moço explicou que sua vida era nada... As razões de viver são o que devemos levar em consideração.
Peste enumerou algumas situações em que os homens comuns valorizam em seu cotidiano: “o primeiro cigarro; o odor da poeira, ao meio do dia, sobre os aterros; as chuvas da noite; a mulher ainda desconhecida; o último copo de vinho”...
Diogo não discordou... Tudo aquilo, de fato, era “alguma coisa”... Mas garantiu que Vitória viveria melhor do que ele.
Leia: Estado de Sítio. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

domingo, 25 de outubro de 2015

“Estado de Sítio”, de Albert Camus – terceiro ato – num ato de vingança, o nome da irmã de Vitória foi riscado da lista; o povo revoltado disputa o direito de justiçamento; Diogo elimina o caderno da discórdia, mas há uma duplicata; Peste tenta dissuadir o destemido jovem; os rebeldes avançam sobre as tropas do ditador, que manifesta o seu desprezo por tudo e todos; Nada e seu manifesto

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A confusão se estabeleceu...
As pessoas avançaram para cima da irmã de Vitória e subtraíram-lhe o caderno da secretária... Encontraram o nome da garota e imediatamente riscaram-no. A pobre coitada caiu sem dar um grito sequer.
Nada, que estava observando a tudo silenciosamente, pôs-se a bradar... Disse que todos estavam “unidos pela supressão”... Uns suprimiriam aos outros e disso resultaria a “limpeza geral”... O bêbado delirava com a situação que unia (num só êxtase) oprimidos e opressores.
(...)
O caderno estava nas mãos de um tipo enorme... Ele concordou que algumas limpezas precisavam ser feitas, os “alvos” deviam ser principalmente aqueles que se refestelaram e comeram do bom e do melhor enquanto a maioria se arrebentava de fome e pavor.
(...)
Peste reapareceu. O cenário provocou nele grande gargalhada.
Todos se tornaram imóveis e voltaram a ele os seus olhares.
A secretária acomodou-se ao seu lado enquanto os guardas tratavam de restabelecer a ordem e as marcas do regime.
O ditador virou-se para Diogo e resumiu que aqueles pelos quais lutava atacavam-se, poupando o trabalho do regime. Valia a pena sacrificar-se por aqueles tipos?
Diogo não deu atenção. Em vez disso, com a ajuda do pescador, atirou-se sobre o corpulento para arrancar-lhe o caderno. O rapaz rasgou-o na esperança de tornar impossíveis as tarefas da secretária.
Ela manifestou que seu esforço era inútil porque havia uma duplicata.
O rapaz disse aos camaradas que eles haviam sido enganados... Era preciso retomar o trabalho.
Peste sentenciou que aquelas pessoas reservavam para si mesmas o sentimento de temor... E, ao mesmo tempo, destinavam o seu ódio aos demais...
Diogo quis corrigi-lo anunciando que nem medo nem vitória interessavam... O que traria a vitória ao seu povo seria o avanço organizado sobre os inimigos... Os guardas recuaram.
(...)
Peste exigiu silêncio.
Discursou de modo que até os mais afastados pudessem ouvir.
Em síntese deixou claro que se tratava de um tipo muito mau. Era ele quem azedava o vinho e dessecava os frutos; matava o sarmento no instante mesmo em que estava para surgirem uvas, e o fazia verde quando todos o queriam para produzir fogo.
Não escondeu sua aversão às pessoas simples, às suas alegrias e desejo de serem livres...
Peste odiava aquele país... Todos deviam esperar o pior!
As prisões e os carrascos estavam sob seu controle... E mais a força e o sangue...
Seu desejo não era outro senão o de arrasar Cádiz. Uma vez arrasada, não haveria nem mesmo como resgatar sua história...
Silêncio! Deixou claro que apenas o silêncio é marca das “sociedades perfeitas”.
(...)
Aqueles que assistem à encenação ouvem uma série de sons conflitantes (“ranger de serrote; zumbidos; clarões de irradiação”). Dois grupos estão lutando... Os gestos em mímica revelam isso! Os homens de Peste sofrem para conter o grupo de Diogo. Quando a agitação diminui, nota-se que os rebeldes vencem a peleja.
(...)
Peste irritou-se profundamente... Bradou que ainda restavam os reféns.
O bêbado da cidade, Nada, disse que “sempre restaria alguma coisa”. Os (seus) escritórios e tudo o mais continuariam... Ainda que a cidade ruísse e os homens desertassem, “os escritórios se abririam em horário fixo, para administrar o nada”... O tipo concluiu sua fala dizendo que “o paraíso tem seus arquivos e mata-borrões”. Ele mesmo era a eternidade.
(...)
Nada se retirou.
O coro cantou a vitória...
O verão, enfim, terminava em vitória. Ela traria toda felicidade que os homens mereciam (as mulheres amadas; o vinho jorrando em inesgotáveis fontes; as flores).
Leia: Estado de Sítio. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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