Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/05/o-estrangeiro-de-albert-camus-as-horas.html antes
de ler esta postagem:
O
cortejo fúnebre seguiria conforme as orientações do mestre de cerimônias... À
frente do carro iria o padre; os quatro homens de preto caminhariam ao lado do
veículo; Meursault e o diretor seguiriam atrás; e, mais atrás ainda, a
enfermeira junto com o Sr. Perez.
O dia dera em muito bonito e quente. Meursault não
sabia o motivo de se demorarem “mais do que o necessário” até que começassem a
caminhar. A roupa escura o incomodava e ele notou que também o velho Perez
havia tirado o chapéu por não suportar o calor.
O diretor pôs-se a falar ao
rapaz exatamente a respeito do velho e da mãe falecida... Disse que muitas
vezes os dois seguiam à aldeia para passeios noturnos. Evidentemente eram
acompanhados por uma enfermeira... Meursault dava pouca atenção à conversa,
pois distraia-se com a vista dos campos e sentia que a observação “das linhas
de ciprestes que levavam às colinas perto do céu, desta terra ruiva e verde,
destas casas raras e bem desenhadas” o levava a uma compreensão a respeito da
mãe...
Imaginou que quando a noite chegava, aquelas paragens
deviam experimentar “um melancólico período de tréguas”. Mas o momento era de
muito calor e a paisagem toda estremecia e se tornava “deprimente e inumana”.
(...)
Conforme o cortejo seguia, Meursault pôde notar que o Sr.
Perez coxeava um pouco... O veículo fúnebre ganhou certa velocidade e ele ficou
mais atrás ainda. Um dos homens que seguia na lateral diminuiu o ritmo e assim
prosseguiu na mesma passada do filho da defunta.
Meursault dedicava seus pensamentos ao calor que o
imenso sol estava provocando. O astro subia rapidamente no horizonte e
provocava um suor contínuo e irritante... Sem chapéu, ele lidava com um lenço
para limpar a testa. Os sons que chegavam aos seus ouvidos eram “o canto dos
insetos e os estalidos das ervas” e até por isso foi difícil entender o que o
empregado da funerária queria dizer-lhe.
O moço manipulou a aba do boné e apontou para o céu
dando a entender que o dia estava quente... Depois o tipo perguntou ao
Meursault se era a sua mãe no féretro. Ele respondeu que sim e o outro quis
saber se “era muito velha”. Como não sabia ao certo a idade da mãe, respondeu
um “assim, assim”.
O tipo calou-se e voltou a concentrar-se nas passadas.
(...)
Meursault olhou para trás e
viu que o velho Perez estava há uns cinquenta metros e se esforçando para
caminhar o mais rápido que podia. Já o diretor seguia o cortejo “com muita
dignidade, sem gestos inúteis”, e mesmo as gotas de suor que escorriam de sua
testa não o incomodavam.
Ao que tudo indicava, o
padrão da funerária durante o cortejo devia ser aquele de acelerar um pouco
mais depois de vencido certo trecho do percurso... Meursault notou que seguiam
um pouco mais depressa enquanto voltava a contemplar a mesma “paisagem
luminosa, inundada de sol”.
O
calor escaldante complicou o avanço por uma estrada que passara por
pavimentação fazia pouco tempo... O alcatrão utilizado na empreitada
simplesmente derretia sob os calçados que afundavam na substância escura.
E tudo monótono... A atmosfera levava Meursault a se
sentir “um pouco perdido entre o céu azul e branco e a monotonia destas cores,
negro pegajoso do alcatrão aberto”, e o preto das roupas e do brilhante carro.
Suas ideias sofriam
perturbações provocadas pelo calor que o sol proporcionava, além do “cheiro de
borracha e de óleo do automóvel”, e mais os odores de verniz e incenso... A
noite mal dormida resultara em cansaço que castigava até a visão...
O rapaz decidiu olhar mais uma vez na direção do velho
Perez e viu que ele estava ainda mais distante e parecia envolvido “numa nuvem
de calor”... E como não mais o avistou, entendeu que ele havia deixado a
estrada para se embrenhar nos campos. Depois percebeu que o homem era
conhecedor do caminho e na verdade tomara um atalho para se juntar ao cortejo
numa curva mais à frente.
(...)
Outras vezes mais o velho ficou para trás e outros
atalhos foram percorridos por ele. Meursault só sabia de si e do sangue
latejando em suas fontes, então tudo o mais no caminho se passou rapidamente e
com “naturalidade” de modo que, depois, não se lembrava de detalhes.
Pelo menos recordava-se que a enfermeira
delegada se aproximou dele na entrada da aldeia e lhe falou com sua “voz
singular, trêmula e melodiosa” que “se vamos muito devagar, arriscamo-nos a uma
insolação. Mas se vamos muito depressa, transpiramos e na igreja apanhamos
calor e frio”.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/05/o-estrangeiro-de-albert-camus-fim-do.html
Leia: “O
Estrangeiro”. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto