domingo, 2 de maio de 2021

“O Estrangeiro”, de Albert Camus – interminável choradeira de uma das velhas que nutria grande amizade pela falecida; distraindo-se na tentativa de descobrir a origem de estranhos ruídos; um dos velhos permanece em vigília e a observar o sonolento Meursault; cumprimentos dos desconhecidos e acinzentados velhos; um belo amanhecer, ventos desde o mar, convite para um passeio; pensando nos companheiros de escritório

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/05/o-estrangeiro-de-albert-camus-o.html antes de ler esta postagem:

Amigos e amigas da mãe de Meursault apareceram para o seu velório... O rapaz estranhou as fisionomias e o comportamento dos velhos que, movimentando-se ao redor do porteiro, do lado oposto ao que ele se encontrava, davam a impressão de que estavam ali para julgá-lo.
(...)
Alguns instantes se passaram até que uma das velhas iniciasse uma choradeira. Meursault não podia enxergá-la, pois ela ocupava uma cadeira da segunda fileira. A mulher soltava “pequenos gritos” a certos intervalos e parecia que não mais pararia de chorar. Como os demais pareciam encolhidos e em silêncio, bem podia ser que não a escutassem, pois permaneciam olhando fixamente “o caixão, a bengala ou qualquer coisa” sem desviar o olhar.
A mulher continuava a chorar. Meursault admirava-se, pois sequer a conhecia, mas gostaria que ela parasse com aqueles lamentos. Obviamente não diria nada a esse respeito. O porteiro se aproximou dela e falou-lhe algo, porém ela não interrompeu suas manifestações. Então ele resolveu ir para junto do rapaz.
O tipo lhe disse que a velha era “muito amiga” da falecida... Chorava porque sentia que perdera a “única amiga”, o que significava dizer que doravante ficava “sem ninguém”.
(...)
Passou-se um bom tempo e só o que se ouvia na sala eram os “suspiros e soluços da mulher”. Eles se tornaram mais raros até que cessaram de vez.
Meursault percebeu-se sem sono, todavia doíam-lhes os rins e ele se sentia cansado. O silêncio dos velhos tornou-se incômodo... Eventualmente ouvia “um ruído estranho e não conseguia compreender de que se tratava”. Distraiu-se tentando descobrir até que chegou à conclusão de que aquilo eram alguns velhos chupando o interior de suas bochechas. Eis aí a origem dos “barulhos esquisitos”. Eles próprios nem percebiam o que estavam provocando.
O rapaz chegou a imaginar que a defunta não significava nada para os velhos... Depois, pôde entender que estava errado em sua impressão.
(...)
O porteiro serviu café a todos. E depois disso, o que ocorreu ou deixou de ocorrer, Meursault não saberia dizer nada a respeito. Para ele, a noite simplesmente passou. É certo que se lembrava de que em certo momento abriu os olhos e viu “que os velhos dormiam dobrados sobre si mesmos”. Mas um deles permanecia acordado, “queixo encostado às costas das mãos”, que eram sustentadas pela bengala. O tipo o olhava fixamente e parecia aguardar o momento de ele despertar.
Mas isso foi por breve instante, Meursault nem pensou muito mais a respeito porque logo voltou a dormir e só acordou bem depois, pois notou que o novo dia avançava e logo tudo seria tomado pela claridade... Seus rins ainda mais doíam. Um dos velhos despertou tossindo muito. O tipo escarrava num grande lenço. Tanto barulho provocou que acabou acordando os demais. O porteiro ordenou que se retirassem e assim eles fizeram.
(...)
A noite de vigília tornou ainda mais cansadas as fisionomias dos velhos. Suas faces tornaram-se acinzentadas.
Meursault pôde constatar isso de perto já que, conforme se retiravam, um a um chegava próximo para lhe apertar a mão. Evidentemente não tinham trocado nenhuma palavra durante a noite, mas chegavam como se fossem íntimos do filho de sua colega defunta.
Percebendo o seu cansaço, o porteiro permitiu que fosse ao seu quarto para lavar o rosto e se pentear... Depois tomou café com leite e quando saiu o dia já estava claro.
Meursault observou as “colinas que separam Marengo do mar” e viu que o céu estava muito bonito com tons de vermelho espalhados pela imensidão azul. O vento que chegava desde as colinas trazia o cheiro do sal.
O dia prometia, sairia bonito. O rapaz pensou que já fazia um bom tempo que não viajava para o campo. Pensou que o dia o estava convidando para um passeio, mas obviamente entendeu que a ocasião não era a ideal. Então dirigiu-se ao pátio e acomodou-se à sombra de uma árvore.
Pôs-se a respirar o odor que subia da terra fresca... Percebeu-se desperto e que bem ou mal o sono havia sido superado. Lembrou que àquela hora tinha o hábito de se levantar para ir para o escritório. Mas estava ali, completamente livre da rotina... Sem dúvida, para ele, um dos momentos mais difíceis do cotidiano era esse da preparação para sair de casa para o trabalho. Pensou nos colegas de escritório que amanheciam para mais um dia de labuta...
De repente alguém badalou um sino de algum ponto em meio às construções. Isso o despertou das divagações.
Leia: “O Estrangeiro”. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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