quinta-feira, 27 de maio de 2021

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – o nosso tempo tem mostrado que “é mais fácil endossar os direitos do que os impor”; a empatia que possibilitou a abertura para as discussões em torno das reformas judiciais e dos costumes parece ter esmorecido; sociedades distantes mostram-se dedicadas a socorrer outras em situação de calamidade, ao mesmo tempo algumas que são próximas estão dispostas a praticar intolerâncias e atrocidades; os que cometem violentações são pessoas comuns que, de algum modo e a partir de certas circunstâncias, inverteram seus valores drasticamente; início das reflexões sobre a ambivalência provocada pela disseminação da empatia; considerações de “Teoria dos sentimentos morais”, de Adam Smith e a questão da consciência que leva o ser humano a optar por escolhas em benefício do próximo

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/05/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_24.html antes de ler esta postagem:

Estamos na parte final das reflexões propostas por “A Invenção dos Direitos Humanos”. Como vimos, as leituras nos proporcionaram o (longo) percurso pela História da luta pelos direitos, seus entraves e avanços e retrocessos...
No início dos estudos, vimos o quanto alguns clássicos da literatura contribuíram para o desenvolvimento da empatia e aos poucos a questão dos direitos sensibilizou diversos pensadores e grupos que passaram a exigir reformas judiciais e mudanças de costumes.
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A exposição das necessidades de se explicitar os direitos nas Declarações não foi suficiente para evitar que as sociedades recaíssem em lamentáveis práticas que atentam contra a razoabilidade das garantias mínimas de dignidade para todos... Os muitos ataques aos direitos em nosso tempo nos levam a concluir que a causa dos direitos humanos permanece atual e, como o livro reforça, “é mais fácil endossar os direitos do que os impor”.
O caso é que tortura, limpeza étnica, atrocidades cometidas durante conflitos bélicos (o estupro, por exemplo), e ainda “opressão continuada das mulheres, o tráfico sexual de crianças e mulheres, mais a prática do escravismo” têm sido praticados e em muitos casos como resultado de um retrocesso, uma espécie de regressão das sociedades ao obscuro tempo em que sustentava-se que o suplício do corpo era castigo exemplar que pagava a afronta (o delito) ao Estado representado pela liderança política.
As questões que podemos levantar dizem respeito à eficácia dos direitos em relação à árdua tarefa... Mostraram-se inadequados? O que ocorreu com a capacidade de empatia que tornou possível o estabelecimento dos direitos ao longo do tempo?
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O desenvolvimento de habilidades que permitiram a leitura, escrita e produção de gêneros diversos (“romances, jornais, rádio, filmes, televisão e internet”) possibilitou que populações inteiras desenvolvessem empatia por comunidades distantes em condições precárias (o livro cita a fome em Bangladesh, relatos sobre o assassinato de adultos e crianças na Bósnia) e se mobilizassem na arrecadação de dinheiro e recursos (alguns se voluntariaram para atuar no local mesmo das tragédias) para socorrê-las...
Por outro lado, muitas vezes por questões relacionadas à intolerância de fundo étnico, comunidades vizinhas se debatem ferozmente... As violências cometidas por causa de fundamentalismos religiosos são praticadas desde muitos anos atrás.
Vários estudos demonstram que mesmo os que não sustentam fundamentalismos políticos ou religiosos podem ser levados, de acordo com as circunstâncias, “a empreender o que sabem ser assassinato em massa em combates corpo a corpo”. Neste ponto do texto, a autora afiança que os diversos torturadores (da Argélia, Argentina ou Abu Ghraib), no início, eram apenas “soldados comuns”. E para a nossa reflexão, lembra que tanto os torturadores quanto os assassinos “são como nós e infligem dor a pessoas que estão bem diante deles”.
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Então é isso. Temos modernos mecanismos de comunicação que, de um modo geral, foram utilizados para difundir o sentimento de empatia... No entanto as atrocidades persistem e vemos que muitos a anulam para praticar o mal aos demais.
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O livro dá destaque para a questão da “ambivalência” que a própria disseminação da empatia pode provocar. Isso ocorre desde o século XVIII...
Em “Teoria dos sentimentos morais”, Adam Smith nos dá um exemplo acerca das reações do “homem europeu humanitário na Europa” diante da notícia de um suposto terremoto ocorrido na distante China e que vitimou “centena de milhões de pessoas”.
De acordo com Adam Smith, o “homem humanitário” em sua distante realidade (de europeu humanitário como os demais europeus à sua volta) diria “todas as coisas adequadas” a respeito da tragédia na China, logo retomaria seus afazeres e pouco ou nada mais do evento o incomodaria... Mas, ainda de acordo com o filósofo e economista britânico, se o “homem humanitário europeu” ficasse sabendo que no dia seguinte “perderia o dedo mínimo”, passaria por uma agitação que se prolongaria por toda a noite. A questão que Smith levanta é: “sacrificaria a vida dos milhões de chineses em troca da integridade de seu dedo mínimo? A resposta é negativa. E na sequência, somos levados a pensar: por que o indivíduo se mostra capaz de agir e optar por escolhas que supostamente vão contra o seu próprio interesse?
Adam Smith nos responde que há uma força maior e mais forte do que a do interesse próprio... A consciência, sobre a qual afirma:

                   “É a razão, o princípio, a consciência, o habitante do peito, o homem interior, o grande juiz e árbitro da nossa conduta”.

Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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