quinta-feira, 13 de maio de 2021

“O Estrangeiro”, de Albert Camus – observando o retorno dos que haviam seguido para os divertimentos de domingo; chega a noite e a rua se esvazia; um jantar à base de pão e pastéis; fim do dia e “tudo continua na mesma”; retorno ao trabalho, chefe atencioso e resposta vaga; a observação sobre a “toalha rolante” do escritório; Manuel e a divertida carona ao restaurante

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/05/o-estrangeiro-de-albert-camus-maria-se.html antes de ler esta postagem:

Depois da passagem de torcedores e desportistas do futebol percebeu-se um aumento da circulação de carros pela rua principal... A tarde avançava, o céu passava a ter um tom mais avermelhado e pode-se dizer que a movimentação das pessoas também cresceu com o regresso das mesmas pessoas que haviam se deslocado para seus passatempos.
Entre os transeuntes, Meursault notou o “senhor distinto”, homem de família que conduzia as crianças que se deixavam arrastar ou estavam chorosas por algum motivo.
Pelo visto as sessões da tarde no cinema haviam encerrado, já que muitos dos que caminhavam pareciam terem saído da parte baixa. Entre eles estavam os rapazes vistos anteriormente e que, pelo modo como gesticulavam, tinham assistido a “um filme de aventuras”... Outros tantos, que chegaram mais tarde e mais sérios, vinham dos cinemas do centro.
Esses últimos permaneceram ainda um tempo na rua. Alguns animaram-se a observar o passeio de garotas de “cabelos soltos e braços dados” e “dirigiam-lhes gracejos”. Uma ou outra ria-se e voltava a cabeça para outro lado como a fazer pouco caso dos rapazes. Meursault reconheceu algumas que lhe acenavam.
(...)
A noite chegou, e com ela a necessidade de se acender os candeeiros que iluminavam a rua... As lâmpadas tornaram o piso mais visível e os bondes mais nítidos. Os reflexos atingiam em cheio os cabelos, sorrisos ou pulseiras prateadas dos transeuntes, e assim um bom observador conseguia contemplar mais esses fragmentos do cotidiano dos citadinos comuns.
De tanto que se dedicou a olhar para o movimento das calçadas, Meursault sentiu cansaço nos olhos. Ele notou que em pouco a circulação dos coletivos diminuiu significativamente enquanto a escuridão da noite passou a dominar.
O bairro tornou-se esvaziado e “o primeiro gato atravessou lentamente a rua outra vez deserta”. Meursault entendeu que era já hora de jantar. Sentia o pescoço dolorido de tanto que tinha ficado apoiado sobre o encosto da cadeira, então decidiu levantar-se e caminhar à rua para “comprar pão e pastéis”... Ao retornar, preparou o que tinha à disposição e sequer se sentou para comer.
(...)
Meursault teve vontade de fumar à janela, mas desistiu ao notar que o tempo havia mudado sensivelmente e uma incômoda friagem chegava desde o alto das árvores. Ao fechar as vidraças, notou uns pedaços de pão sobre a mesa, junto à lamparina. Na sequência pensou apenas que havia passado por mais um domingo, que a mãe já estava enterrada e que no dia seguinte voltaria ao trabalho. No final das contas, “tudo continuava na mesma”.
(...)
O dia de retorno ao trabalho foi dos mais intensos. Provavelmente porque algumas tarefas se acumularam no final da semana anterior... O chefe mostrou-se atencioso com Meursault e quis saber se ele estava cansado. Perguntou também qual a idade da mãe e o rapaz respondeu que ela contava “uns sessenta e tal”.
A resposta saiu-lhe como resultado de “esforço para não cometer engano” e o chefe pareceu ter dado por satisfatória. Nisso, o moço experimentou um “ar de assunto arrumado” e um sinal de que a vida seguiria seu curso.
A mesa de Meursault estava repleta de longas cartas que deviam ser respondidas... Até a hora do almoço não tivera sossego. Então o relógio marcou meio-dia e, como sempre fazia a este horário, lavou as mãos antes de almoçar. Ele mesmo justifica que a “toalha rolante” ainda estava em condições de uso, pois no período da tarde, depois de manipulada o dia inteiro, tornava-se muito úmida e cheia de imundícies.
Ele conta que já fizera observação a respeito da toalha ao chefe que, embora considerasse um aborrecimento, via o caso como “pormenor sem importância”.
(...)
Manuel era um camarada de Meursault... Aquele mesmo que havia lhe emprestado a gravata preta para o velório da mãe. O rapaz trabalhava na expedição e normalmente o acompanhava no almoço.
Ao saírem do escritório permaneceram algum tempo a contemplar o mar à frente e os barcos cargueiros ancorados “no porto ardente de sol”. Logo perceberam que um caminhão barulhento estava para passar por eles. O Manuel sugeriu que “aproveitassem” para seguirem no veículo como “caronas intrusos”, então os dois deram uma carreira e assim que o brutamontes passou, lançaram-se sobre a carroçaria. Meursault foi o primeiro a subir e ajudou o companheiro a alcançar um lugar para se sentar.
Acomodaram-se já sem fôlego e o caminhão seguiu sob sol e poeira, “aos saltos no pavimento irregular do cais”. O Manuel era uma alegria só e soltava gargalhadas, rindo-se da condução alternativa que tinham conseguido.
Leia: “O Estrangeiro”. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas