Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/08/deus-lhe-pague-peca-de-joracy-camargo_6.html antes
de ler esta postagem:
Barata
quis saber se o velho e experiente mendigo, com o qual trocava ideias durante a
noite em frente à igreja, era contra a esmola... Em resposta ouviu que ele era
a favor dele mesmo, “esmola ao seu favor”, e acrescentou que era contra os
outros. O fato de seguir pedindo se explicava pelo fato de a própria sociedade
assim o exigir... Era simples, pedindo esmolas se vingava da sociedade.
Explicou que dessa maneira acabou se enriquecendo.
Barata se espantou e sem dar mostras de que acreditava no que acabara de
ouvir perguntou se o amigo havia mesmo se enriquecido. O velho confirmou que,
com seu ofício, se tornara riquíssimo... Mas então foi obrigado a se
enriquecer?
Sem pressa de responder, o
velho mendigo disse que a sociedade é “defeituosa”. O normal para todos é que o
mendigo seja pobre para toda vida ou enquanto estiver recorrendo à mendicância.
Depois acrescentou que os ricos é que são pobres (de espírito, de tranquilidade,
fraternidade...), inclusive de dinheiro em alguns casos.
A cada frase do velho, Barata se sentia mais confuso.
Confessou que não estava entendendo nada... Não pediu maiores explicações no
mesmo instante porque viu um tipo distinto se retirando da igreja. Sem titubear,
estendeu-lhe a mão e resmungou um “uma esmolinha pelo amor de Deus”... O homem
prosseguiu com sua passada rápida sem conceder-lhe qualquer níquel. Como que a
querer dar exemplo ao companheiro, o velho posicionou seu chapéu em gesto de
pedinte e implorou dizendo: “Favoreça, em nome de Deus, a um pobre que tem
fome!”. O tipo distinto depositou a esmola no chapéu e retirou-se visivelmente
agitado. Barata espantou-se mais uma vez enquanto o companheiro misterioso lhe
perguntava se conhecia o cavalheiro que acabara de sair da igreja...
Evidentemente Barata não tinha a menor ideia a respeito do distinto
homem. O velho tratou de responder que aquele era certo Vieira de Castro, um
milionário que presidia um rico conglomerado de fábricas de tecido... Na
sequência observou o adiantado da hora... O que um homem tão rico buscaria numa
igreja àquela hora? Barata saberia “o que significa um momento de contrição
religiosa de um milionário?”
Mais uma vez o pobre Barata ficou sem ter o que dizer
e o companheiro foi esclarecendo que homens como Vieira de Castro sofrem por
serem egoístas e porque travam árduas disputas com empresários rivais... Uma
condição miserável! Miséria pior do que a vivida pelos mendigos!
Barata espantou-se mais uma vez... Aquele distinto senhor poderia sofrer
uma miséria maior do que a sua? O velho foi dizendo que a miséria do “ser
mendigo” é das mais confortáveis e certamente faria inveja aos milionários...
(...)
Mendigo “genuíno”, Barata poderia pensar que o velho que lhe transmitia
aqueles estranhos ensinamentos não podia servir de parâmetro para a comparação
que ele mesmo estava propondo. Talvez por isso tenha voltado a insistir na
explicação sobre ter sido obrigado a se enriquecer e a fazer fortuna.
O velho respondeu que
sempre guardou tudo o que recebia de esmola. Simplesmente foi obrigado a
guardar porque a própria sociedade o impediu de gastar... Para exemplificar o
que queria dizer, mostrou as vestes desgastadas... Ganhou aquela roupa de
esmola já fazia vinte e cinco anos e por “motivos óbvios” jamais a substituiu.
Simplesmente não podia fazer isso, e dessa forma economizava o valor equivalente
a dois ternos a cada ano.
Na sequência o velho
acompanhou Barata numa série de cálculos sobre o quanto economizara durante os
vinte e cinco anos de mendicância: o quanto poupou por não gastar com roupas
novas; por não gastar com comida e gorjetas em restaurantes, pois sempre se
contentou com os restos que lhe eram oferecidos; por não ter despesas com
passatempos “como cinema, teatro, esportes e certos luxos” que para um mendigo
só poderiam ser considerados inconvenientes.
O raciocínio parece ter mostrado satisfatoriamente
ao Barata a possibilidade do mendigo se enriquecer na mesma medida em que, com
a série de gastos com supérfluos, o rico poderia empobrecer.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/01/deus-lhe-pague-peca-de-joracy-camargo.html
Leia: “Deus
lhe pague”. Ediouro.
Um
abraço,
Prof.Gilberto