quinta-feira, 8 de abril de 2021

“A Ópera de Três Vinténs” – peça de Bertold Brecht musicada por Kurt Weill – retomando o filme – a prisão do Mac Navalha; o narrador anuncia uma reviravolta; Polly dirige um banco e faz breve apresentação aos diretores; um banco pode ser roubado, mas também “pode ser usado para roubar”; um negócio “respeitável e cumpridor da lei”; rigorosa com os executivos subalternos; “quem seria tão idiota de roubar hoje em dia se temos as leis?”


A situação tornava-se cada vez mais complicada para o Navalha, que sofria implacável perseguição. Também o chefe de polícia Brown podia esperar pelo pior, já que Peachum estava disposto a tramar grande tumulto durante as celebrações de coroação da rainha...
Ao retomarmos as postagens sobre o filme, devemos lembrar que o bandido havia se refugiado junto à garota que o acolhera durante a fuga da noite (ver https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/03/a-opera-de-tres-vintens-peca-de-bertold_18.html). O vemos despedindo-se da jovem, que protestava por terem ficado juntos por pouco tempo. Ele atirou o cigarro ao chão e respondeu que os “ossos do ofício” o obrigavam a partir, pois tinha “negócios” a resolver. A garota o abraçou e pediu que ele voltasse... Sim, voltaria...
Mas aquilo não daria certo, já que dois tiras chegaram e se posicionaram junto ao casal. Ao vê-los, o Navalha percebeu que não podia mais escapar, então sugeriu que o levassem logo.
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A tela ficou escura e na cena seguinte o narrador reapareceu... Em alto e bom som explicou que todos acabavam de ver “a natureza ousada e negligente de Mackie”... Anunciou que na sequência assistiriam a uma reviravolta na história graças à inteligência de uma esposa amorosa.
Evidentemente se referia à Polly. O que será que ela aprontava enquanto o marido bandido caia nas mãos da polícia?
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Vemos uma grande porta que dá acesso a uma ampla sala...
Um bem trajado tipo anuncia “os cavalheiros da diretoria”, e logo sete distintos cavalheiros entram.
Podemos notar que a sala é ocupada por alguém muito importante, pois todos fazem reverências em direção à mesa antes de se acomodarem nos estofados. Aos poucos a câmera revela que a grande mesa para onde dirigiam os cumprimentos é ocupada por Polly.
Ela veste um elegante vestido e logo entendemos que ela preside um grande banco.
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Depois de golpear a mesa com três leves toques de martelo, Polly iniciou um discurso aos diretores... Começou dizendo que “alguém pode roubar um banco ou pode...”. Antes que terminasse a frase, um de seus assistentes a interrompeu dizendo que “pode usar um banco para roubar”...
Se observarmos com atenção, veremos que os assistentes não nos são tão estranhos. Ela olhou para o tipo e prosseguiu dizendo que se pode “comandar um negócio respeitável e cumpridor da lei”. Com outro golpe de martelo sobre o tampo da mesa advertiu o assistente intrometido.
Polly citou o pai, que sempre lhe dizia: “quem seria tão idiota de roubar hoje em dia quando temos as leis?” Depois falou sobre o marido, “nosso estimado diretor executivo”, que estava escondido no exterior por motivos de força maior, mas que, certamente aprovaria o trabalho que vinham desenvolvendo.
E que trabalho era esse? Polly fez referência ao “elegante e pequeno banco” que haviam comprado. Um empreendimento “muito mais lucrativo do que achar alguns cofres...” Neste ponto ela fez um gesto que foi perfeitamente entendido pelos diretores como a “ação de roubar” (cofres que eventualmente encontrassem).
Vemos que os elegantes diretores sabiam bem do que se tratava... Polly passou a falar dos “negócios” que realmente interessavam. Disse que seriam “fiéis à tradição honorável” da instituição “de construir e consolidar a confiança do povo” através da integridade de cada um dos membros ali presentes e da “lealdade fiduciária”. Todos a aplaudiram efusivamente enquanto ela fechava sua grande pasta e a acomodava sob um dos braços. Cravou um olhar enigmático sobre os diretores que, acanhados, voltaram a silenciar. Assim ela ainda pôde sentenciar que a firma empregaria apenas “pessoas de qualidade”. Parou diante de um deles e vociferou que “ladrões e batedores de carteira são para idiotas”. Aconselhou-os a esquecerem o passado, pois doravante iniciariam uma “vida honesta”. Quem não aceitasse o “desafio” seria eliminado sem qualquer remuneração.
Saiu desejando que todos tivessem um bom dia... Entre os diretores, houve quem dissesse que podiam aprender com ela. Somos tentados a crer que estes faziam parte do antigo quadro.
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Adiantamos que no texto da peça não há nenhum trecho que descreva o que se vê nesta parte do filme...
Não há dúvida... No filme Polly aparece muito bem-sucedida por ter seguido as orientações que havia recebido do marido. Passou a investir as economias “no ramo bancário”.
Mais uma vez temos de destacar a ironia de Brecht ao inserir as frases ácidas a respeito das instituições bancárias e sua atuação na sociedade. É o que notamos no início do discurso de Polly aos executivos, quando ela diz que “alguém pode roubar um banco...” E um de seus capangas completa “ou pode usar um banco para roubar”...
A vemos destacando que o seu negócio com o banco é “comandar um negócio respeitável e cumpridor da lei”... Na sequência cita uma frase de seu pai a respeito das leis que regem a sociedade: “quem seria tão idiota de roubar hoje em dia quando temos as leis?”.
O trecho dá a entender que os grandes corruptos se apoiam exatamente na legislação que devia regular/fiscalizar as atividades e punir as falcatruas de banqueiros e dirigentes de ricas corporações.
Leia: “A ópera de três vinténs”. Editora Paz e Terra.
Indicação do filme (14 anos)
Um abraço,
Prof.Gilberto

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