quarta-feira, 14 de abril de 2021

“Deus lhe pague”, peça de Joracy Camargo – após a despedida do velho, Péricles quer saber de Nancy se devem se apropriar do dinheiro; o rapaz sentiu que o desfecho do caso podia ser-lhe favorável; várias considerações sobre as vantagens de juntar-se a um jovem de iniciativa; muita confusão na cabeça faz a mulher pensar que deve mesmo se livrar da influência do velho, mas as soluções de “guinada de vida” pareciam-lhe fuga; uma decisão inesperada

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/04/deus-lhe-pague-peca-de-joracy-camargo_8.html antes de ler esta postagem:

A sós com Péricles, Nancy demorou um pouco a dar-lhe atenção porque não conseguia parar de pensar na revelação sobre a “outra existência” do marido... “Mendigo! Falso mendigo!”
O rapaz perguntou-lhe se deviam aceitar a esmola... Ela respondeu que não seria demais, já que vinha vivendo exatamente às custas da esmola do velho. Péricles achou que estava em condições de “virar o jogo” a seu favor, então, chamando-lhe a atenção, disse que “todo dinheiro é vil”. Observou que o dinheiro dos dois pacotes que ousou surrupiar “foi roubado aos pouquinhos” pelo outro. Emendou que ela não devia “continuar procurando a felicidade no dinheiro”. “Se não é roubado é ganho. E quando é ganho, nem sempre poderá dizer-se que não é roubado”.
O jovem pretendente empolgou-se ao sentenciar que “o dinheiro honesto não vai além do estritamente necessário para viver. O juro, o ágio, a percentagem, todo dinheiro ganho com dinheiro, é vil. A felicidade está no amor, que é o que mais tenho para te dar”.
A essa altura, Nancy o ouvia atentamente... Enquanto refletia, deixou escapar a palavra “amor”, que era o que o rapaz queria dar a entender que devotava a ela. Então Péricles observou que podia proporcionar-lhe muito mais. Disse que, ao seu lado, ela alcançaria prestígio social e o “brilho dos salões”... As pessoas mais finas a notariam. Sim. Afinal, “de que serve a beleza longe do convívio social”? E aquele conforto da mansão do velho? Distante de tudo!
O rapaz insistiu que havia muito mais que ela não vinha experimentando... Disse que sua vaidade estava sendo sufocada pelo convívio com o velho. Isso tinha de ser corrigido!
(...)
A mulher não suportou o falatório e protestou gritando “chega!” Reclamou que estava com a cabeça “girando e girando”. Reclamou que no momento era levada a entender que a mentalidade do velho lhe fora definitivamente imposta...
Péricles não perdeu a oportunidade para reforçar que ela havia sido sugestionada. Era só uma questão de pensar um pouco mais!
Visivelmente desorientada, Nancy reclamou que só conseguia refletir a partir das orientações do velho. Por isso exclamou que precisava esquecê-lo... Mais uma vez o moço sentiu-se em vantagem e sugeriu que poderiam viajar...
A sugestão para a “grande guinada na vida” ainda mais a atormentou. Imediatamente, negou que viagens pudessem resolver o seu caso... Lembrou que “há mendigos por toda parte”... Eles sempre podem ser vistos em cada degrau das escadarias! Confessou que estava pensando que nunca mais o esqueceria. Pelo visto, seria preferível morrer. Concluiu que abominava a velhice, o dinheiro e a esmola. Mas problematizou que se sentia terrivelmente atraída pela vida misteriosa do velho.
(...)
Péricles aproximou-se dela... Disse-lhe que estava nervosa e que precisava dedicar-se ao amor que ele lhe oferecia. Só assim esqueceria tudo o que lhe fazia mal.
Em resposta, ela deu de ombros e disse que o amor, prestígio e tudo o mais que o rapaz lhe oferecia era efêmero. Cravou que apenas a inteligência é eterna: “Amor, beleza, fortuna, nada resiste à força da inteligência”!
Essas últimas palavras pareceram demais para o rapaz... Sem esconder sua indignação, perguntou se ela, “fascinada pela inteligência deste velho”, preferia continuar vivendo “na companhia de um miserável mistificador, um pedinte desprezível”, que alimentava sua vaidade e conforto “com os restos que a humanidade despreza no seu chapéu”.
Nancy respondeu admitindo aceitar a “condição paralela” do velho milionário. “um mendigo”; um homem diferente de todos os que procuram ser iguais aos seus semelhantes”. Admitiu que, de fato, tudo aquilo era bem novo em sua vida.
(...)
Péricles considerou que as palavras de Nancy sacramentavam sua decisão. Então manifestou que tudo o que ouvira era extremamente asqueroso...
Nancy parecia estar em outra sintonia e num suspiro deixou escapar um “meu pobre velho!”... Depois, voltando-se para o rapaz, disse-lhe que se fosse, e que levasse consigo “os últimos pedaços de ilusão” que sua mocidade viera lhe trazer.
Apesar de decepcionado, Péricles alimentava um fio de esperança e chamou-lhe pelo nome, todavia ela pediu para que se fosse...
Leia: “Deus lhe pague”. Ediouro.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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