quarta-feira, 28 de abril de 2021

“A Ópera de Três Vinténs” – peça de Bertold Brecht musicada por Kurt Weill – Peachum fala sobre sua condição de pobre homem que não pode ser ultrajado pelo chefe de polícia, diz que sabe que o homem está prestes a enfrentar um momento terrível e orienta as garotas de Turnbridge a oferecer-lhe café; uma fala a respeito da lei, “feita única e exclusivamente para explorar aqueles que não a entendem ou que, por pura necessidade, não podem cumpri-la”; ironia nos trocadilhos a respeito da honestidade dos juízes, que fazem valer a justiça; segundo rufar de tambores desde as ruas; Brown parte para a ofensiva e garante que levará os “senhores patriotas” mendigos para Old Bailey; chega o momento da senha para a entrada da banda


O chefe de polícia havia entendido a ameaça de Peachum de promover confusões durante as festas de coroação da rainha com o “desfile de mendigos”. Por isso reuniu os tiras para prendê-lo imediatamente. Ele não desconfiava, mas sabemos que os maltrapilhos já estivam bem adiantados em seus preparativos.
Como vimos, depois de esconder o seu pessoal, o “rei dos mendigos” o colocou numa situação delicada ao manifestar-se com intimidade à autoridade. Fazendo-se de desentendido, Brown vociferou contra a petulância do velho, ordenou que lhe tirassem o chapéu e gritou que não podia ser que o bandido (referia-se ao próprio Peachum) estivesse ainda solto... Por sua vez, Peachum devolveu os ataques que lhe eram dirigidos salientando que o pior dos bandidos de Londres era seu amigo e estava à solta.
Numa tentativa de mostrar aos seus homens que nada tinha a ver com aquela ofensa, o policial quis saber quem era o tal pior bandido seu “amigo” a que o outro aludia. Peachum não pestanejou e respondeu que era o Mac Navalha.
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O “rei dos mendigos” falou de modo que todos os policiais escutassem que Mac Navalha era o criminoso perigoso que contava com a amizade de seu chefe... Sobre si mesmo, Peachum garantiu que se tratava de “um homem pobre”, que não podia ser destratado por Brown, e falando diretamente a ele cravou que o via “a um passo da pior hora de sua vida”. Então perguntou-lhe se gostaria de um café...
O velho pediu às amigas de Jenny que oferecessem café ao chefe de polícia... Ensinou que deviam ser educadas. Depois perguntou por que não podiam todos viver em harmonia. Salientou que todos obedecem a lei e que ela é “feita única e exclusivamente para explorar aqueles que não a entendem ou que, por pura necessidade, não podem cumpri-la”.
Peachum disse ainda que, para receber a parte que cabe a cada um na exploração, a pessoa tem de “agir rigorosamente dentro da lei”... Brown entendeu que o outro estava querendo dizer que os (nossos) “juízes são corruptos” e chamou-lhe a atenção. O velho o corrigiu e garantiu que de modo algum pensava daquele modo. Disse que “nossos juízes são absolutamente incorruptíveis” e que nenhum dinheiro do mundo pode corrompê-los “a ponto de fazerem valer a justiça”.
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Como se pode notar, Peachum usou de muita ironia em seus trocadilhos propositais na resposta ao chefe de polícia.
Neste ponto todos ouviram o rufar de tambores desde as ruas... E essa foi a segunda vez. Quando ocorreu a primeira, os mendigos dedicavam-se à produção dos cartazes e um deles anunciou que a guarda da rainha se colocava em formação...
Sobre o segundo rufar de tambores, Peachum afirmou que era o anúncio de que a guarda saía para formar alas. Acrescentou que “os mais pobres entre os pobres” siariam “meia hora depois”.
Brown confirmou e ressaltou que os mais pobres sairiam “meia hora depois diretamente para a prisão de Old Bailey, onde permaneceriam durante todo o inverno”. Dirigindo-se aos policiais, ordenou que começassem a “catar” o que encontrassem pela frente... Voltando-se aos mendigos, perguntou-lhes se alguma vez já teriam ouvido falar de Brown-o-tigre. E particularmente a Peachum, disse que havia encontrado “a solução” e podia afirmar que salvara “um amigo da morte certa”.
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Brown estava convencido de que, enfim, “dava as cartas” e por isso disse que ia “dar uma geral” no covil do mendigo... Prenderia todos... Mas nem sabia dizer por qual motivo os tipos seriam presos, então improvisou que os prenderia “por mendicância”, já que Peachum havia insinuado que aproveitaria a ocasião especial daquele dia “para jogar os mendigos” contra ele, chefe de polícia, e contra a rainha. Por isso os mendigos teriam de ir para a cadeia.
Peachum ouviu as frases arrogantes de Brown. Disse que “tudo bem”, mas queria saber sobre a quais mendigos ele estava se referindo... O policial respondeu que eram os estropiados que encontrasse na verificação que fariam. Voltou-se ao Smith e gritou que “os senhores patriotas” (referindo-se aos estropiados mendigos) deviam acompanhá-los.
Neste momento, Peachum advertiu o chefe Brown dizendo que estava ali para impedi-lo de agir com precipitação. E pelo visto era graças ao bom Deus que havia resolvido primeiro falar-lhe diretamente... Está certo que podia prender aquela “meia dúzia de coitados que estava vendo”... Mas ali todos eram inofensivos.
Como sabemos, essa era a senha para que a Senhora Peachum liberasse a banda dos mendigos para iniciar “uma música qualquer”. Por isso o velho repetiu a palavra separando bem as sílabas, “i-no-fen-si-vo”!
Leia: “A ópera de três vinténs”. Editora Paz e Terra.
Indicação do filme (14 anos)
Um abraço,
Prof.Gilberto

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