domingo, 25 de abril de 2021

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – iniciando as reflexões sobre socialismo e comunismo; socialistas e críticas aos direitos políticos como fins em si mesmo; Marx e a ideia da improvável concretização da igualdade fundamentada apenas na legislação burguesa; reconstrução pacífica, engajamento político e revolução; da negação ao direito de organização e do voto como entraves à disputa política; Charles Fourier acerca do direito de trabalhar, críticas à propriedade privada e aos “códigos legais que sustentam o patriarcado”, inibidores da libertação das mulheres

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/04/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_30.html antes de ler esta postagem:

Há uma parte de “A Invenção dos Direitos Humanos” que trata especificamente do socialismo e do comunismo.
Depois das várias considerações acerca do nacionalismo, suas vertentes e ameaçadoras vinculações com a “ciência racial”, Lynn Hunt destaca que também socialismo e comunismo se estruturaram conforme diversos atores reagiram às limitações dos chamados “direitos individuais” e à organização social nos moldes liberais.
Os nacionalistas dos primórdios insistiam que cada povo devia ter os direitos garantidos... Levavam em consideração que também os povos (nações) que não tinham estados estabelecidos precisavam se organizar a partir dos direitos. Como sabemos, essa inquietação inicial sofreu mudanças bruscas entre os nacionalistas posteriores.
Os socialistas e comunistas entendiam que os direitos políticos são importantes, mas valorizavam acima disso a ideia de que as classes desfavorecidas vivessem plena condição de igualdade social e econômica. Assim, para eles, os direitos tão valorizados pelos que defenderam os “direitos do homem” no passado não deviam ser colocados como meta principal.
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Karl Marx admitia que a emancipação política pudesse se realizar num contexto de sociedade burguesa fundamentada no direito, na “igualdade a partir da lei”. Todavia, para o estudioso, apenas a destruição dessa sociedade e dos mecanismos de “proteção constitucional” da propriedade privada possibilitariam a “verdadeira emancipação humana”.
Partindo desse pressuposto teórico, socialistas e comunistas se debruçaram sobre duas questões... A primeira diz respeito aos direitos políticos, se são suficientes. A segunda questiona a “proteção à propriedade privada”, se ela pode ser sustentada ao mesmo tempo em que a sociedade se volte à garantia de bem-estar a todos, incluindo os mais desfavorecidos...
Mais uma vez o texto retoma o processo pelo qual os nacionalistas passaram, “indo do entusiasmo inicial sobre a autodeterminação dos povos a um protecionismo mais defensivo sobre a identidade étnica”, para esclarecer que também o socialismo passou por mudanças. Num primeiro momento, seus teóricos enfatizaram a reconstrução pacífica da sociedade sem que isso envolvesse os processos políticos... Depois houve quem defendesse que não haveria como vislumbrar qualquer mudança sem engajamento na disputa da política parlamentar, e ainda os que se colocaram a favor da revolução e violenta derrubada dos governos vigentes.
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Como sabemos, durante um bom tempo, desde o início da revolução industrial até a metade do século XIX, os sindicatos de trabalhadores foram perseguidos e proibidos. Por essa época o direito ao voto era negado ao proletariado e os socialistas trataram de propor “novas relações criadas pela industrialização”. Simplesmente não tinham como vencer eleições parlamentares pelo motivo apontado anteriormente.
Essa realidade de negação de voto ao operário estendeu-se até a década de 1870. Então os socialistas dedicaram-se a propor a organização de “fábricas-modelo, cooperativas de produtores e de consumidores e comunidades experimentais para superar o conflito e a alienação entre os grupos sociais”. Por trás dessa iniciativa estava a intenção de preparar trabalhadores e os desvalidos a tirarem “proveito da nova ordem industrial”. De modo simplificado, podemos dizer que pretendiam tornar a indústria e o processo fabril local em situação de cooperação, em vez de competição.
Vários dos primeiros socialistas viam a questão dos “direitos do homem” com muita desconfiança. Charles Fourier, destacado socialista francês dos anos 1820-1830, dizia que “as legislações e o discurso dos direitos inalienáveis eram uma hipocrisia”. Como poderiam falar de “direitos imprescritíveis do cidadão” se havia quem vivia abaixo da linha de pobreza e sequer tinha “a liberdade de trabalhar” ou condições estruturais para “exigir emprego”. Obviamente, para Fourier, “o direito de trabalhar suplantava todos os demais”.
Fourier e vários outros socialistas seus contemporâneos atacavam a discriminação contra as mulheres e a não concessão de direitos a elas... Insistiam que isso demonstrava que as doutrinas a respeito dos direitos do século anterior eram falhas. Ainda a este respeito seguiam questionando de que forma as mulheres alcançariam sua libertação sem que se abolisse a propriedade privada e os “códigos legais que sustentavam o patriarcado”.
Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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