quarta-feira, 21 de abril de 2021

“A Ópera de Três Vinténs” – peça de Bertold Brecht musicada por Kurt Weill – de volta ao filme – Peachum faz um discurso agressivo e empolgante aos mendigos; os ricos do mundo não se acanham ao causarem a miséria, mas não suportam encará-la; palavra de ordem: “em frente!”; dona Célia aparece com uma novidade perturbadora; um homem enlouquecido e sua vã tentativa de conter a massa miserável; novamente o narrador e alguns versos; em breve, novidades desde a grande sala de Polly


Peachum fez palanque de uma das mesas e discursou aos camaradas mendigos... Disse que naquele mesmo momento 1432 homens e mulheres, seus colegas, estavam “marchando para homenagear a rainha”. Convocou-os perguntando se, miseráveis que eram há tantos anos perecendo nos esgotos, gostariam de se juntar a eles. Na sequência justificou que sua parte havia sido bem-feita ao recolher alguns centavos de cada um para mantê-los organizados.
O “rei dos mendigos” garantiu que “os ricos desse mundo” não têm qualquer receio em causar a miséria, mas não suportam encará-la... Os ricos, continuou ele, têm coração duro, mas são fracos os seus nervos. O que tinham a fazer? Participar ativamente da grande “marcha em homenagem à rainha” sem poupar os nervos dos ricaços. Somavam milhares e assim abalariam o sistema nervoso dos poderosos, que logo saberiam que os farrapos que os cobriam não conseguem esconder suas feridas.
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Essas palavras inflamaram os ânimos dos agregados do “escritório de Peachum”... O lugar estava lotado e junto à porta alguns que mantinham os cartazes sobre as cabeças mostravam disposição para a ação imediata. Peachum disse ainda que a rainha não permitiria que a multidão de inválidos fosse atacada por baionetas. Por isso ninguém devia ter medo de seguir em frente... “Em frente! Em frente!”, foi a palavra de ordem.
A empolgação foi geral... Quem os poderia barrar? Mas quando o discurso estava terminando, a dona Célia apareceu com vários papéis e começou a puxar o marido pelas pernas... Pediu-lhe que parasse imediatamente com a falação e todos aqueles incentivos porque tinha descoberto que Macheath havia se tornado “presidente de um banco”.
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Sabemos que essa reviravolta no status do Mac Navalha havia sido obra de Polly. Então vemos o velho Peachum lendo apressadamente a papelada em meio ao barulho da movimentação dos mendigos para o grande protesto.
Seu semblante é o de quem não pode acreditar no que lê. Dona Célia grita-lhe que o pessoal deve ser chamado de volta imediatamente.
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A mulher explicou que Polly era “convidada de honra na tribuna”. Assim, de um momento para outro, a situação mudou completamente. De modo algum ele podia liderar uma manifestação agressiva às festividades e homenagens à rainha coroada. Atabalhoadamente, o velho Peachum retirou-se da mesa dizendo que sabia o que faria...
As ruas nas imediações do escritório estavam tomadas pelas colunas de miseráveis que seguiam resolutamente com seus andrajos e cartazes de mensagens agressivas. Ele correu para o meio do turbilhão exigindo que parassem. Deviam parar imediatamente! Deviam retornar!
Mas ninguém parecia querer ouvi-lo... Seus gritos e braços agitados não surtiam qualquer efeito sobre a multidão. Podemos dizer que ele corria riscos ao pretender confrontar e barrar a passagem da massa. Alguém desavisado diria que ele só podia ser um louco atentando contra a própria vida. Ainda mais berrou ao perceber que não lograva êxito...
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As cenas em preto e branco são muito significativas, pois notamos a multidão silenciosa prosseguindo a passos lentos e constantes. As mensagens dos cartazes são desabafos agressivos da gente marginalizada e carente dos recursos mais básicos. No alto de uma mureta, o descabelado Peachum berrava e pedia aos miseráveis que fossem sensatos. Ele mesmo que os havia inflamado para as manifestações, agora os chamava “à razão”...
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Novamente a tela se escureceu... O narrador apareceu mais uma vez e falou diretamente a quem assiste ao filme:

                   “então faça o seu plano,
                   sim, seja uma luz brilhante;
                   então faça um segundo plano;
                   nenhum deles dará certo;
                   entenda, nessa existência
                   não há homem mau o suficiente,
                   mas ainda é bonito observá-los
                   tentando ser valentes”.

Como podemos notar, as palavras cabem bem ao velho e ganancioso Peachum...
A tela volta a escurecer e quando a luz retorna o ambiente que vemos é o da grande sala do Banco dirigido por Polly.
Leia: “A ópera de três vinténs”. Editora Paz e Terra.
Indicação do filme (14 anos)
Um abraço,
Prof.Gilberto

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