Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/04/rei-do-congo-mentira-que-virou-folclore.html antes
de ler esta postagem:
Na
sequência dos estudos sobre “O rei do Congo” conhecemos um pouco das impressões
de estrangeiros a respeito da presença dos negros na Lisboa do século XVIII.
Outros viajantes europeus de diferentes nacionalidades produziram
relatos nos quais destacavam a presença marcante de negros em Portugal. Citaram
diversos eventos em que africanos e afrodescendentes se manifestavam chamando a
atenção dos estrangeiros não acostumados a eles.
Os relatos não escondem o
(pré)conceito que os europeus nutriam em relação aos tipos comumente
considerados exóticos/excêntricos.
(...)
Em 1747, o inglês John Trusler registrou no seu
“Descrição do reino de Portugal” observações em relação à miscigenação
resultante das interações dos brancos portugueses com os africanos. Para ele, a
“mistura das raças” resultava em degeneração e, àquela altura, o fato de o
lusitano reivindicar “branquitude” significava principalmente uma intenção de
ser reconhecido como honrado:
“a raça original dos
portugueses foi a tal ponto degenerada (depraved), que ser blanco, isto é, ser
um branco de verdade, tornava-se um título de honra” (...) “Assim, quando um
português diz que é blanco não significa que seja branco de pele, mas um nobre,
uma pessoa de família e de importância”.
(...)
Dois anos mais tarde, outro britânico, Udal ap Rhys,
em “Na account of the most remarkable places and curiosities in Spain and
Portugal” não só fez coro às considerações de Trusler, como buscou explicar “a
razão histórica” para o citado comportamento:
“O fato de possuir
extensos domínios nas duas Índias traz a Lisboa um tal número de morenos
escuros (tawnies), negros pardos (brown), que quando um português deseja
declarar nobreza invoca a condição de branco, ou White man”.
(...)
José Baretti redigiu 23
cartas que trazem observações sobre a “mudança étnica” que se observou entre os
lisboetas...
A citada documentação foi
reunida pelo italiano em “Portugal em 1760”... Tinhorão destaca a relevância
das “Cartas Familiares” para o estudo da temática que pode ser denominada
“antropoetnia”.
Alguns
fragmentos de “Portugal em 1760” revelam-nos a admiração/espanto de Baretti ao
ter notado a participação ativa de negros e negras em eventos públicos, bem
como na miscigenação que, segundo ele, não tardaria a tornar os portugueses uma
gente apartada dos demais europeus, dado que raras seriam as famílias em que o
sangue africano não estaria presente.
A certa altura de seus registros agressivos, Baretti descreveu “uma
tourada na arena lisboeta de Campo Pequeno”, na qual constatou a atuação de
negros incumbidos de provocar os touros “com uma capa na mão”:
“Uma coisa que surpreende um estrangeiro, logo que chega
aqui (a Lisboa), é a quantidade de pretos de um e outro sexo, que formigam a
cada canto. São míseros escravos trazidos de diversos pontos da África, e
introduzidos, mau grado seu, às colônias americanas ou às ilhas dos Açores, ou
a outras partes sujeitas à coroa de Portugal” (...)
Entretanto, estes pretos e estas pretas, que
transportados da África por Portugal, quer nascidos em Portugal de pais
africanos, enchem este cantinho da Europa com uma espécie de monstros humanos
apelidados mulatos, que são filhos, ou de um preto e de uma branca, ou de uma
preta e de um branco; e estes monstros produzem depois mais, unindo-se, ou com
outros europeus ou europeias, ou com outros africanos, ou com outros indivíduos
da sua cor mais ou menos mudados pelas diferentes misturas de sangue”. (...)
“de
maneira que são poucas as famílias portuguesas que possam conservar-se só
europeias, pelo andar do tempo virão a abastardar-se, porque em todos entrará
pouco ou muito sangue africano”.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/04/rei-do-congo-mentira-que-virou-folclore_10.html
Leia: Rei
do Congo. Editora 34.
Um
abraço,
Prof.Gilberto