segunda-feira, 5 de abril de 2021

“Deus lhe pague”, peça de Joracy Camargo – o velho chega à casa antes que Nancy comece a se preparar para a fuga; ela quer saber se lá “fora” não se deparara com a felicidade; uma delicada e perigosa conversa a respeito de felicidade e ilusão; conhecendo a mentira sobre Péricles e sua “dívida com Banco”, aos poucos se percebe iludida; devolvendo o dinheiro e refletindo sobre a “força do destino” e “força da inteligência”

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/04/deus-lhe-pague-peca-de-joracy-camargo.html antes de ler esta postagem:

O velho chegou no momento mesmo em que Nancy se encaminhava para a parte de cima da casa. Obviamente ela mostrou-se surpresa. Sim, o dono da casa respondeu que chegava mais cedo e que, assim, toda vida que lhe importava se instalava na casa... E lá fora, não havia nada? Ela quis saber...
O velho confirmou que, a partir do momento em que ficavam juntos, “lá fora” não lhe interessava mais; não havia nada... Nancy reformulou a pergunta querendo saber se ele não encontrara ninguém quando se aproximava da casa... Obviamente especulava a respeito de um possível encontro com o Péricles que acabara de se retirar.
(...)
Não, ninguém! Ele deu contornos filosóficos à resposta e garantiu que “os homens que passam pela vida já acabaram de passar”. Particularmente sentia-se feliz porque estava com ela, que o completava, e era tudo o que sua vida precisava.
Nancy insistiu e perguntou se “a felicidade não está lá fora”. O velho respondeu em tom de gracejo que sim, a felicidade está lá fora e lhe mandou lembranças. Ele mesmo a encontrara “na porta de uma igreja, pedindo esmolas”... Emendou que a ilusão havia passado antes dele e lhe dera uma fortuna (à felicidade).
(...)
Demonstrando que aceitava aquela troca de frases enigmáticas, a mulher perguntou se a felicidade decidiu permanecer à porta da igreja. Ele confirmou e admitiu que “a felicidade é muito inteligente e sabe que o dinheiro da ilusão ou é falso ou é roubado”.
Nancy ainda perguntou o que ele queria dizer com aquela última frase. O velho respondeu-lhe que elas (felicidade e ilusão) “são amigas íntimas e entendem-se perfeitamente”. Antes que ela chegasse a um estado de maior preocupação, ele a beijou, anunciou que era momento de parar com a temática filosófica e quis saber se Péricles já havia estado na casa...
Nancy mentiu ao dizer que o rapaz não aparecera... No mesmo instante o velho o chamou de “ingrato”... E por quê? A outra quis entender. Então ele respondeu que havia pedido ao moço que voltasse, pois queria “regenerá-lo”, para que, dessa forma, ela não se envergonhasse dele.
É claro que essas palavras a fizeram tremer... O velho percebeu e disse-lhe que, em sua existência, só havia “lugar para uma mentira, a grande mentira que é a verdade da vida”, e que jamais lhe revelaria. Na sequência explicou que tinha dado cem contos ao Péricles na última noite “para que ele repusesse na caixa do Banco em que trabalha a importância de um desfalque”.
Essa revelação a deixou espantada... O velho notou e entendeu que devia explicar melhor, então disse que o rapaz manifestou sua vontade de devolver-lhe o dinheiro, todavia o aconselhou a indenizar devidamente o Banco, pois temia que o jovem pusesse em prática um plano de fuga no qual vinha refletindo.
(...)
Nancy não conseguiu disfarçar seu desalento e resolveu dizer que Péricles estava “regenerado” e que havia resolvido devolver o dinheiro... Então quer dizer que ele estivera na casa? Sim, ela garantiu e foi logo retirando os pacotes que estavam no jarro.
O velho mostrou-se surpreso e manifestou que Péricles era mesmo “um bom rapaz”... Amargurada, Nancy perguntou-lhe, retomando a conversa anterior, se a felicidade havia lhe mandado lembranças depois de ter recebido “uma fortuna das mãos da ilusão”... O outro confirmou e quis saber se ela gostava de saber.
Nancy respondeu que sim, gostava do que “recebia”, mas ressaltou que era inimiga da ilusão... Depois pediu que se sentassem no divã e perguntou-lhe se acreditava na “força do destino”. O velho respondeu que acreditava na força, mas não no destino.
E por quê? Ela insistiu e ele sentenciou que o destino dela devia ser diferente do dele, sendo assim entendia como natural que eventualmente pudesse se sentir impelida a uma vida diferente. Ela assentiu, mas observou que devia haver uma força, talvez a “força do destino” que a prendia a ele.
O velho não concordou. Não há nada de destino. Em vez disso, ela devia considerar “a força da inteligência”. Vivemos e desejamos! Acrescentou ainda que “gostar da vida é ter os desejos satisfeitos” e que era notório que ela gostava da vida, mas seria absurdo pretender que gostasse dele...
De modo simplificado o velho concluiu seu raciocínio afirmando que havia conseguido que ela gostasse da vida que “apenas ele podia lhe oferecer”. Nancy observou que “muitos podem oferecer dinheiro”... Ele redarguiu afirmando que “nem todos sabem dar”.
Leia: “Deus lhe pague”. Ediouro.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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