Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/03/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma.html antes
de ler esta postagem:
Ainda
ao tempo das Guerras Napoleônicas, Friedrich Jahn já fazia a defesa de uma configuração
da Alemanha que viria a se estruturar... Sua proposta incluía a incorporação de
territórios como Suíça, Países Baixos, Dinamarca, Prússia e Áustria. Para o
grandioso país seria construída uma capital sob medida, Teutona.
Nacionalistas como Jahn eram favoráveis à democracia, já que essa forma
de governo possibilitaria o envolvimento dos “nacionais” e o seu sentimento de
“pertencimento à nação”... Os defensores do tradicionalismo se opuseram, pelo
menos no começo, à mentalidade nacionalista e às propostas de unificação da
Alemanha e da Itália.
(...)
Os nacionalistas tinham uma
linguagem que Lynn Hunt associa ao “universalismo messiânico”. Para eles, os
direitos não propiciariam uma realidade universalista que se pudesse atribuir aos
seres humanos, mas sim a nação... A título de exemplificação, o texto cita Simon
Bolívar, que estava convicto de que a Colômbia emancipada “iluminaria o caminho
para a liberdade e a justiça universais”; Mazzini, que havia fundado a
Sociedade da Jovem Itália, associação nacionalista que participou ativamente do
processo de unificação, afiançou que os italianos “liderariam uma cruzada
universal dos povos oprimidos pela liberdade”; Adam Mickiewicz, poeta polonês,
anunciava que seu povo mostraria “o caminho para a libertação universal”.
Evidentemente, para os nacionalistas, a
“autodeterminação nacional” era prioritária e os “direitos humanos” dependiam
dela.
(...)
Em 1848 ocorreu uma série de revoluções pela Europa... A chamada
“Primavera dos Povos” foi marcada por reivindicações variadas de acordo com a
realidade de cada país. Houve demandas de caráter nacionalista (principalmente
na Itália e na Alemanha) e em outros casos (França), as ideias socialistas
empolgaram o proletariado.
A autora afirma que após esses episódios os
tradicionalistas passaram a admitir as propostas nacionalistas e, assim, “o nacionalismo
passou da esquerda para a direita no espectro político”. O fracasso dos
movimentos de caráter nacionalista e constitucionalista (Alemanha, Itália e
Hungria) “abriu o caminho para a mudança”. Os nacionalistas demonstraram que
não admitiriam direitos a “outros grupos étnicos”... Foi o que aconteceu em
Frankfurt, onde se reuniu uma Assembleia Constituinte marcada pela negação a
“qualquer autodeterminação aos dinamarqueses, poloneses ou tchecos dentro de
suas fronteiras propostas”... Também os húngaros, que pleiteavam a emancipação
em relação à Áustria, não deram qualquer atenção às demandas de “romenos,
eslovacos, croatas ou eslovenos”, que, somados, representavam “mais da metade
da população da Hungria”.
Uma conclusão que se pode tirar dos resultados dos movimentos sociais de
1848 é que a “intolerância étnica” contribuiu para o seu fracasso. Além disso,
a mesma intolerância tornou insustentável qualquer relação “entre os direitos e
a autodeterminação nacional”.
Também a título de exemplificação, as unificações de Itália e Alemanha,
que ocorreram décadas mais tarde, foram marcadas pelo conflito bélico e
diplomático... Deve-se destacar que a “garantia dos direitos individuais não
desempenhou qualquer papel nos processos”.
(...)
Muitos nacionalistas
sustentaram que a autodeterminação nacional asseguraria os direitos... Mas cada
vez mais as fundamentações nacionalistas se tornaram mais fechadas e
“defensivas”. A grande dificuldade de se “criar uma nação” explica o
fenômeno... Uma questão que salta aos olhos é a que apresenta a ideia de uma Europa
dividida “em nações-Estados de etnicidade e cultura relativamente
homogêneas”. Isso porque na verdade cada
nação-Estado possuía em seu seio “minorias culturais e linguísticas”
entranhadas desde muito tempo.
Quando, em 1870, a França novamente
se tornou uma República, metade de sua população sequer falava o francês... E
entre os demais “da outra metade” havia os que se comunicavam em dialetos ou
línguas de suas regiões, “como o bretão, o franco-provençal, o basco, o
alsaciano, o catalão, o córsico, o occitano”... E mais: nas colônias falava-se
o crioulo! Não foi por acaso que o país realizou campanha de educação para o
ensino da língua e para “integrar todos na nação”.
Na
fragmentada Itália havia a barreira da “heterogeneidade étnica”... Após a
unificação, o rei Vitor Emanuel II tornou Camillo di Cavour o primeiro-ministro.
Este tinha o piemontês como primeira língua. A rigor, menos de 3% os que
habitavam o país “falavam o italiano padrão”.
Na parte oriental da Europa o caso era ainda mais flagrante, já que
muitas etnias conviviam nos mesmos territórios... Uma eventual unificação na
Polônia atingiria grupos de línguas e tradições diversas como judeus, lituanos,
ucranianos, alemães e bielo-russos.
(...)
O livro destaca que a
dificuldade em relação a se obter ou manter a homogeneidade étnica levou vários
países a impor medidas contrárias à imigração. Antes da década de 1860 isso não
havia sido comum. Mas principalmente a partir da década de 1880 notou-se
restrições e proibições. Foi o que se viu na Austrália, que, na tentativa de
preservar “o seu caráter inglês e irlandês, tentou barrar a entrada de
asiáticos.
Isso ocorreu também nos Estados Unidos em 1822,
quando a imigração de chineses foi proibida... Mais tarde (1917 e 1924) a
proibição se estendeu aos demais asiáticos.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/03/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_15.html
Leia: A
Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um
abraço,
Prof.Gilberto