domingo, 7 de março de 2021

“Rei do Congo – A mentira que virou folclore”, de José Ramos Tinhorão – Lisboa e outras cidades portuguesas, “terras de negros”; fragmentos de “Das origens da escravidão moderna em Portugal”, de Antonio Pedro de Carvalho, sobre o histórico da introdução de africanos em Portugal; trechos dos registros de Hieronymus Münzer sobre a miscigenação notada em Lisboa em fins do século XV; fragmentos de Tinhorão a respeito das alterações na composição social de Portugal e Espanha

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/03/rei-do-congo-mentira-que-virou-folclore.html antes de ler esta postagem:

O fato é que, apesar de fracassado o plano de “criação de um reino à maneira dos brancos” no Congo, desde o século XV a Península Ibérica já vinha se transformando em “terras de negros”...
Tinhorão apresenta alguns documentos que revelam essa realidade que sem dúvida chamou a atenção de cronistas e viajantes de outras partes da Europa. Milhares de negros foram introduzidos anualmente na península, mais regularmente em Portugal, onde algumas cidades passaram a se destacar por significativo contingente miscigenado...
(...)
Lisboa foi um dos primeiros centros a perceber a “novidade das diferenças étnicas”... Inicialmente foram os árabes que se dedicaram ao comércio de escravos encaminhados para Portugal... A partir da conquista de técnicas de navegação de “mar aberto”, e dos avanços mais ao sul, os portugueses passaram a dominar o lucrativo negócio.
E isso se deu logo que começaram os contatos dos navegadores lusitanos com os povos do norte da África, região de influência árabe que, como devemos saber, era povoada por mauritanos, marroquinos e argelinos do Magrebe... Como vimos, posteriormente os portugueses atingiram as proximidades do Senegal e, a partir daí, o litoral mais ao sul, a chamada “terra dos negros”.
Para melhor esclarecimento do até aqui exposto, o autor selecionou fragmento de “Das origens da escravidão moderna em Portugal” (1877), de Antonio Pedro de Carvalho:

                   “resumindo, podemos deixar por assentado que tais castas de homens de raça negra vieram a Portugal em navios portugueses desde o tempo de Ceuta (1415) até a época de D. João II (1481-1485): 1º) mouros azenegues tomados em atos de guerra, em virtude do mesmo estilo de represália que incitava os portugueses contra os árabes, mas tratados mais humanamente por se submeterem mais facilmente ao jugo da Igreja; 2º) negros gentios cativados por excesso dos capitães, o que D. Henrique estimava receber porque lhe davam informações de terras cujo descobrimento o preocupava, mas que ele proibiu que entrassem a ser violentados; 3º) negros gentios escravizados em África pelos árabes ou pelos próprios naturais, e por eles vendidos ou dados de presente”.

Há uma nota referente a este fragmento que cita outro trecho de “Das origens da escravidão moderna em Portugal” e esclarece que “em 1487, Bemoin, rei do Senegal, mandou àquele monarca (D. João II) representante com escravos e outras coisas de valor”.
(...)
A introdução da diversidade étnica resultou em miscigenação, algo como “a explosão de uma ampla variedade de gradações na cor da pele dos europeus locais entre o branco e o negro”...
A este respeito, o livro destaca fragmento dos escritos de um médico alemão, Hieronymus Münzer, que, buscando escapar do avanço da peste em seu país, passou por Lisboa em 1494.
Münzer havia sido recepcionado por D. João II em Évora e não deixou de registrar que:

                   “Há em Lisboa muitíssimos homens e marinheiros que se empregam nesta navegação para a Etiópia a Guiné e é verdadeiramente extraordinária a quantidade de escravos negros e acobreados que nesta cidade existem. Aqueles que são das cercanias dos trópicos de Câncer e Capricórnio são cor de cobre, e aqueles que são de regiões equinociais são pretos retintos”.

Segundo o próprio Tinhorão, “Portugal e Espanha jamais passaram mais de duzentos anos sem sofrer alterações em sua composição social”:

                   “ao iniciar-se a era cristã, celtas e ibérios deram origem aos celtiberos, que seriam os lusitanos; pelos anos 200 chegaram os romanos; pelos 400, os germanos e anglo-saxões; em fins de 500, os visigodos e arianos; e, finalmente, em início dos 700, os árabes e berberes do norte da África que, sob o nome de mouros ou sarracenos, se integraram aqui e ali à vida da Península durante os seguintes oito séculos”.

Leia: Rei do Congo. Editora 34.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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