Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/03/deus-lhe-pague-peca-de-joracy-camargo_30.html antes
de ler esta postagem:
Péricles
gostou de ouvir Nancy dizer que fugiriam e que seriam felizes caso ele
conseguisse os cem contos... E ela confirmou que, numa realidade completamente
nova, sempre receberia um pouco do dinheiro e cada vez mais se certificaria de
que a felicidade não está nele, mas no amor... Emendou que “o amor é bem comum”,
porém “os donos do mundo o açambarcaram e o tornaram inacessível, como o custo
da própria vida!”.
O rapaz entendeu que ela recorria a juízos apreendidos com o velho,
então a corrigiu garantindo que “o amor é como o ar, a água e o céu! O amor é
de todos!” Novamente Nancy retrucou afirmando que seu pretendente era inocente
ao não perceber que “o amor pertence ao dinheiro” e que “o dinheiro pertence a
meia dúzia”... Somente pagando um “tributo aos donos da vida” podemos viver...
E “para amar é preciso viver!” Péricles insistiu que “a vida é nossa”, e ela
não discordou, porém emendou que “a vida é de todos, mas está nas mãos deles”.
Ela procurou mostrar ao jovem
enamorado que, se aceitasse corresponder ao seu amor, ele seria como o “ladrão
do amor” que já havia sido vendido ao velho. Péricles questionou o motivo de
ela ter “vendido o amor”.
Em resposta, Nancy quis mostrar que essa havia sido a
condição para que pudesse viver... O rapaz redarguiu dizendo que “há muitos
meios de viver”. Ela disse que tudo dependia dos “donos da vida” e que era uma
questão de eles consentirem ou não... Assim, os destinos das pessoas estão em
suas mãos e, de acordo com o interesse deles, elas são felizes ou infelizes.
Nancy sentenciou que “ninguém é feliz, ladrão ou assassino por vontade
própria”. Péricles admitiu que, se era assim, deviam “roubar um pouco de
felicidade”. Ela retrucou novamente ao dizer-lhe que aquela sugestão não era
das que se realizam facilmente.
O moço animou-se a dizer que no dia seguinte teria cem
contos em mãos... Nancy duvidou. Estaria louco? Mentindo? De modo algum! Foi o
que ele respondeu ao mesmo tempo em que afirmou que também ele tem o direito de
viver. E sem estender mais a conversa perguntou à amada se estavam acertados
para o dia seguinte...
Ela sinalizou que sim. Desde a porta, Péricles perguntou quanto valiam
cem contos em suas mãos... Nancy não escondeu a animação e respondeu que a
quantia valia toda felicidade que não pertencia a eles... Sim, ele concordou,
mas ressaltou que haveriam de roubá-la e que, com o dinheiro, teriam “a
felicidade que está nas mãos dos donos da vida”.
(...)
Aos poucos o cenário se escurece... Outro ambiente se ilumina. E este é
o da porta da igreja onde se encontravam o velho mendigo e seu companheiro Barata.
(...)
Barata ouviu atentamente a
história... No final discordou da decisão de Péricles e Nancy... Fugir? Uma
bobagem! Isso não adianta!
O velho admitiu que o
camarada estava progredindo em suas análises, emendou que “a Terra é uma grande
penitenciária” e que só mesmo quando chegamos ao fim de nossas existências, ao
sermos “encerrados nos cubículos escuros dos cemitérios”, “é que somos postos
em liberdade”. Nesse sentido, os suicidas são os que “fogem”.
Barata
animou-se a dizer que “ninguém vive em liberdade”. O velho provocou perguntando
o que é a liberdade e o outro respondeu que “á andar à vontade, podendo fazer o
que quiser”.
O velho comentou que os prisioneiros também “ficam em liberdade em suas celas”...
Barata observou que “as celas são muito pequenas” e ouviu o outro dizer que “são
um pouco menores” do que os cubículos onde vivemos.
Barata não aceitou a ideia
e quis mostrar que ele mesmo vivia bem e em largos espaços... O velho entendeu
que o colega estava querendo associar as “ruas da cidade” por onde mendigava
aos seus “largos espaços”, todavia observou que elas “são muito menores do que
os cubículos para os presos”.
Por viver fora da prisão, o mendigo Barata considerava
que devia se esforçar para viver, mas que tinha liberdade. O outro continuou a
retrucar afirmando que o camarada era “dos mais infelizes penitenciários da
vida” e que provavelmente jamais conhecera a verdadeira liberdade... E por quê?
“Porque a liberdade é felicidade e nada mais”... O velho disse isso e
prosseguiu afirmando que há condenados que mesmo após terem cumprido sua pena “pedem
para ficar na prisão”. No entanto todos creem que “só é feliz quem está fora da
prisão”.
Barata quis concluir que, já que é assim, então “é melhor morrer do que
viver preso a vida inteira”. E o velho completou dizendo que “então é mais
feliz um homem condenado à morte do que um homem condenado a morrer de fome”. E
por quê? Barata quis saber e ouviu do companheiro que “ambos morrem. Um morre
na miséria, inocentemente. E o outro, que procurou a morte, cometendo um crime,
morre cercado de todo o conforto, depois de satisfeitas todas as suas vontades,
por mais absurdas que sejam”...
Aquelas considerações eram demais para o Barata. Por
isso ele disse que o velho era terrível. Este respondeu que “terrível é a vida”.
Será mesmo? Barata sugeriu que, para o companheiro cheio de histórias, a vida devia
ser sempre cheia de prazer... Nem mesmo a mulher o fazia sofrer!
O velho explicou que “a mulher é invencível”, mas “se rende à inteligência”...
Barata balançou a cabeça e disse que nem sempre era como o outro estava
dizendo. Na sequência confessou que queria conhecer o “final da história”, mas
ouviu o camarada afirmar que as histórias não acabam. Ocorre que se sucedem “novos
personagens” na trama... E isso o que é? A vida!
Barata perguntou se o moço que havia se interessado por Nancy havia
morrido... O velho respondeu que não. E não morreria enquanto não pagasse o que
lhe devia.
(...)
No mesmo instante o próprio
Péricles passou diante dos mendigos e atirou uma pratinha ao velho. O velho
apontou para o tipo e revelou ao Barata quem era aquele que acabava de dar-lhe
dez tostões... “Deus lhe pague”.
Este é o fim do segundo ato.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/03/deus-lhe-pague-peca-de-joracy-camargo_19.html
Leia: “Deus
lhe pague”. Ediouro.
Um
abraço,
Prof.Gilberto