Barata ouviu do velho que ele já juntara muito
dinheiro... Então sugeriu-lhe que aplicasse o acumulado e vivesse de renda...
Poderia tentar investir no ramo industrial ou no comércio... O outro respondeu
que não tinha jeito para negócios e por questão de princípios não se envolveria
em transações para lucrar explorando os demais. Na condição de mendigo “cobra
da sociedade o que ela lhe deve” e sua intenção era fazê-lo até o último
centavo.
O amigo quis saber se a sociedade lhe devia muito... Enigmático, o velho
respondeu que a sociedade lhe deve “tudo o que devia pertencer-lhe”. Depois
passou a falar sobre uma “distribuição igualitária das riquezas”, algo ainda
distante de ocorrer no mundo, mas que, segundo ele, fatalmente ocorrerá um dia...
Até lá continuaria cobrando, ainda que “pequenas quantias, humildemente”.
(...)
Barata o interrompeu
e apontou para uma que vinha chegando à igreja... É exatamente aquela que havia
sido despejada do hotel e que, pelo visto se arranjara com o homem misterioso,
amante da música de Wagner, benevolente e rico. Mais do que depressa, o velho
procura se esconder para não ser visto por ela. Bem ao contrário, Barata não
perdeu a chance de pedir-lhe, e foi prontamente atendido.
O mendigo exclamou que só recebeu uma moeda, então concluiu que ela
devia estar pobre. O velho disse que sabia muito bem que ela é rica e que
possui de tudo o que o dinheiro possa comprar. Barata perguntou se o dinheiro
era dela... Em resposta ouviu um “sim, até onde algo pode ser de alguém”.
(...)
Depois
veio uma explicação “panfletária”...
O velho disse que no princípio tudo era de todos, a terra e a água não
pertenciam a ninguém... Mas na sociedade em que vivemos cada pedaço de terra e
nascente têm dono. Em sua ingenuidade, Barata quis saber quem lhes deu...
Obviamente a resposta é complexa. O velho sugeriu que perguntassem ao dono de
um hectare de terra... Obviamente ele diria que o comprou de um dono antigo. E
esse antigo, de quem adquiriu? E os anteriores? Alguém deve ter sido o “primeiro
dono”... De quem ele comprou a terra? De ninguém! Pegou a terra para si por
conta própria! E com que direito fez isso? Barata não podia entender... Mas o
velho prosseguiu dizendo que o Direito foi inventado exatamente para garantir a
propriedade.
(...)
Barata aceitou que os
que criaram a trama da propriedade não tinham o “direito” de fazê-lo... Então
decidiu voltar a falar da mulher rica... Por que estaria de mal humor? O velho
disse que era algo que o amigo devia aprender... O dinheiro traz tristeza e “tem
como nome o seu pecado original”. Barata argumentou que da primeira vez que a
tinham visto ela caminhava contente... Estaria doente? Se não era o caso, devia
se alegrar, dar festas... O velho disse que sabia que na casa onde ela morava
acontecia uma festa naquele mesmo momento.
Barata
topou ir à frente da casa. Não teriam
como saber do ambiente interior, mas na rua “as pessoas não usam máscaras” e eles
poderiam ver e ouvir os assuntos dos ricos convidados. Depois que elas ingressam
na festa é que “colocam máscaras”.
Logo que chegaram
tiveram a oportunidade de observar a saudação de convidados e um diálogo entre
alguns motoristas particulares... Um dos motoristas quis saber se já havia
muita gente na residência... Sim, a casa já estava bem cheia... Um outro disse
que “o dinheiro pede, e o dono da casa pede dinheiro”, referindo-se à ideia de
que “dinheiro atrai dinheiro”. Alguém comentou que a situação havia mudado
recentemente, pois antes de o proprietário se casar o lugar mais parecia um
cemitério. Um motorista que servia à casa garantiu que o dia-a-dia era dos mais
fartos ali, com champanhe francês em todas as refeições... E como poderia
saber? Alguém perguntou... O tipo respondeu que ele mesmo tinha duas garrafas
no carro que lhe foram dadas pelo jardineiro. Um outro logo se interessou e
afirmou que pediria uma garrafa para si... Nisso foi alertado de que teria de “dar
algo em troca”. Mesmo assim consideraram que valia a pena e se retiraram para
conversar com o jardineiro naquele mesmo instante.
(...)
Barata
que ouvia à conversa com atenção cutucou o velho sugerindo irem também... O
amigo perguntou-lhe para quê queria champanhe... Barata respondeu no mesmo instante
que nunca tinha provado. O velho argumentou que ele tinha muita sorte por nunca
ter experimentado da bebida, pois assim nunca sentiria falta dela.
Indicação (não informada)
Um abraço,
Prof.Gilberto