Como vimos, Burke fez severas críticas à
“Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”. Sua oposição às manifestações
de Richard Price despertou contra-ataques. Um deles partiu de Mary
Wollstonecraft, filósofa e defensora inglesa dos direitos das mulheres, com o
seu “Vindication of the Rights of Men, in a Letter to the Right Honourable
Emund Burke; Occasioned by his Reflections os the Revolution in France” de
1790.
Na postagem anterior
citamos que Thomas Paine publicou “Os direitos do homem: uma resposta ao ataque
do Sr. Burke à revolução francesa” em 1791. A respeito dessa “resposta”, “A
Invenção dos Direitos Humanos” traz o trecho abaixo:
“O
Sr. Burke, com sua costumeira violência insultou a Declaração dos Direitos do
Homem. (...) A essa chamou de ‘pedaços miseráveis de papel borrado sobre os
direitos do homem’. O Sr. Burke pretende negar que o homem não tenha direitos? Nesse
caso, deve querer dizer que não existem tais direitos em nenhum lugar, e que
ele próprio não tenha nenhum: pois quem existe no mundo senão o homem?”
Na
oportunidade, Paine ainda mais provocou polêmicas por ter atacado as monarquias
de caráter hereditário, como a de seu país, a Inglaterra. Também por isso a
obra foi publicada diversas vezes, inclusive no mesmo ano em que foi lançada.
(...)
Após os
acontecimentos na França de 1789 apareceram muitas publicações que faziam
referências a “direitos” na Inglaterra. Lynn Hunt aponta que a quantidade de
livros em cujos títulos aparecia o termo citado quadruplicou durante a década
de 1790... Se na década anterior, a palavra “direitos” aparecia em 95 títulos, nos
dez anos que se seguiram à Revolução Francesa esse número alcançou a cifra dos 418.
Na Holanda
este fenômeno também foi notado. A tradução do livro de Paine em 1791 fez “rechten
van des mensch” (direitos humanos) aparecer pela primeira vez em livros divulgados pelas
livrarias daquele país. Durante toda a década ocorreu o mesmo em outras
paragens de língua alemã.
Então podemos dizer
que, ironicamente, a polêmica que ocorreu entre os intelectuais ingleses a
respeito dos acontecimentos revolucionários na França fez “direitos do homem” chegarem
aos debates de públicos internacionais. Algo certamente mais impactante do que
havia ocorrido após a Independência dos Estados Unidos. Isso deve ter ocorrido
também porque a organização política dos demais países europeus era semelhante
à da França... Além disso, os que debatiam a questão dos direitos na Europa não
se apartaram da linguagem universalista.
Como não podia deixar
de ser, também nos Estados Unidos ocorreram discussões provocadas por temáticas
suscitadas pela Revolução Francesa. Via-se que os “direitos do homem” eram
sempre citados e defendidos pelos que acompanhavam as ideias de Thomas
Jefferson... Já os “federalistas” não só evitavam o termo como desprezavam a
linguagem mais associada a “excesso democrático”, que podia significar uma
ameaça “à autoridade estabelecida”.
(...)
Após a Assembleia ter aprovado a “Declaração os Direitos do Homem e do
Cidadão”, havia certa angústia por parte de alguns representantes que esperavam
iniciar a discussão e votação de uma série de “ressalvas”. Todavia um tema
específico passou a ocupar as plenárias, e ele dizia respeito aos “usos da
tortura judicial” nos procedimentos criminais.
Cerca de um mês e meio depois da aprovação de 27 de agosto de 1789, os
deputados aprovaram a abolição da tortura judicial. Essa medida fazia parte de
uma “reforma” pretendida para os encaminhamentos dos processos judiciais. No
dia 10 de setembro a Assembleia recebeu a petição enviada pelo Conselho da
cidade de Paris “em nome da ‘razão e humanidade’”.
As reformas pretendidas para os processos
judiciais eram colocadas pelos parisienses no sentido de se “resgatar a inocência”
ou de se estabelecer mais coerentemente “as provas do crime (que tornariam) a
condenação mais certa”.
Acontece que logo
após o 14 de julho ocorreram várias sublevações na capital durante as semanas
seguintes... A “nova Guarda Nacional” estava sendo comandada por Lafayette e fez
várias prisões. Muitos membros do conselho da cidade ouviram questionamentos
sobre a possibilidade de os procedimentos judiciais que ainda vigoravam
servirem aos inimigos da Revolução nos processos que seriam abertos.
Diante
da demanda do conselho de Paris, “a Assembleia Nacional nomeou um ‘Comitê dos
Sete’ para redigir as reformas mais prementes, não apenas para Paris mas para
toda a nação”.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/06/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_9.html
Leia: A
Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto