terça-feira, 2 de junho de 2020

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – discussões acaloradas sobre a necessidade de definir uma declaração de direitos; Jefferson escreve a Paine, revela sua opinião em relatos sobre os episódios na França; Lafayette e outros deputados apressam-se a emitir seus rascunhos de declaração; características das propostas e a Queda da Bastilha; lacunas nos debates sobre a declaração; Saint-Étienne entende que os franceses devem repetir o exemplo norte-americano; enfim a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão foi aprovada

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/06/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma.html antes de ler esta postagem:

A última postagem fez referência à convocação dos Estados Gerais e às listas de queixas apresentadas pelos segmentos sociais... Vimos que nobres e população em geral esperavam que seus representantes discutissem e aprovassem uma declaração de direitos. Os deputados do Terceiro Estado se declararam em Assembleia Nacional, e logo a 19 de junho um deles solicitou que a Assembleia iniciasse logo a “grande tarefa de uma declaração de direitos” tal como os eleitores haviam exigido.
Não era verdade que tal exigência fosse preocupação geral, mas era certo que, como vimos, nos círculos onde se discutiam os rumos da nação falava-se muito da ideia da declaração dos direitos. No dia 6 de julho um comitê esclareceu à Assembleia que se concentrariam na discussão e redação de uma “declaração dos direitos naturais e imprescindíveis do homem”.
(...)
Thomas Jefferson encontrava-se em Paris na ocasião e no dia 11 de julho escreveu uma carta endereçada a Thomas Paine, que estava na Inglaterra. Ao receber a missiva, o autor de “Common Sense”, panfleto que se tornou dos mais influentes na América do Norte durante os acontecimentos de 1776, ficou sabendo que na opinião de Jefferson os representantes reunidos na Assembleia Nacional haviam colocado termo ao velho governo e estavam decididos a dar início a um novo a partir da “estaca zero”.
Jefferson relatou a Paine que os deputados franceses tomavam como primeira tarefa elaborar um projeto de “uma Declaração dos direitos naturais e imprescindíveis do homem”. Ele usou os mesmos termos do comitê que havia se organizado e anunciado sua intenção na semana anterior.
Interessado pelos acontecimentos na França e pelos rumos que a movimentação tomaria, Thomas Jefferson, ainda naquela ocasião, conversou com Lafayette... Este resolveu ler para o amigo o rascunho que havia produzido com a proposta de declaração que pretendia apresentar à Assembleia. Sua ansiedade se explicava também porque outros deputados que surgiam como lideranças se apressavam para imprimir as próprias propostas.
(...)
De um modo geral as propostas de declaração revelavam terminologia semelhante. Quando não se referiam a “os direitos do homem na sociedade”, citavam “os direitos do cidadão francês” ou “direitos”. Nos títulos o que predominava era “os direitos do homem”.
Depois de três dias da carta de Jefferson a Paine, Paris foi agitada (no 14 de julho) pela população que se armou e atacou a Bastilha e vários outros locais que representavam o governo absolutista. Todos sabiam das determinações do monarca ao ordenar o posicionamento de tropas na capital... Muitos dos representantes se pronunciando garantindo que tudo indicava que a Assembleia sofreria um golpe. Por fim o rei voltou atrás e retirou os soldados.
O problema da declaração persistia... Entre o fim de julho e o início de agosto os deputados ainda discutiam se a declaração era mesmo necessária, se ela introduziria o texto da Constituição e se tinha de ser acrescentada por uma declaração específica sobre os deveres dos cidadãos. No fundo as divisões eram um sintoma da falta de acordo sobre os passos seguintes.
Alguns entendiam que a Monarquia precisava apenas de passar por alguns ajustes. Isso quer dizer que não havia necessidade de votarem uma declaração de “direitos do homem”. Havia os que pensavam como Thomas Jefferson e acreditavam que um novo governo, construído a partir da estaca zero, tinha de ser formalizado. Esses certamente viam a declaração de direitos como fundamental.
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Depois de muita discussão, a Assembleia decidiu que votaria uma redação de declaração que constasse apenas dos direitos. A autora destaca que ninguém nunca esclareceu “adequadamente” como foi que os deputados chegaram a essa definição. A verdade é que muitos se mantinham ocupados em debates sobre as situações mais cotidianas e sequer compreendiam as consequências das decisões que tomavam em plenário. Muitas cartas, memórias e documentos diversos desses atores se mostram repletos de lacunas em relação às mudanças das opiniões de então. Sabe-se que muitos alimentavam esperanças na mudança e em tudo o que ela podia trazer de novo.
Acreditava-se que os direitos pudessem fornecer os princípios para a organização do governo que se estruturaria... Declarariam os direitos e, do mesmo modo que os americanos, definiriam uma ruptura com o passado, por fim uma forma alternativa de governo se estabeleceria. É como o deputado Rabaut Saint-Étienne comentava a 18/agosto:

                   “como os americanos, queremos nos regenerar, e assim a declaração de direitos é essencialmente necessária”.

Os debates foram concorridos e até animados... Havia os que zombavam dos muitos entraves marcados por “discussões metafísicas”. Aprovou-se um “documento de compromisso” elaborado por um subcomitê formado por quarenta membros (muitos deles eram anônimos). Entre 20 e 26 de agosto ocorreram contendas tumultuados em torno de 24 artigos propostos... Depois de votações de emendas e supressões concordaram e aprovaram os textos de dezessete deles.
No dia 27 de agosto o texto final da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão foi aprovado...
A assembleia aprovou também a suspensão de novas discussões sobre os temas com o compromisso de as retomar após a aprovação da Constituição...
Isso nunca ocorreu.
Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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