Logo se percebeu que a Declaração dos Direitos
“não resolvia todas as questões”... Por outro lado, ela tornou mais evidente
certas situações, como a dos que não possuíam propriedades e dos que eram
praticantes de religiões minoritárias. E isso sem se levar em conta a condição
de escravos e de mulheres, que sempre estiveram apartados das posições e
questões políticas.
Até pode ser que os que se
colocavam contra a aprovação de uma Declaração já desconfiassem que tal
documento trouxesse à tona debates envolvendo os demais carentes de direitos.
Muitos dos que participaram da elaboração e aprovação da Declaração
entenderam-se “apoderados da soberania” e não ligavam muita importância à
necessidade que alguns tinham de “esclarecer artigos de doutrina”.
Mas não havia como escapar de certas reflexões políticas... Cravou-se
que a Nação é soberana, então que papel teria o rei? Quem poderia representar
melhor a Nação? E mais... Uma vez que os direitos passaram a ser encarados como
“fundamento da legitimidade”, como explicar que eles não se estendiam a todos?
Não havia universalismo dos direitos em relação às idades, sexos, raças,
religiões renda...
(...)
O fenômeno ainda era
recente... Sabia-se que a linguagem e discussão em torno dos direitos emergiram
de certos hábitos que inovaram antigas práticas... Autonomia individual e
respeito à integridade do corpo de cada um tornaram-se novos paradigmas da
postura em sociedade, mas era evidente que as rebeldias e revoluções que
ocorreram durante o século XVIII fundamentavam-se também no novo comportamento
humano.
Uma outra questão que começou a abalar as mentes dos que refletiam acerca
do Direito foi sobre “quem devia, queria ou podia controlar os efeitos” de tais
movimentos sociais.
(...)
A Declaração dos direitos
não trouxe consequências apenas para a França. De um momento para outro, em
várias partes do mundo, ocorreram repercussões.
Mais uma vez Richard Price
colocou-se à frente de novas controvérsias... Como vimos, ele já havia causado
polêmica com seus panfletos e discursos em defesa dos “direitos da humanidade”
e apoio ao movimento dos norte-americanos em 1776. Mesmo depois de pesados
ataques ao seu ponto de vista, lançou novo panfleto em 1784, “Observations on
the Importance of the American Revolution”, no qual reafirmava suas posições ao
comparar a revolução norte-americana ao surgimento do Cristianismo e ao
predizer que ela “produziria uma difusão geral dos princípios da humanidade”.
Price era um apologista do
movimento por direitos... Só não podemos dizer que defendia em 100% o movimento
dos Estados Unidos porque não admitia a escravidão. Teólogo e pregador de
púlpito, exaltou o movimento na França num sermão de novembro de 1789:
“Vivi para ver os direitos dos
homens mais bem compreendidos do que nunca, e nações ansiando por liberdade que
pareciam ter perdido a ideia do que isso fosse. (...) Depois de partilhar os benefícios de uma
Revolução (1688), fui poupado para ser testemunha de duas outras Revoluções (a
americana e a francesa), ambas gloriosas”.
Neste ponto é importante destacarmos o período em que se estendeu a
existência de Price (23/fevereiro de 1723 a 19/abril de 1791). O fragmento do
sermão anteriormente exposto data do final de sua vida. Ainda assim, o teólogo
britânico foi alvo de ataques de desafetos políticos.
Foi o caso de Edmund Burke, que publicou um panfleto em 1790, “Reflexões
sobre a revolução na França”. Seus ataques a Richard Price provocaram novas
discussões em torno da questão dos direitos do homem. Para Burke, o “novo
império conquistador de luz e razão” não dava conta de garantir fundamento
ideal “para um governo bem sucedido, que tinha de estar arraigado nas tradições
duradouras de uma nação”.
Em
suas argumentações, Burke condenou especialmente a “Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão”. Evidentemente sua posição despertou contra-ataques como o
de Thomas Paine que, em 1791, publicou “Os direitos do homem: uma resposta ao
ataque do Sr. Burke à revolução francesa”.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/06/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_7.html
Leia: A
Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto