Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/07/1984-de-george-orwell-ao-se-dirigir.html antes
de ler esta postagem:
Tom Parsons também trabalhava no Ministério da
Verdade. Tratava-se de um tipo gorducho, que se envolvia no maior número de
atividades que pudesse... Winston o considerava o entusiasmo do outro uma
imbecilidade e, contrariando o que a maioria pensava, o via como exemplo de
“estupidez paralisante”, um servo que se dispunha à total dedicação ao
Partido...
Aliás, a estabilidade
do Partido dependia da fidelidade de tipos como o Tom Parsons, e isso o rapaz
não deixava de notar e criticar em seu íntimo. A trajetória dele era marcada
pelo engajamento fanático aos segmentos sociais do IngSoc, dessa forma
permaneceu um ano a mais do permitido no grupo dos “Espiões”. Depois ingressou
na Liga da Juventude, de onde só se desligou aos trinta e cinco anos.
Seu trabalho no Ministério não exigia maiores habilidades cognitivas e
ele se adaptava facilmente às tarefas que exigiam subordinação... Isso à parte,
destacava-se nos eventos planejados pelo Comitê Esportivo e nos demais relacionados
às organizações “de piqueniques e passeatas comunais, demonstrações
espontâneas, campanhas de economia e atividades voluntárias em geral”.
Tom
era do tipo que demonstrava orgulho com quem quer que falasse a respeito de sua
assiduidade nos eventos noturnos do Centro Comunal durante os últimos quatro
anos. Pelo visto pensava que o forte cheiro de seu suor fosse a chancela que a
todos revelava o seu empenho incondicional ao congraçamento dos camaradas.
(...)
Winston voltou-se
para a Sra. Parsons e perguntou se ela sabia onde estava a chave inglesa... Ela
pareceu indecisa e lembrou que talvez as crianças pudessem ajudar. Dirigiu-se à
sala e o rapaz pôde ouvir fortes pisadas de botinas e os sons extraídos do
pente com o qual se entretinham...
Depois
de algum tempo, ela retornou à cozinha com a ferramenta. Winston a manipulou no
sifão e conseguiu liberar a água imunda que estava acumulada. Com a sujeira,
retirou um grande volume de cabelos que entupiam o sistema. Na sequência lavou
as mãos e seguiu para a sala, onde foi cercado pelo garoto de nove anos e sua irmã
que contava sete anos.
O menino, que fazia o
tipo encrenqueiro e portava “uma pistola automática de brinquedo”, gritou ao
estranho que levantasse as mãos para o alto... A menina o acompanhava nas ameaças
segurando “um pedaço de madeira”.
As duas crianças usavam
“calções azuis, camisas cinzentas e o lenço vermelho que compunham o uniforme
dos Espiões”. A situação era das mais desagradáveis, pois os dois se mostravam
tão fanatizados que Winston não conseguia participar da dramatização com qualquer
gracejo...
O menino pôs-se a gritar que ele era um traidor, “um ideocriminoso, um
espião eurasiano”. Em sua fantasia, o mataria por se tratar de um inimigo, que devia
ser vaporizado, ou ainda mandado para as minas de sal.
Para quem estivera há pouco redigindo mensagens contrárias ao Grande
Irmão, aquilo só podia ser um pesadelo...
(...)
Os filhos dos Parsons começaram a dar pulos à
sua volta ao mesmo tempo em que berravam que ele era traidor e “ideocriminoso”.
Em tudo a garota imitava o irmão. Para Winston, o jogo das crianças lembrava “um
brinquedo de filhotes de tigre, que breve serão devoradores de homens”. Ele
notou que os olhos do menino exibiam a “ferocidade calculadora, um desejo
bastante evidente de esmurrar ou dar-lhe um pontapé”. A Sra. Parsons mostrava-se
nervosa... Estarrecida, parecia não conseguir dizer nada enquanto olhava para
os filhos e para o vizinho alternadamente. Também apavorado, o rapaz notou
neste momento que, de fato, ela trazia pó cosmético no rosto a fim de esconder
as rugas.
Depois de algum tempo
a mulher conseguiu comentar que as crianças ficavam barulhentas supostamente “porque
não puderam assistir ao enforcamento”. Lamentou por não ter condições de levá-los
e que o marido só chegaria do trabalho depois da execução pública. No mesmo
instante, o garoto começou a questionar por que não podiam ir ao enforcamento e
que ele queria “vê o enforcamento”. Sua irmã o imitou também nisso.
(...)
Naquela noite seriam enforcados alguns “prisioneiros eurasianos,
criminosos de guerra” em parque aberto. Esse tipo de evento era aberto ao
público ao mesmo uma vez por mês e os filhos dos Parsons sempre participavam
porque exigiam que Tom os levassem...
(...)
Muito
desajeitadamente, Winston se despediu e dirigiu-se para a porta... Começou a caminhar
pelo corredor e sentiu algo como “um arame em brasa” atingindo sua nuca com
violência. Virou-se e notou que a Sra. Parsons estava puxando o filho de volta
para o apartamento. Viu que o garoto possuía um estilingue, certamente a “arma”
utilizada para o seu ataque.
Ainda
o ouviu chamá-lo de "Goldstein", mas o que mais chamou sua atenção “foi o olhar
de terror inerme” da mulher que tinha um semblante acinzentado.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/07/1984-de-george-orwell-noticias-sobre-o.html
Leia: “1984”. Companhia Editora Nacional.
Um
abraço,
Prof.Gilberto