Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/06/o-estrangeiro-de-albert-camus-ninguem.html antes
de ler esta postagem:
Meursault
foi conduzido ao tribunal... A sala estava lotada e bem quente. Ele observou os
jurados e não conseguiu traçar distinções uns dos outros.
(...)
Também não conseguia associar a presença das pessoas a uma curiosidade
por ele ou o seu caso. Normalmente isso não ocorria, pois ninguém se
interessava pela sua pessoa.
Para se certificar de que
era isso mesmo, virou-se ao policial e comentou a respeito da “grande
quantidade de gente”. O tira falou que “era por causa dos jornais”, depois o
fez olhar “por debaixo do banco do júri” e observou que havia uma mesa ocupada
por vários jornalistas.
Um deles era conhecido do policial... Era um tipo “de
certa idade, simpático” e, de acordo com Meursault, tinha a “cara vincada”.
Este jornalista especificamente resolveu dirigir-se ao local onde ele estava e
cumprimentou o policial, seu conhecido.
Meursault olhou à volta e viu que todos conversavam. Parecia mesmo que
haviam se reunido ali porque tinham conversas para colocar em dia. Era como um
“clube”, onde os que pertencem ao “mesmo meio” gostam de se encontrar. Desse
modo, viu-se como alguém que “está a mais”, sobrando. E essa “impressão
bizarra” o levou a se considerar “um intruso”.
O jornalista mostrou-se simpático com Meursault e
conversou com ele. Falou “que esperava que tudo corresse bem”. Ele agradeceu e
ouviu que os jornais se empenharam na cobertura de seu caso porque durante o
verão não há muitos eventos a serem retratados. Emendou que o caso dele e o do
parricida eram as histórias que valiam a atenção do público.
O repórter mostrou-lhe um tipo da imprensa que estava com o “grupo que acabara
de deixar”. Este era de um jornal de Paris, um tipo gordo, que usava “grandes
óculos de aros negros”. Certamente não tinha vindo da França por causa do caso
de Meursault e sim pela repercussão do crime do parricida, mas, já que estava em
Argel, o jornal pediu-lhe que aproveitasse para cobrir outros julgamentos.
O homem despediu-se do amigo policial e fez um “aceno cordial” ao que
estava para ser julgado.
Meursault esteve a ponto de
lhe agradecer, mas não o fez porque sentiu “que seria ridículo”.
(...)
O advogado que cuidava da
defesa chegou devidamente paramentado para a ocasião. Alguns colegas o
acompanhavam. Meursault notou que ele se colocava bem à vontade entre os
jornalistas, que o cumprimentaram com aperto de mãos e troca de gracejos.
A campainha
tocou e cada um dirigiu-se ao devido lugar. O advogado se aproximou dele,
apertou-lhe a mão e deu alguns conselhos... Basicamente, que respondesse às
perguntas sem maiores rodeios e que não tomasse iniciativas. De resto, devia
confiar na defesa que ele faria.
Mais à sua esquerda, Meursault percebeu a presença do procurador, um
tipo “alto e magro, vestido de encarnado, com monóculo, que se sentava dobrando
cuidadosamente a toga”.
A atenção de todos
voltou-se para o oficial de justiça que, em alta e clara voz, anunciou os
juízes. Só neste momento é que fizeram funcionar dois grandes ventiladores da
sala. Dois juízes tinham a vestimenta preta, o terceiro estava de vermelho. Assim
que entraram, seguiram apressadamente para a tribuna. Levavam as pastas do
processo e o que estava com a toga vermelha posicionou-se entre os outros dois.
Ele tirou o gorro, usou um lenço para limpar a careca e foi dizendo que a
sessão se iniciava naquele momento.
Meursault voltou os olhos para a mesa dos jornalistas
e viu que eles já tomavam seus blocos de notas e canetas. Pareciam indiferentes
e até que desprezavam os rituais de início. Deu para perceber que um dos mais
novos, de olhos claros e que usava um casaco “de flanela cinzenta”, não parava
de encará-lo.
Meursault não conseguia definir a expressão daquele tipo, mas sentiu-se desconfortável
por estar sendo “examinado”. Percebeu que o outro o analisava não por algo que
sua posição ou gestos sugerissem, “mas pelo que era realmente”, ou seja, um réu
que seria julgado pelo cruel assassinato do árabe.
Sem o conhecimento “dos hábitos dos tribunais”,
Meursault não conseguia compreender os procedimentos que se seguiram: sorteio
dos jurados, as perguntas que o presidente da sessão fez ao seu advogado, ao
procurador e aos membros do corpo de jurados, que voltavam os olhares ao mesmo
tempo para a tribuna a cada pergunta que lhes era dirigida... Na sequência foi
feita a “leitura do ato de acusação”, e novas perguntas foram feitas ao
advogado. O rapaz reconheceu em citações “os nomes de lugares e de pessoas”.
Leia: “O
Estrangeiro”. Editora Abril.
Um
abraço,
Prof.Gilberto