Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/08/1984-de-george-orwell-uma-paisagem-ja.html antes
de ler esta postagem:
Júlia se comportou como uma profissional do sexo
e Winston mostrou-se ainda mais satisfeito... Ele perguntou se ela se sentia
vontade por tudo o que fazia, se gostava daquelas coisas... Não perguntava
exatamente a respeito de si, se sentia-se atraída por ele, mas nas iniciativas
que ela estava tomando. Ela disse que “adorava”, e que tinha mesmo preferência
pelos relacionamentos mais lascivos.
Winston achou bom ouvir
suas palavras... Como podemos notar, para ele “o instinto animal, o desejo
simples, indiscriminado, eram a força que faria a derrocada do Partido”.
Então podemos dizer que, com Júlia, sentia-se duplamente satisfeito...
Não por acaso se entregaram com volúpia na relva da clareira protegida pelas
árvores... Depois, completamente esgotados fisicamente, deixaram-se cair. A
temperatura havia se elevado e o forte calor os levou a um cochilo de uns
trinta minutos.
(...)
Quando Winston despertou,
pôs-se a contemplar a garota. Além das sardas, podia notar umas ruguinhas perto
dos olhos... Definitivamente não era exatamente bonita, mas tinha uma bela boca
e cabelos escuros, curtos, mas macios e densos. Um “corpo jovem e forte” que
ele nem sabia em que parte de Londres vivia. Não sabia sequer todo o seu nome! Havia
certa fragilidade na garota adormecida, então teve pena... Evidentemente no
momento ele devia protegê-la, todavia, quando desperta, parecia adquirir
blindagem própria.
A atração que o dominou
quando estiveram à sombra da aveleira não se repetiu... Continuou a apreciar a
pela clara e macia de Júlia pensando sobre como, no passado, assim que viam um
corpo feminino, os homens não perdiam tempo com conjecturas e logo “partiam
para cima”.
Os tempos eram bem outros e:
“não era (mais) possível ter amor
puro, ou pura lascívia. Não havia mais emoção pura; estava tudo misturado com
medo e ódio. A união fora uma batalha, o clímax uma vitória. Era um golpe
desferido no Partido. Era um ato político”.
(...)
Depois que despertou, Júlia
voltou a assumir a conduta altiva, “alerta e prática”. Arrumou-se rapidamente e
disse que poderiam voltar a se encontrar no mesmo local. Salientou que, se
fosse o caso, teriam de aguardar que um ou dois messes se passassem.
Enquanto ajustava a faixa escarlate na cintura deu algumas orientações
sobre a volta para a cidade. Winston ouviu-a com atenção, pois compreendia que
dos dois era ela quem tinha experiência naquele tipo de indisciplina, além de
conhecer melhor as circunvizinhanças de Londres graças aos inúmeros passeios
comunais.
De fato, Júlia ditou-lhe um itinerário completamente diferente do que
ele havia feito... Aliás, devia chegar a uma estação diferente da que havia
usado em sua partida para o campo. E disse-lhe ainda que jamais devia fazer o
mesmo caminho quando retornasse de suas aventuras. Falava com ares de quem
muito entendia que aquele era um princípio que não podia ser ignorado. Depois
anunciou que sairia antes e que ele deveria aguardar meia hora após a sua
partida para também deixar a clareira.
Sem perder tempo, falou-lhe o nome de uma rua de
um bairro prole onde poderiam se encontrar após quatro dias... Obviamente seria
depois do trabalho... No local ocorria uma feira sempre concorrida por “gente
muito ruidosa”. Combinou que estaria numa barraca como que a procurar algo
específico (cadarços ou linha de costura) e que se não percebesse qualquer
perigo faria um sinal (assoaria o nariz) para que se aproximasse. Insistiu que,
se não fizesse o sinal, ele devia passar direto sem demonstrar que a conhece. Se
tudo corresse bem, poderiam conversar por uns quinze minutos no meio da
agitação popular e combinar novo encontro.
Por fim, Júlia disse que
tinha de se retirar... Certificou-se de que ele havia decorado suas instruções
e acrescentou que devia estar de volta às sete e trinta da noite, pois
trabalharia “duas horas para a Liga Juvenil Anti-Sexo”. Pôs-se a falar
rapidamente que, sem dúvida, era “algo horroroso”. Na sequência pediu ao
Winston que passasse uma escova em sua roupa e pediu que cuidasse de limpar
eventuais pedaços de folhas ou de pequenos ramos em seus cabelos.
Devidamente preparada, ainda o abraçou e beijou... “Adeus, meu amor,
adeus”, foi o que disse por fim e desapareceu por um caminho em meio à folhagem
sem provocar qualquer ruído.
(...)
Como notamos, Winston foi
“todo atenção”.
Ao se ver só, pensou
novamente que não conhecia todo o nome de Júlia e não sabia onde ela morava.
Mas entendeu que isso não tinha a menor importância, até porque não teriam
chance de se encontrar em local fechado ou de se corresponder por carta.
Neste
ponto o que se pode adiantar é que jamais retornaram ao bosque que se parecia
com a “Terra Dourada” dos sonhos de Winston.
Leia: “1984”. Companhia Editora Nacional.
Um
abraço,
Prof.Gilberto