quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

“Mayombe”, de Pepetela – aulas no Mayombe; Sem Medo conduz os novatos aos exercícios físicos; Mundo Novo limpa seu armamento enquanto tenta convencer Lutamos a valorizar a formação teórica; diálogo sobre a relação entre essa formação e os futuros dirigentes do país

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Na manhã do dia seguinte, o Comissário Político partiu para Dolisie com alguns guerrilheiros. A comitiva estava encarregada de entregar o Ingratidão do Tuga ao cárcere. Como sabemos, o Comissário tinha ainda a missão de conseguir mantimentos.
(...)
Para os que permaneceram na Base, a primeira tarefa do dia era o estudo que acontecia na sala localizada bem no centro da clareira. Mas a atividade se esvaziou porque três dos camaradas dedicaram-se aos afazeres da cozinha. Por sua vez, o comandante agrupou os jovens recém-chegados para que praticassem exercícios físicos e pudessem ouvi-lo falar a respeito da missão que tinham no Mayombe.
Nem mesmo o Chefe de Operações participou da aula, pois tomou sua arma e saiu para caçar. Teoria, que estava acostumado a auxiliar o Comissário Político nas aulas aos companheiros dirigiu-se à sala. O guerrilheiro Mundo Novo, que tinha formação na Europa, poderia ajudá-lo, mas notou que a maioria dos homens estava se esquivando, então decidiu acompanhar de mais perto as atividades dos novatos e se acomodou numa área coberta de capim aquecido pelos raros raios de sol que penetravam a mata. Pôs-se a limpar a arma e a ouvir a falação de Sem Medo aos pupilos.
(...)
Lutamos chegou para junto de Mundo Novo... Este sugeriu-lhe que se encaminhasse para a aula. O outro respondeu que estava ocupado, lavando roupas.
Mundo Novo sabia bem que o camarada sempre arranjava uma desculpa para fugir das aulas. O Comissário o advertira diversas vezes por isso. Até fora castigado! Lutamos entendia que a missão em Dolisie lhe propiciara “tirar folga da escola”.
Mundo Novo disse-lhe que o estudo era muito importante para todos os que se engajavam na guerrilha. Na sequência perguntou ao Lutamos sobre qual seria a sua utilidade após o triunfo da guerrilha. Onde e em quê trabalharia se mal sabia ler?
O rapaz respondeu que permaneceria no exército. Mundo Novo insistiu que também os militares têm de estudar “artilharia, tática militar, blindados”... Nada disso se aprende sem embasamentos de Matemática e Física.
Lutamos emendou que não tinha intenção de se tornar oficial. Mundo Novo protestou. Deixou claro que se os guerrilheiros não ocupassem as posições de comando na sociedade que viria a surgir, corriam o risco de abrirem caminho para os que defendiam as tropas tugas, tipos sem nenhuma formação política... Disse ainda que certamente tramariam um Golpe de Estado e que isso seria uma constante, algo como o que já vinha ocorrendo em vários países do continente.
Mundo Novo reforçava a ideia de que, após a independência, Angola deveria ter um exército politizado... Isso só seria possível se durante o conflito os guerrilheiros se dedicassem também aos estudos.
Lutamos parecia não ouvir as palavras do camarada, já que se mostrava atento aos exercícios dos jovens. Neste ponto vale destacar que Sem Medo também participava das cambalhotas e outras manobras ao mesmo tempo que bradava incentivos aos moços.
Em resposta às observações de Mundo Novo, Lutamos disse que já havia muitos na guerrilha que se dedicavam aos estudos e que não era porque ele fugia das aulas que tudo estava perdido... Sustentou ainda que era nativo da floresta e que o que mais gostava era de caçar perambulando de um lado para outro... Acrescentou que se sentia bem também combatendo na guerrilha. O que mais podia fazer se não gostava de estudar?
Na sequência, Lutamos citou algumas habilidades apreendidas por ele. Sabia ler, escrever e até calcular multiplicações. Confessou que no último ano só havia participado das aulas por causa das insistências do Comissário Político.
Em relação aos prováveis golpes de Estado a que o outro fizera alusão. Lutamos era da opinião de que isso seria evitado na medida em que a população fosse armada pelos revolucionários.
Mundo Novo concordou, mas acrescentou que o povo deveria ser instruído pelos “quadros bem formados” da guerrilha. Lutamos respondeu que o Comissário Político vivia dizendo o mesmo. Quis deixar claro que ele não se encaixava naquele conceito, pois não havia espaço para a política em sua cabeça e se considerava apenas um guerreiro entre os demais.
Obviamente o rapaz desejava o triunfo da guerrilha, mas não alimentava ambições políticas... Entendia que alguns desejassem ocupar postos de direção e que, por isso, esses deviam mesmo estudar... De sua parte, se não o quisessem nem mesmo no exército, poderia retornar ao Mayombe.
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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