segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

“Mayombe”, de Pepetela – Sem Medo explica sua visão a respeito da vida a dois; há dialética também nos relacionamentos e o que parece crise pode propiciar o crescimento do casal; o Comissário não tinha motivos para se sentir inferior à parceira, mas simplesmente não sabia como devia proceder com a noiva

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/02/mayombe-de-pepetela-de-volta-base.html antes de ler esta postagem:

Sem Medo passou a falar sobre a “relação a dois” e deixou claro que o Comissário Político não podia se esquecer que a conquista da parceira é algo permanente... Quer dizer que a primeira vez que se entenderam devia ser considerada apenas um “prelúdio”. O “concerto” se revela na convivência e, nela, “aproximação-repúdio e ternura-imposição” são constantes...
O Comandante queria dizer também que o amor é dialético. Assim, se o camarada não amadurecesse e abrisse os olhos para essa condição, seu relacionamento com a noiva cairia na mediocridade. Haveria algo pior do que isso? Ele queria que o outro entendesse que a rotina acaba com a interação que deve haver... Destacou que, em sua opinião, o mesmo vale para a política.
Sem Medo quis mostrar também que a crise no relacionamento é algo importante. O Comissário poderia sair dela transformado... Mas teria de admitir o dinamismo e rejeitar a rotina. Seria preciso, ainda, refutar as discussões banais e aprofundar o que o casal tinha de mais rico, que era a diferença cultural entre ambos.
O problema é que o Comissário não conseguia esconder o quanto superestimava a formação de Ondina... Sem Medo disse isso e salientou que o rapaz devia reconhecer que também era estudado e até mais culto do que sua parceira. É claro que seus estudos não eram avançados como os dela, mas sua vivência era superior. Seu engajamento guerrilheiro o levava a participar da transformação da sociedade e isso é muito mais do que meros conhecimentos clássicos de Física e Química.
Sem Medo queria que o Comissário Político entendesse que o conhecimento da “dialética da vida” que ele possuía era profundo e mais valioso do que os conhecimentos literários de Ondina.
Para o Comandante, a riqueza daquele relacionamento estava na possibilidade de um aprender com o outro... Mas isso não se concretizava porque o Comissário insistia em se fechar. Era evidente que a moça percebia o seu complexo e acabava se achando superior a ele. Faltaria, então, bem pouco para o completo desprezo final... E o pior era que ele é que a levava a este fatalismo.
(...)
Sem Medo terminou a sua falação... Engana-se quem pensa que o Comissário se sentiu mais aliviado. Em vez disso, perguntou o que deveria fazer.
Em resposta, teve de ouvir que deveria conquistar verdadeiramente a moça. Para Sem Medo, certamente ele ainda não a satisfazia sexualmente, e isso era um dos maiores entraves para a relação.
Também neste ponto o Comissário quis saber como faria para resolver a questão levantada. O Comandante respondeu que não tinha uma receita para ser posta em prática... Na sequência brincou que era o mesmo que ocorre com o Marxismo, que é um guia inspirador da ação sem resolver os problemas práticos dos militantes.
Empolgado com o próprio raciocínio, Sem Medo citou outro exemplo a respeito dos que passam a noite a ler a teoria de Mao com o intento de elaborar um plano de emboscada. O erro aí está em não se levar em consideração que “Mao dá lições de estratégia” sem definir a tática para cada situação. Evidentemente isso seria impossível para o líder da Revolução Chinesa. Restaria ao revolucionário “estudar o terreno e recriar a tática”.
Tudo isso serviu para que voltasse a falar especificamente da relação dos noivos... Sem Medo destacou que podia fornecer umas orientações sem detalhar procedimentos... O que mais poderia fazer? Esclareceu que as mulheres não se comportam do mesmo modo. Destacou que é difícil entender, mas há as que “amam a violência” e preferem homens sádicos... Outras são as que “preferem a violação psíquica”, e há ainda as que buscam relações baseadas no afeto mútuo...
Após essas considerações sobre os “modos de ser” das mulheres, o Comandante sugeriu que o camarada deveria “estudar Ondina, saber qual é o seu gênero e então traçar o plano”. Destacou que aquele procedimento exige lucidez, paixão e intuição de sua parte. Esperava-se que o Comissário chegasse à maturidade de mudar certas atitudes. Ele devia entender que toda essa lucidez não significa tornar a vida amorosa mais “técnica e fria”.
Em resposta à exaustiva explicação, o Comissário suspirou e deixou escapar um “muito complicado!”
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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