Mais uma vez o encontro do Comissário Político com a noiva foi ríspido. Mas logo que a jovem Ivone deixou o quarto, Ondina tornou-se bem receptiva.
O casal se retirou para uma área coberta de capim e possuíram-se mais de uma vez debaixo de uma grande mangueira. Era assim mesmo que muitos casais apaixonados daquelas localidades se relacionavam mais intimamente. Mas o Comissário era mesmo muito inseguro e não conseguia se entregar totalmente à parceira. Durante o coito ocupava o pensamento com as reações da amada e se enchia de preocupações sem saber se realmente a satisfazia.
(...)
Como não proporcionava uma relação natural, suas
preocupações tomavam dimensões insuportáveis... A moça sempre percebia e
acabava garantindo que experimentara grande prazer. Procedeu do mesmo modo
nesta ocasião...
Um mentia para o outro, e Ondina não ousava discutir a
relação porque sabia que o parceiro não tinha estrutura para encarar as
incompatibilidades sem preconceitos. Ela esperava viver um relacionamento de
amantes, mas via que o noivo sofria bloqueios e não conseguia se transformar no
consorte amoroso.
A
luta armada também os distanciava, então, como podemos notar, ele dificilmente
se transformaria num tipo descontraído. Alguém poderia dizer que o casamento melhoraria
a relação, mas Ondina não alimentava essa esperança, pois sabia que as ações no
Mayombe continuariam por muito tempo enquanto que ela seguiria com as aulas na
escola do povoado próximo a Dolisie.
Sua vivência de professora era madura. Era certo que
tivera relacionamentos anteriores e estava decidida a encarar o noivado a partir
de um viés mais racional... Mas era bem provável que o Comissário jamais
mudasse.
Para
complicar ainda mais essa situação, ele logo ficaria sabendo de certas
aventuras que o tornariam ainda mais complexado.
(...)
Depois
de certo tempo, ainda sob a mangueira, Ondina perguntou ao parceiro o que havia
com o André, quais eram as suas pechas... Afinal, por que o Comissário Político
não gostava do responsável pelo bureau?
O
Comissário pôs-se a falar sobre o que vinha ocorrendo... Esbravejou quando
disse que faltava comida na Base e aquele tipo vivia escapando dos encontros...
Como a grave situação se resolveria? Como não desconfiar? André dissera-lhe que
faltava dinheiro... Apesar disso quis obter o seu silêncio com os 500 francos.
E mais! Era escandaloso o modo como vivia circulando com o jipe para todo lado.
Ondina observou que os guerrilheiros viviam reclamando que
não recebem verba, mas, quando a recebiam, desconfiavam. O Comissário protestou
dizendo que se não havia dinheiro para a comida dos que lutavam no Mayombe,
também não era certo desperdiçar com cerveja.
Ela defendeu o dirigente e disse que entendia que o André
sempre se mostrara preocupado com tudo o que os militares necessitavam. Ela
mesma podia testemunhar que nunca lhe faltara nada.
Neste ponto o Comissário questionou e salientou que devia
ser isso mesmo, quer dizer, o tipo dedicava atenção especial a alguns e não a
todos os militantes.
Ondina
pôs-se a rir e deu um leve beliscão no parceiro. Disse que ele não gostava do
André porque tinha ciúme do modo como ele a tratava... A observação resultou
num arregalar de olhos espantados do Comissário, que jamais pensou em algo
semelhante.
Apesar disso, ele emendou que ela talvez tivesse razão.
Sobretudo se considerassem a fama de mulherengo (nguendeiro) do André...
(...)
O Comissário também disse à noiva que ela se destacava
em relação às demais, tanto por sua beleza quanto por sua formação... Daí a
atenção diferenciada dispensada pelo outro.
Ela
discordou... Em sua opinião, o que falavam a respeito do André não passava de
calúnia.
Na próxima postagem veremos que o Comissário Político deu
continuidade às suas críticas.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/02/mayombe-de-pepetela-do-interesse-das.html
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto