O Comissário seguia para a escola onde sua noiva Ondina trabalhava...
Estava muito irritado por não encontrar o André, que era o responsável político e principal contato dos guerrilheiros com os civis simpatizantes da causa. Sabia que tinha de providenciar os alimentos o quanto antes... Além disso tinha de tratar a respeito da decisão do Comando e do regime de prisão de Ingratidão do Tuga.
(...)
A escola se situava num local isolado, onde construíram
também um hospital... Árvores escondia o complexo.
O Comissário cumprimentou os que viu e perguntou pelo
André. Ninguém lhe dava notícia do tipo.
Como
as crianças estavam em aula, decidiu aguardar o fim das atividades... Mas
aconteceu que Ondina surgiu diante dele de repente, pois ficou sabendo que ele
havia chegado.
Logo que se viram, a moça tratou de dizer que desde a
véspera corria a notícia da chegada da comitiva da Base. O Comissário explicou
que estava à procura do responsável André, mas até o momento não o encontrara.
Disse isso enquanto tentava pegar as mãos da noiva.
Ela
se esquivou... Ele estranhou a reação e quis saber se estava acontecendo algo,
pois todos ali sabiam que estavam noivos. Ondina respondeu que era melhor não
demonstrarem afeição e que retornaria à sua sala de aulas... Depois voltariam a
se falar normalmente e sugeriu que podiam almoçar juntos.
O
Comissário Político (mais adiante conheceremos o seu verdadeiro nome) gostaria
mesmo de passar um tempo a sós com a mulher, mas lamentou por saber que o
horário de almoço era o momento mais adequado para correr atrás do André.
Ondina
quis saber se ele, então, voltaria para Dolisie. Sem esconder o desapontamento,
o Comissário respondeu que o caso era urgente porque não tinham comida na Base.
(...)
Sabemos
que era isso mesmo! O Comissário estava ali por causa do Ingratidão do Tuga,
entregue à cadeia, e para socorrer os camaradas da Base.
Ondina apenas se virou e retornou para a sala de aulas.
Seu noivo permaneceu estático enquanto a observava. Ele teve vontade de
chamá-la... Em vez disso, percorreu as salas do hospital para visitar os
feridos. Sentiu a tristeza crescer no peito porque pensou que era o único culpado
pela frieza da mulher.
(...)
O sino tocou e a criançada deixou os afazeres escolares.
Ondina saiu e logo foi abordada pelo Comissário. Os dois
se dirigiram para o quarto que ela dividia com uma das meninas mais crescidas,
uma certa Ivone.
De
súbito, e agressivamente, Ondina quis saber por que ele não se retirara
imediatamente para Dolisie... Em resposta, o guerrilheiro disse que poderia
procurar o André por volta de uma hora da tarde.
A moça estava visivelmente irritada e sequer convidou-o a
se sentar... Ele tomou a iniciativa e passou a dizer que esperava que ela
compreendesse que sua estadia ali se devia a assuntos urgentes. Como que a se
desculpar, falou que no dia anterior, depois de desistir da busca pelo André,
pensou em visitá-la, mas a noite já avançava e ela bem sabia o quanto as
pessoas se metiam a falar.
Ondina disparou que certamente ele preferira ir ao
bar... Ainda com a postura dos que carregam arrependimentos, o Comissário
explicou que estivera no bar por apenas meia hora. Ia dizer que tinha sido
convidado por um camarada e que os que se embrenham por muito tempo na mata
sentem falta de uma cerveja gelada... Quis dizer também que nem prestou atenção
ao que o outro lhe dizia, porque queria apenas ir ao seu encontro... Mas nada
disso falou porque se sentiu acanhado pela rispidez da companheira.
Ondina
emendou que ficara sabendo que ele estivera a beber... O rapaz justificou
dizendo que a chance de encontrar o André em algum bar era maior do que em
qualquer outro local.
Ela ainda soltou uma provocação... Como ele poderia
procurar o André em bares se o mesmo não os frequentava? De sua parte, o Comissário
protestou dizendo que a vida do outro se passava exatamente nos bares.
Ondina
parecia disposta a defender o dirigente... Então perguntou ao noivo se ele
tinha algo contra a sua liderança, pois, ao que sabia, André não perambularia
pelos bares se estivesse em seu lugar.
Isso pareceu a “gota d’água” que faltava para um
desentendimento mais sério entre os dois... Mas, apesar de a provocação não ter
passado despercebida, o Comissário Político sentenciou apenas que, pelo visto,
ela não queria compreender a situação.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/02/mayombe-de-pepetela-ondina-uma-mulher.html
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto