quarta-feira, 30 de outubro de 2013

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – Henri pretendia, através da leitura, obter uma formação para a ação política; no dia seguinte prosseguiram com as pedaladas e chegaram ao Vercors, região montanhosa atacada por alemães; o calor do dia e o cansaço os impedia de seguir pela estrada; celebração militar e homenagens aos mortos da localidade; luto, feridas, pão e vinho; Perron se recorda dos enterros da época de sua infância

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/10/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir-para.html antes de ler esta postagem:

Mais do que “compreender o mundo”, Henri sentia que tinha a necessidade de “recriá-lo” com palavras... Em vez de um papel em branco, preferiu tirar de sua sacola “um livro já feito”.
Dubreuilh justificava que sua insistência (com o amigo) se devia à sua percepção de que em breve a juventude se sentiria mais atraída por livros elaborados pela direita (cita Volange)... Henri discordou dizendo que a juventude “não aprecia os vencidos”... A conversa se encerrou com o esclarecimento do rapaz, garantindo que ainda retornaria aos textos literários.
(...)
Os amigos tinham ainda mais três dias de passeios até que retornassem a Paris. A conversa com Robert fez Henri pensar sobre os estudos que iniciava... Seu plano era concluir, em um ou dois anos, uma síntese (um “embrião”) acerca de cultura política que lhe daria o embasamento teórico do qual sentia tanta falta.
(...)
No dia seguinte voltaram a pedalar, e Henri decidiu ficar para trás a pensar sobre o seu futuro... Era com sinceridade que esperava não reencontrar Paule (ela também havia se retirado por algum tempo de Paris)...
O dia estava bem quente e ao chegar a uma clareira notou uma cabana destruída por incêndio... A tristeza abateu-se sobreo rapaz... A ausência de ruídos de animais o intrigou... A rigor ele ouvia apenas o barulho que o pneu da bicicleta provocava no cascalho.
Anne e Robert estavam observando sete cruzes brancas... Perron os alcançou e viu que elas não apresentavam flores ou nomes. Estavam no Vercors, belíssima região montanhosa de “florestas transparentes”, muito quente e úmida. Dali, tiveram de andar a pé e empurrar as bicicletas. Enquanto caminhavam, pensavam que nem mesmo aquele lugar remoto escapou dos horrores da guerra... Anne anunciou o desfiladeiro e, sem dúvida, o novo trecho, apesar de pedregoso, apresentou-se mais confortável...
Notaram uma aldeia e surpreendeu-os o som de um clarim... Na estrada principal puderam ver caminhões e carros militares, além de carretas. Logo entenderam que se tratava de uma festa militar... Um deles disse que no hotel ouvira comentários alusivos ao evento. É certo que não gostariam de topar com aquilo, mas também não tinham como retornar à montanha.
Desceram e viram que a aldeia estava queimada. Num jardim havia cruzes ornamentadas com flores vermelhas... Uma banda acompanhava um desfile de soldados senegaleses... As pessoas se retiraram logo após os militares se recolherem aos caminhões. Elas vestiam preto, estavam de luto e haviam chegado de aldeias e povoados circunvizinhos.
Todos procuravam sombras de árvores ou se aproximavam das paredes queimadas para que pudessem se proteger do forte calor... Seus mortos haviam sido enterrados e homenageados com discursos e flores... Estavam prontos para se refestelar com vinho e pão...
Anne manifestou sua preocupação em ocupar algum lugar à sombra, pois os três estavam exaustos e a poeira esbranquiçada que subia atrás dos caminhões que seguiam para o vale não os animavam a seguir caminho... Eles viram que as pessoas se acomodavam numa grande mesa posicionada sob uma árvore... Umas empurravam às outras na disputa por um assento. Serviam-lhes basicamente purê de batata, carne mal assada, pão e vinho...
Eles também se acomodaram. Não sem esforço, Henri colocou-se à frente de Dubreuilh, ao lado de uma mulher com pesados véus... Os olhos dela estavam cheios de vermelhidão e tersóis que repeliam um excremento que caia no próprio prato. Algo medonho de se presenciar...
O silêncio dos presentes fez Henri lembrar-se dos enterros de seus tempos de criança no interior.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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