terça-feira, 6 de agosto de 2013

“O Queijo e os Vermes”, de Carlo Ginzburg – Menocchio e suas dificuldades para manter sua defesa; (nova) carta solicitando perdão às autoridades; faltava-lhe o apoio familiar; no final de sua vida, os filhos e filhas o tinham como estorvo

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/08/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg_5.html antes de ler esta postagem:

A condição e a disposição de Menocchio na última fase de sua vida eram bem diferentes daquelas da ocasião do primeiro processo... Certamente a experiência de cárcere e o medo levaram-no a “renegar quase tudo o que era repetido pelo inquisidor”. Demonstrou dificuldades para mentir, e constantemente caía em contradições... Ele tentava acertar as frases que imaginava que as autoridades queriam ouvir...
O texto faz referência a momentos em que o inquisidor o interrompe dizendo que suas respostas eram confusas... De sua parte, Menocchio limitava-se a dizer que não sabia o que havia dito, pois se tratava de “um ignorante”...
Ao final do primeiro interrogatório, o moleiro entregou um papel em que solicitava perdão às autoridades... Esse texto em que apelava para o Pater Noster havia sido escrito por ele antes da reabertura do processo.
(...)
Era “em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo e de sua mãe, Virgem Maria, e de todos os santos do paraíso” que implorava por socorro e conselho. Pedia que Deus iluminasse o seu espírito, alma e corpo para que pudesse pensar e dizer apenas o que agradasse a divina majestade... Reconhecia a sua queda, via-se como “desgraçado frente ao mundo e aos superiores”... Arruinara as pessoas que lhe eram queridas, seus familiares...
Menocchio não se mostrava em condições de dizer nada além das palavras ensinadas pelo próprio Jesus:
Set libera nos a malo et ne nos inducas in tentazionem et demite nobis debita nostra sicut ne nos dimitimus debitoribus nostris, panem  nostrum cotidianum da nobis hodie.
Menocchio solicitava ajuda misericordiosa a Jesus e aos superiores da Igreja... Garantia que, obtendo o perdão, iria se tornar um pregador em benefício da Santa Medre Igreja, que poderia utilizá-lo como instrumento vivo, um exemplo aos demais cristãos.
Sua condição não era boa também em relação à família... Seu filho Ziannuto, que “era capaz de livrá-lo de qualquer problema e preocupação”, e também a esposa que cuidava dele, estavam mortos... Restavam-lhe filhos e filhas que o tinham como louco. Assim, entendia que se tivesse morrido na época do primeiro processo não se tornaria o estorvo que representava em suas vidas...
Garantia que, se algum mal, pensamento ou palavra em vão tivesse praticado ou proferido, não havia de ter sido por sabedoria, mas por vaidade... Doravante acreditaria apenas na verdade pregada pela Santa Igreja, além de fazer o que os padres e superiores lhe ordenassem.
(...)
No papel em que Menocchio escreveu, o pároco Giovan Daniele Melchiori (atendendo a um pedido dele) fez uma anotação que data de 22 de janeiro de 1597... Registrou que Menocchio levava vida de “cristão ortodoxo”. Ginzburg destaca que o desejo dele de se submeter à Igreja era sincero... Sua condição, de fato, era das mais terríveis, tanto em relação à família como em relação à comunidade de Montereale. A reintegração à Igreja poderia significar a sua redenção. É por isso que ele, até de modo patético, se esforçava por reverenciar “superiores e inquisidores”. Seu manuscrito os destaca antes de “bispos, vigários, párocos, capelães e curas”.
No dia 19 de julho perguntaram-lhe se ele desejava ser defendido por um advogado... Menocchio respondeu que queria a Misericórdia como defesa... Manifestou que não tinha como contratar advogado porque era pobre... Era em momentos assim que reconhecia a falta que Ziannuto lhe fazia. Durante o primeiro processo foi ele quem fez de tudo para conseguir um advogado para ele... Infelizmente, para ele, seus filhos ainda vivos “não moviam palha” para socorrê-lo.
Leia: O Queijo e os Vermes. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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