Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/08/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg_17.html
antes de ler esta postagem:
Aqui se encerram os
registros sobre O Queijo e os Vermes (de
Carlo Ginzburg) e a longa narrativa
que percorreu os processos do Santo Ofício contra o moleiro Domenico Scandella,
da pequena aldeia de Montereale.
Em setembro de 1599 as autoridades romanas receberam a notícia sobre a
condenação de Menocchio à morte... Mas a execução não ocorria... Talvez por
hesitação do inquisidor do Friuli. No dia 5 desse mês, ele escreveu uma carta à
congregação do Santo Ofício na qual apresentava suas dúvidas.
No dia 30 de outubro o
cardeal o respondeu... Ele esclareceu que o caso era muito grave... Assim, o já
condenado Menocchio deveria pagar por seus “horrendos e execráveis excessos”;
seu castigo serviria de exemplo aos demais... O cardeal exigia a imediata
execução Tudo deveria ocorrer de acordo “com o rigor de espírito que a
importância do caso”. E deixou claro que aquele era o desejo expresso pelo papa
(Clemente VIII).
Então, a morte de Menocchio era exigida pelo próprio
Sumo Pontífice... Naquela mesma época, Roma concluía o processo contra Giordano
Bruno... Ginzburg destaca a coincidência que marcava o enfrentamento da Igreja
Católica (impondo as aprovações do Concílio de Trento) tanto em relação “aos de
cima” quanto aos “de baixo”... Aqueles eventos também poderiam explicar a fúria
contra o velho Menocchio. A 13 de novembro o cardeal de Santa Severina voltou à
carga:
“Que Vossa Reverendíssima não falte aos procedimentos no caso daquele
camponês da diocese de Concordia, indiciado por ter negado a virgindade da
beatíssima Virgem Maria, a divindade de Cristo, Nosso Senhor, e a providência
de Deus, como já lhe escrevi por ordem expressa de Sua Santidade. A jurisdição
do Santo Ofício em casos de tamanha importância não pode de modo algum ser
posta em dúvida. Assim, execute implacavelmente tudo o que for necessário de
acordo com os termos da lei”.
A mensagem do cardeal era impositiva. A pressão aumentou demais... Então
Menocchio foi executado... Morte na fogueira... Desde o início dessas postagens
(a partir de http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2012/09/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg.html) já sabíamos sobre
qual seria o seu fim.
A morte do moleiro pode ser atestada a partir de um recorte de
depoimento de certo Donato Serotino em 16 de julho de 1601 ao comissário do
inquisidor do Friuli “pouco depois de haver sido justiçado pelo Santo Ofício
(...) o Scandella”... Menocchio foi mesmo executado...
Mas e suas inquietações e rebeldia filosófica? Elas
foram silenciadas? Também morreram?
Ginzburg encerra o texto esclarecendo que o conteúdo do depoimento de
Serotino às autoridades religiosas se relacionava a uma conversa com uma
taverneira de Pordenone... Ela lhe contou que “numa certa vila (...) um certo
homem chamado Marcato, ou Marco, dizia que, morto o corpo, a alma também morria”...
Como se vê, tipos
como Menocchio existiram às centenas (antes e depois dele)... Certamente os
processos contra eles foram implacáveis... Mas é como Ginzburg registra:
“Sabemos muita coisa sobre Menocchio. De Marcato
ou Marco - e de tantos outros como ele, que viveram e morreram sem deixar
rastros – nada sabemos”.
Leia: O Queijo e os Vermes. Companhia das Letras.
Leia o posfácio em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/08/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg_19.html
Um abraço,
Prof.Gilberto