O italiano havia sido aceito entre os homens de armas submissos a d. Mariz.
Ele considerou que os aventureiros do casarão do Paquequer se interessariam pelo seu projeto... Então resolveu que deveria investir no aliciamento de alguns... Aconteceu, porém, que, ao conhecer Cecília seus planos sofreram uma alteração... Decidiu que ela era “necessária à sua existência”. Seu desejo tornou-se ardente, possessivo... O bandido que até então passara muitos anos de sua vida celibatário, projetou a continuação de seus dias tendo a pequena Cecília ao seu lado.
Na verdade o projeto de Loredano havia se tornado muito maior... Além de chefe de bando, possuiria Cecília, exploraria as minas de prata, assaltaria uma embarcação espanhola, seguiria para a Europa... O mundo se abriria para ele, e o futuro seria só de felicidade.
Por um ano alimentou o seu projeto e fez o máximo para lograr sucesso... Aos poucos conseguiu atrair Rui Soeiro e Bento Simões, que eram tipos influentes entre os demais... Precaveu-se em relação à traição dos dois que arregimentara com o plano do testamento entregue a d. Mariz... Só que na realidade o papel atestava que ele não passava de vítima que havia se iludido pelo plano dos outros dois... Diabolicamente, Loredano havia mentido para Soeiro e Simões... Se algo desse errado, apesar da certeza que tinha de que d. Mariz não abriria o testamento, a condenação recairia sobre os outros dois.
Como vimos, o episódio da cerca de cardos revelou que Loredano conseguiu reduzir seus cúmplices a duas marionetes dispostas a colocar a vida em risco, a assassinar companheiros que porventura decidissem se manter fiéis ao fidalgo, ou a arruinar a família Mariz.
(...)
Os goitacá, nação da qual Peri fazia parte, ocupava uma grande extensão
que corresponderia ao território entre o Cabo de São Tomé e o Cabo Frio... Esse
povo guerreiro se dispôs a lutar contra a conquista colonial em diversas
ocasiões e locais... O romance destaca as guerras históricas contra a colônia
da Paraíba fundada por Pero de Góis... Seus guerreiros destruíram também a
colônia de Vitória (Espírito Santo), que havia sido fundada por Vasco Fernandes
Coutinho.
(...)
Cecília levava uma vida completamente apartada desses
assuntos... Desde o episódio em que fora salva por Peri, sabia que era vigiada
por ele... O índio mantinha-se à distância sem querer ser notado... Mas algumas
vezes acontecia de a moça flagrá-lo a contemplá-la ao longe... Evidentemente
isso a constrangia... Por outro lado, ela não tinha a menor consciência de que
Peri ficava acanhado em relação a ela...
Para ele, o único que apreciava a sua presença nas cercanias era d.
Antônio... E nisso ele estava correto. É por isso que Peri só ousava
aproximar-se quando notava a presença dele na habitação.
Mas já fazia uns quatro dias que ele não aparecia por perto... D.
Antônio imaginou que o selvagem tivesse retornado para o seu povo... Cecília
notou que ele estava do outro lado do rochedo a olhar em sua direção... Ela bem
sabia que era ingrata por temê-lo e repugná-lo... Algo lhe dizia que não
deveria haver motivos para temer aquele que a salvara... Pensou que aquela
ocasião poderia ser boa para modificar seu comportamento, então decidiu acenar
demonstrando que queria que ele se aproximasse.
Ao mesmo tempo em que Peri se apressava na direção dela, ela se
encaminhava para junto de d. Antônio... A moça anunciou ao pai a chegada de
Peri e os dois se encaminharam ao seu encontro. O índio trazia um cofo (cesto
artesanal) que ele mesmo havia feito com palha bem clara... Ali trazia diversos
beija-flores... Ao chegar junto à “sua senhora”, Peri ajoelhou-se aos seus pés
e, sem fita-la, entregou-lhe o cabaz de palha (o cesto)...
Cecília ficou um pouco assustada, mas ao abrir a tampa alegrou-se imensamente
ao notar que algumas aves revoaram e deram voltas ao redor de seus louros
cabelos... Alguns se aproximaram de tal forma que ele pôde aquecê-los às mãos,
junto ao seio... De fato, o colorido que a luz do sol provocava nas penas das
delicadas aves, encantava a todos.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/08/o-guarani-de-jose-de-alencar-peri_24.html
Leia: O guarani. Editora Ática
Um abraço,
Prof.Gilberto