sexta-feira, 16 de agosto de 2013

“O Queijo e os Vermes”, de Carlo Ginzburg – o moinho e os encontros clandestinos durante a Idade Média; Pighino e sua conversa com os camponeses; moleiros, camponeses “diferenciados”; preconceitos em relação aos moleiros; Menocchio e suas ideias vinculadas ao campesinato; o processo contra Pighino e suas relações com ricas famílias

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/08/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg_15.html antes de ler esta postagem:

Não é por acaso que as pessoas reconheciam sem dificuldades as acusações de heresia que pesavam sobre moleiros. Durante a Idade Média, o moinho era como que local de encontro dos camponeses que necessitavam moer grãos... Naqueles ambientes conversava-se sobre tudo quanto é assunto. Certamente Pighino aproveitava as ocasiões de maior aglomeração de pessoal para falar sobre “padres e frades”... Domenico de Masafiis, seu companheiro de ofício e de labuta no moinho, chegou a alertar os que o ouviam a deixá-lo de lado e que evitassem a falar mal dos padres e frades, que eram os que tinham conhecimento das coisas da religião. Evidentemente sabemos a respeito dessas coisas devido aos registros do processo que Pighino sofreu.
Moleiros, assim como “taverneiros, comerciantes e artesãos ambulantes” eram tipos mais abertos a conversas e ideias novas, além de “propensos a difundi-las”... Instalações mais afastadas das habitações comuns, os moinhos eram locais de reuniões clandestinas... O texto cita os episódios de 1192, ocasiões em que os cátaros foram perseguidos, quando os moinhos dos Patarines (outro nome para os cátaros) foram destruídos.
Ainda contra os moleiros, pesava a ideia que muitos camponeses comuns faziam deles como pessoas próximas aos “feudatários”, dado que em tempos mais antigos os moinhos eram de uso exclusivo dos nobres senhores de terras, que exploravam a gente camponesa... O moleiro se destacava em relação aos demais camponeses. Não é por acaso que Giovan Francesco di Montereale se dispusera a conversar com Menocchio sobre a questão de qual seria a “fé verdadeira”.
É claro, Menocchio também era camponês... Mas o tinham por um “caráter diferenciado”... Foi o próprio Alessandro Policreto, ex-advogado que o encontrara brevemente durante o primeiro processo, que dizia que ele se tratava de “um camponês vestido de branco”... Há que se destacar que esse “prestígio” talvez explique por que a denúncia contra Menocchio demorou tanto a ocorrer, apesar de ninguém (a exceção seria Melchiorre Gerbas) aprovar suas ideias... Essas não deviam se tão estranhas às “existências, crenças e aspirações” dos demais habitantes de Montereale.
Se as ideias de Menocchio não eram algo deslocado do modo de ser camponês, Pighino parecia ter sistematizado suas opiniões no contato que tivera com pessoas de “ambientes cultos e socialmente elevados”. Gerolamo da Montalcino, frade que visitou a diocese da localidade de Savignano sul Panaro em nome do bispo de Modena, descreveu o moleiro Pighino como o típico camponês “pobre, doente, muito feio e pequeno”... Mas foi conversando com ele que o religioso pôde notar que as “coisas falsas” que falava eram “inteligentes” e, dessa maneira, concluiu que o moleiro só podia ter tratado daqueles assuntos com pessoas mais ricas, “em casa de algum cavalheiro”...
O primeiro contato de Gerolamo da Montalcino com Pighino havia sido em 1565... Durante o processo movido pelo Santo Ofício cinco anos depois, o moleiro esclareceu que havia prestado serviço às “casas de cavaleiros bolonheses: Natale Cavazzoni, Giacomo Mondino, Antonio Bonasone, Vincenzo Bolognetti, Giovann d’Avolio”...
Quiseram saber se com algum deles havia tratado a respeito de religião, mas ainda que pressionado por ameaças de tortura, negou qualquer discussão semelhante com algum daqueles homens... Em 11 de setembro de 1570, Pighini foi acareado com o mesmo Gerolamo, que garantiu que ouviu o processado dizer que aprendera coisas “falsas mas inteligentes” “na casa de um cavaleiro” de Bolonha, e que alguém lhe ensinara certas “lições”... Como havia passado um tempo considerável desde aquele primeiro encontro com o acusado, o frade não se recordava de todos os detalhes...
Gerolamo havia esquecido o nome do cavalheiro e também de um padre, que seria a pessoa com a qual Pighino teria aprendido “as lições”.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/08/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg_6773.html
Leia: O Queijo e os Vermes. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas