quarta-feira, 1 de maio de 2019

“Mayombe”, de Pepetela – os jogos de entretenimento e as ocasiões de prazer de comandar; a guerra total e a ideia que o soldado tinha de manter sobre os inimigos; o comando revolucionário e as considerações sobre mais lucidez a respeito do confronto brutal; chega o momento de avançar

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/04/mayombe-de-pepetela-final-do-relato.html antes de ler esta postagem:

Sem medo seguiu pensando sobre as situações de comando, as inspirações, aspirações e frustrações dos que ocupam essa posição. Fez isso enquanto esperava que o grupo do Chefe de Operações avançasse um pouco mais para o sítio em que faria a emboscada aos tugas que tentassem escapar do assalto à Base.
Recordou-se da época em que viveu na Europa, quando conheceu o entretenimento eletrônico do fliperama e de como o jogador podia atingir um estágio de domínio sobre os desafios da máquina.
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Lembrou-se que no pôquer há jogadores que perdem muito dinheiro... Mas podia ser que, mais do que a vontade de vencer, o que prende muitos aficionados ao jogo seja a vontade de experimentar o controle e o domínio sobre os adversários... São tipos ousados que sabem que o risco pode trazer-lhes a derrocada ou recompensa a qualquer momento em que se decidem pelas “cartadas de sorte”... Eventualmente arriscam tudo, e grandes somas, pelo “prazer do desafio”. Pouco se importam se saem vitoriosos porque o que conta para eles é a sensação de predominar sobre os adversários e intimidá-los com seus gestos (vários blefes).
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Essas situações bem podiam ser relacionadas à guerra... Contudo as figuras que imprimem resultados aos conflitos pouco aparecem e muitas vezes sequer são conhecidas. Muitos “senhores da guerra” jamais deixam seus gabinetes e exercem muito maior poder do que os que comandam nas frentes de batalhas. Mas também eles possuem fragilidades e são torturados por elas... Empurram para os conflitos, para o matar e o morrer, homens que confrontam outros que devem ser entendidos como “defensores do injusto e dos vícios”... No passado, incutia-se nas tropas a ideia de que os soldados inimigos concentram em si todo o mal que a propaganda de guerra anuncia... Guerra total...
Os tempos mudaram... Para Sem Medo, os combatentes já não pensavam daquela maneira. E principalmente os revolucionários, que certamente levam em conta que entre os oponentes há o camponês, o operário, o pai de família... E quantos entre esses podem ser contados os que são forçados ao confronto ou que seguem para o conflito sem a menor convicção?
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Essas reflexões levaram-no a concluir que a guerra que travavam era das mais difíceis. O revolucionário em sua condição de comando (e esse era o seu caso) entenderia a guerra como o jogo em que deve tomar decisões mais lúcidas... Que tipo de soldado guerrilheiro é esse? Aquele que Sem Medo gostaria de ser... Todavia esse tipo ideal só podia ser encontrado nas linhas dos romances clássicos.
A realidade vivida é a do “conflito quente”, dos tiros, bombas e sangue jorrando... Como dominar as emoções? Como abandonar o pensamento de que um camarada como o Comissário Político pudesse já não estar entre os viventes?
E como afastar definitivamente as visões de Leli que persistiam nos instantes que precediam ações de combate?
(...)
O momento de avançar chegou...
Sem Medo fez sinal aos camaradas. Ele liderou a coluna pelo caminho que havia feito na noite anterior. Sua maior dificuldade no momento foi o prosseguir de cócoras para limpar a área que os companheiros deviam pisar na sequência... Além dos gravetos, o tatear das mãos poderia acusar a presença de bichos peçonhentos... Felizmente isso não se confirmou.
Graças ao reconhecimento que fizera anteriormente, o avanço foi rápido e logo chegaram ao rio. Sem Medo aproveitou para se estirar e descansar os músculos.
Mundo Novo se ofereceu para tomar a frente, mas o comandante insistiu que o rapaz se mantivesse logo atrás dele.
Atingiram a curva do rio, e isso indicava que estavam bem próximos à Base.
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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