sábado, 4 de maio de 2019

“Mayombe”, de Pepetela – esclarecendo o mal-entendido; Sem Medo dá o seu recado sobre a gargalhada e a satisfação de encontrar todos a salvo; divergências com o Comissário sobre a punição aos envolvidos no caso da surucucu

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/05/mayombe-de-pepetela-o-tipo-que-se.html antes de ler esta postagem:

O Comissário Político não poupou críticas ao Vewê ao dizer que sua covardia o deixara apavorado depois de ouvir os tiros. Sem Medo continuou a rir e ainda resolveu dar um título para o episódio: ”a invasão da surucucu”. Vários dos homens estavam achando graça e não conseguiram segurar o riso. Vewê e Teoria se tornaram mais acanhados e procuravam evitar os olhares dos demais.
(...)
Sem Medo levantou-se e passou a responder às críticas do João Comissário... Afinal, o que podiam esperar? Só o que restava era rir de todo o ocorrido, e os que não encaravam a situação da mesma maneira que tivessem paciência. O fato é que, em sua opinião, era preferível mesmo que a Base tivesse sido invadida por uma cobra. Evidentemente seria muito pior se fossem os tugas.
Sobre a crítica do Comissário ao referir-se à mobilização como “esforço inútil”, Sem Medo deixou claro que não concordava, e que o fato de mobilizarem todos aqueles homens com extrema rapidez mostrava que ainda podiam crer na solidariedade dos que se dispõem a lutar... E ainda que o espírito de combatividade é próprio da guerrilha revolucionária.
O que mais poderia dizer se estava contente por ter encontrado os companheiros a salvo e bem? Isso à parte, emendou que ninguém podia discordar que o que se passara tinha sido muito engraçado.
(...)
Teoria disse que se sentia culpado por ter feito os disparos contra uma simples cobra quando todos estavam preocupados com a possibilidade de ataque dos inimigos já instalados no Pau Caído. Ele mesmo admitiu que merecia ser castigado pelo Comando.
Vewê interveio ao insistir que, se havia culpado naquela história toda, era ele próprio. Disse também que ao tratar com o que fazia guarda, este sugeriu que o barulho das rajadas lembrava os de uma Pépéchá (que era a arma utilizada pelos guerrilheiros) e que era melhor aguardar. Acontece que Vewê garantiu ter ouvido alguém gritar “apanha vivos”* e que convenceu o outro a baterem em retirada pela montanha.

                   * Na verdade, ele devia ter ouvido o Comissário Político gritar “apanhem os abrigos” aos companheiros. Essa era a ordem para se protegerem de um provável ataque... Essa confusão elucidada no momento em que o Comissário dava a sua versão para o episódio levou Sem Medo à gargalhada.

O Comissário Político disse que os dois que se envolveram nos episódios seriam julgados e receberiam as punições cabíveis. Então Mundo Novo perguntou-lhe por que não se adiantou a enviar um dos homens para Dolisie, pois era certo que ocorrera o equívoco e o comandante Sem Medo não hesitaria em preparar um socorro imediato à Base. O Comissário explicou que esperava que Vewê e o outro retornassem até o começo da noite... Podia ser que voltassem logo que entendessem que não ocorreriam novos disparos. Mas não foi isso o que ocorreu. E o pouco efetivo na Base não recomendava o deslocamento de outro camarada. Seria necessário enviar dois!
Sem Medo disse que o Comissário Político havia tomado a decisão mais adequada. Falou sem desviar o olhar fixo no teto e em meio às pitadas de cigarro.
As palavras do comandante deixaram o Comissário perplexo, pois não esperava que o outro saísse em seu apoio. Sem Medo prosseguiu dizendo que o Teoria devia passar por reprimenda e castigo. Já em relação ao Vewê, explicou que a culpa maior era dos que o haviam enviado à Base sem o devido treinamento. Isso foi negligenciado! Tanto é que o rapaz sequer conseguia identificar a rajada dos fuzis usadas pelos companheiros. Apesar disso, todos deviam reconhecer a coragem do jovem ao deslocar-se ao alojamento para pegar sua pistola e ao contatar o que fazia a guarda.
Sem Medo finalizou sua opinião em relação ao caso do Vewê garantindo que bem poucos ali teriam agido com a mesma coragem.
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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