O deslocamento resultara em perfeito...
Os camaradas se acomodaram e ouviram de Sem Medo que teriam de esperar a madrugada para realizarem o assalto à Base... Aos poucos todos sentiram o avanço das horas e viram a selva se revelar timidamente.
A estratégia de Sem Medo foi a de distribuir os homens pelas duas margens do rio. Eles deviam se posicionar a uns dez metros um do outro. Mundo Novo foi tomando a primeira posição do outro lado. Ao vê-lo, Sem Medo mais uma vez reconheceu que o rapaz se tornaria um bom quadro do movimento, apto a assumir o comando em Dolisie.
(...)
Avançaram um pouco mais, e ainda mais cautelosamente.
Eventualmente caminharam com a água fria do rio na altura de suas cinturas...
Sem Medo seguiu pensando sobre quando poderia fumar novamente.
A tensão foi crescendo na medida em que cada vez mais
se aproximavam da posição em que as duas colunas se colocariam em leque... Tudo
ia bem até que os dianteiros venceram a última curva do rio e se depararam com
um tipo claro a se banhar. Só podia se tratar de um tuga. A pouca luz permitia
reconhecer apenas que ele estava de costas para os guerrilheiros, e nada mais.
Sem
Medo concluiu que o plano havia falhado, pois era exatamente isso o que não podiam
encontrar pela frente. E não havia outro modo de topá-lo, pois teriam de chegar
à sua posição, o local exato a partir de onde iniciariam o cerco e fariam os
inimigos fugirem para a montanha, indo de encontro ao grupamento do Chefe de
Operações.
Sem Medo e Mundo Novo trocaram olhares... Em silêncio
se entenderam a respeito do drama que se avizinhava. Se subissem a falésia não
atingiriam o sítio ideal para o ataque e seriam forçados a percorrer vários
metros sem qualquer proteção.
(...)
A
realidade estava posta... Um dos tugas estava a banhar-se e em breve o rio se
encheria de seus companheiros. A imagem de Leli surgiu para incomodar a
consciência do comandante que, sem perder tempo, sinalizou ao Mundo Novo para
prosseguirem.
Sem
Medo caminhou com o rifle preparado para o disparo... Até então pensava que o
tuga fosse um mestiço... Sua experiência o levara a avançar mais rapidamente do
que Mundo Novo e logo chegou a uma distância de apenas cinco metros de seu alvo
ensaboado.
Desde o ponto onde estava sinalizou para que os camaradas
parassem imediatamente. Assim que o inimigo se virasse, dispararia e correria
para a área que, ao que tudo indicava, seria utilizada para a fuga dos tugas.
Alguns dos homens que estavam na margem esquerda se mudaram
para o outro lado. Sem Medo não conseguia calcular a posição de todos porque
percebia que muitos sequer haviam vencido a última curva. O imprevisto o estava
levando ao ataque e poucos dos homens teriam condições de combater. Difícil era
saber se também os civis se habilitariam, e podia ser mesmo que se empolgassem
com a ação, embora a maioria deles estivesse mais atrás.
(...)
Os homens começaram a rastejar em direção ao alto da
falésia...
Sem
medo fitava o inimigo em seu já prolongado banho ao mesmo tempo em que avaliava
a escalada do morro. Pôde ouvir alguns ruídos provocados pela movimentação dos
companheiros e concluiu que a qualquer momento os inimigos perceberiam a
invasão.
O sujeito do banho emergiu esfregando as orelhas. Uma
pequena pedra rolou na falésia e ele virou-se para se certificar... Logo notou
as silhuetas dos homens e viu-se de frente com o guerrilheiro e sua arma
posicionada para o tiro fatal. O momento de disparar era aquele...
Imediatamente o tipo levantou os braços e os manteve bem
abertos.
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto