segunda-feira, 29 de abril de 2019

“Mayombe”, de Pepetela – final do relato pessoal do Chefe de Operações; a Base entendida como “filho do Sem Medo”; ideia de fazer o movimento crescer a partir da selva para todo o país; novas frentes podiam dividir o inimigo, daí o interesse tribalista pela luta em Cabinda; vontade de se abrir com o comandante intelectual; partindo para o assalto à Base; início de reflexões sobre a condição do comando

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/04/mayombe-de-pepetela-ainda-o-relato.html antes de ler esta postagem:

Para o Chefe de Operações, o ponto de vista de Sem Medo era o de que a guerrilha desde a selva faria o movimento rebelde crescer ainda mais até a vitória final. Era assim que o Chefe de Operações basicamente via a coisa... A Base era como um filho do comandante, e ele a queria maior para fazer a Revolução crescer por toda Angola.
Enfim o Chefe de Operações podia entender também o ponto de vista do Comissário Político... Uma vez que em Cabinda a luta ganhasse corpo, os inimigos teriam de dividir suas forças para combatê-la também.
(...)
Isso tudo à parte, não podemos deixar de levar em consideração que o Chefe de Operações ainda carregava muito do tribalismo em sua personalidade. Tanto é que havia aceitado lutar em Cabinda por causa do que aprendera em teoria, mas particularmente não se interessava pelo futuro de Cabinda ou pelos seus nativos. Podia afirmar tranquilamente que se lutasse em Cabinda diminuía a quantidade de inimigos em sua região de origem, e via isso como muito positivo.
Ao menos restava a comunhão de convicções... O mesmo ódio que ele sentia dos tugas podia notar nas palavras e atitudes de Sem Medo... O que mais podia fazer ou levar em consideração? O homem era um intelectual, e nisso residia o seu maior defeito, pois assim sendo jamais compreenderia o povo simples que perdeu tantos irmãos e parentes na guerra.
Restava também o desejo de lhe falar pessoalmente a respeito de todas essas coisas... Mas para quê? Ele não se sentia capacitado e ao mesmo tempo pensava que o comandante não entenderia o seu ponto de vista.

(...)

Ao observar a posição das estrelas, Sem Medo calculou que já eram cinco horas. Voltou-se para o Chefe de Operações e viu que ele já estava desperto. Sem maiores agitações acordaram os demais.
Formaram dois grupos, sendo que o que Sem Medo liderou seguiria pelo rio e avançaria para a Base... O outro, que ficou sob a responsabilidade do Chefe de Operações, prosseguiria contornando a Base e tomaria posição de atacar o inimigo caso ocorresse a fuga pela montanha. Esse grupo teve de partir antes do pessoal que era comandado por Sem Medo.
A marcha do grupo do Chefe de Operações se iniciou com todo o cuidado. Sem Medo calculou que atingiriam os objetivos desde que não encontrassem inimigos em posição adiantada no rio. É que, nesse caso, teriam de atirar e isso alertaria os demais tugas. A intenção era a de chegar sem alarde à Base para libertar os camaradas que estivessem sequestrados.
Os mais experientes faziam parte de seu grupo. Havia alguns civis, e ele percebeu que provavelmente, no momento preciso, teria de partir sozinho para a ação. Talvez Mundo Novo o acompanhasse e talvez terminassem sacrificados. Lembrar que o plano era um tanto improvisado o angustiou... É claro que podiam contar com a vantagem de conhecerem bem o sítio, todavia a angústia o invadiu e não havia meio de retroceder.
(...)
Sem Medo aguardou um pouco mais, pois o grupo do Chefe de Operações precisava ganhar terreno antes que o seu pessoal iniciasse a marcha.
Enquanto isso foi refletindo sobre as “situações de comando”... Vitórias e derrotas... Regozijo e frustrações...
Lembrou-se do tempo em que estudou na Europa e conheceu as máquinas eletrônicas de fliperama... Analisou que o jogador não buscava exatamente “vencer a todo custo”, antes disso, pretendia sentir o gosto de dominar o controle da esfera através de leves movimentações dos dedos sobre os “flippers”.
Tratava-se de um jogo em que o sujeito exercia o domínio sem se importar em entregar-se aos desafios que sempre surgem conforme a esfera pula de um lado para outro... Nesse processo, o jogador corre o risco de se tornar escravo da máquina e do próprio jogo.
E isso nunca pode ser o desejável.
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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