A décima segunda parte de “Os Mandarins” é a última, e também a mais curta.
Vemos Anne muito deprimida.
Passaram-se duas semanas após o seu regresso dos Estados Unidos... A grande orquídea dada de presente por Lewis pouco antes de seu embarque estava murcha... Ao descartá-la na lixeira parecia sepultar de vez qualquer possibilidade de revê-lo em Chicago ou em Parker.
Robert era o mesmo... Envelhecido e “se encaminhando para a morte”... Ela não pôde deixar de constatar isso ao revê-lo em sua chegada aos Invalides... Era notório que seus passos estavam ainda mais enfraquecidos...
Era certo que ele morreria antes dela... De sua parte, Robert jamais admitiria o ocaso, pois acreditava na vida e entendia que tinha muito a fazer. De modo algum se via como um “morto em sursis”.
(...)
Cada
um aguarda a própria hora... A partir de sua lógica, chegaria o dia em que
viria Robert estirado, completamente morto com um “rosto de cera”...
No
entanto Dubreuilh seguia animado... Principalmente quando passava horas a
conversar com Henri acerca da retomada de projetos editoriais e de ação
política.
(...)
Nos
dias que se seguiram, Anne passou a se enxergar numa condição tão delicada que
o suicídio parecia ser sua única alternativa... O desejo de morrer trazia-lhe
tranquilidade... “Quando se está cansado (da vida), a morte parece menos
terrível”.
Estava
convencida de que não era por causa de Lewis ou por causa das tragédias
políticas que se avizinhavam. Simplesmente já não se sentia tocada pelas
coisas... Se ocorresse o contrário, certamente se sentiria animada pela vida.
Por
um instante se recordou de certa situação de perigo quando contava 15 anos...
Gritou de medo e correu, pois a morte era uma ameaça... Evidentemente não
experimentava as mesmas condições... Com a idade, as forças para qualquer fuga
se esvaneceram.
Seu raciocínio tornou-se trágico... Comparou-se ao
condenado à morte que, por não suportar mais alguns dias até a execução, acaba
tirando a própria vida... Seu caso era mais dramático na medido em que teria de
aguardar muito mais tempo...
(...)
Anne não brincava com a
morte... Ela era algo real e próximo... O céu azul pouco significava... “A
terra é gelada e o nada a retomou”.
A bela paisagem ou a
tranquilidade do lar nada lhe diziam... A casa confortável, a tília e sua
generosa sombra... O angelical sono de Maria... Tudo era vazio e silêncio.
Dessa forma, não se podia divisar amor em seu coração... Não nutria mais esse
tipo de sentimento por ninguém.
Apesar disso, não era
raro ver-se lamentando que uma só existência seja insuficiente para dar conta
do “inesgotável mundo”.
(...)
Algumas
indagações são típicas de adolescentes... Mas elas também chegavam às reflexões
de Anne... A existência é breve e cruel... A infinidade de astros que compõem
as galáxias pouco se importa com cada um de nós. E mesmos os nossos iguais não
se lamentam demais depois que desaparecemos de seus cotidianos.
A vida só pode ser amarga e
a única coisa que devíamos levar em consideração seria a nossa própria experiência
limitada ao nosso “ser material”... De tanto matutar a respeito, Anne
perguntava-se sobre o que ainda fazia entre os viventes.
Pensar
no trabalho também lhe era decepcionante... Não se via em condições de impedir
qualquer de seus pacientes a parar de chorar, ou então de incentivá-los a
iniciar terapia que resultasse em noites de sonos tranquilos.
(...)
Como
o caso com Lewis estava perdido para o passado, ela poderia recuperar alguns
significados nas relações mais próximas... Mas Nadine amava Henri e se tornara
mãe de Maria... Absolutamente não representava nada a nenhum deles.
A respeito de Robert, há muito sabia que
“bastava que lhe dessem papel e tempo”... Certamente sentiria a sua morte,
sentiria saudade... Mas ele não era do tipo que se deixa mergulhar nesse tipo
de sentimento.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/12/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_30.html
Leia: Os
Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto