sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – Dubreuilh condena a abstenção de Henri; a História não é risonha; ainda a bipolaridade Estados Unidos x União Soviética; seria arrogante supor que a teoria que temos de uma sociedade sem injustiças se concretize tal como a “idealizamos” em meio a perversidades múltiplas

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/12/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_15.html antes de ler esta postagem:

Dubreuilh falou sobre seu posicionamento em relação às mudanças pelas quais as sociedades vinham passando... Simplesmente deixara de crer que o comunismo e a URSS fossem males que podiam ser descartados, pois considerava os avanços norte-americanos pela Europa muito mais preocupantes.
Depois manifestou que não entendia como é que Henri não fizesse a mesma leitura dos fatos. Este respondeu que nos últimos dias havia trabalhado perto de alguns comunistas, principalmente com Lachaume, e, apesar de compreendê-los, entendia que não tinha a menor condição de prosseguir com eles... Aliar-se fisicamente a eles era algo que considerava impossível.
Robert insistiu que não havia necessidade de ingressar no partido... Mas entendia que era preciso estar junto com os comunistas “contra a América e contra a guerra”.
A resposta de Henri foi bem simples... Ele não era tão devotado quanto seu interlocutor... Não abriria mão de seus projetos pessoais por uma causa que já não defendia na totalidade.
Dubreuilh discordou no mesmo momento... Aquela conversa lembrava as palavras de Volange quando dizia que “o homem não merece que se tenha interesse por ele”. Obviamente Henri argumentou que não era a mesma coisa, mas Robert vociferou que era “mais do que ele pensava”...
Na sequência o velho quis saber se ele estava convencido de que entre USA e URSS era necessário optar pelos soviéticos... Henri não demorou a responder que aquilo era evidente.
O argumento de Dubreuilh passou a sustentar que, então, ele precisava fazer uma escolha, pois a questão não era apenas a de “aderir ao lado correto”... Jamais se faria algo se ficasse a esperar o aparecimento de um “modelo perfeito”.
A esse respeito, Henri disse que, mesmo que não se faça questão de perfeição, é possível entender que “o que existe é mau” e não nos atrai de modo algum. Robert Dubreuilh voltou à carga dizendo que o rapaz idealizava a situação... A ideia de socialismo sempre seria superior ao que, de fato, ocorria na prática... Uma revolução sem lágrimas? Isso não ocorreria mesmo.
Henri respondeu que se a razão estava no que existia concretamente (a URSS e todas as mazelas stalinistas), então só restava “cruzar os braços”... É claro que Robert redarguiu imediatamente e disse que devia ser entendido que “a realidade não é cristalina” e que o futuro depende sempre da atuação dos sujeitos... Assim, é necessário agir, e não acomodar-se e “perder tempo com sonhos pequenos”.
Henri disse que o amigo sabia que ele não tinha sonhos... A esse respeito, Dubreuilh esclareceu que todos os que sentenciam que “as coisas são más” (ele próprio dissera no ano anterior que “tudo é mal”) o fazem porque imaginam um “bem absoluto”... É aí que acabam revelando que seus sonhos estão colocados em preeminência... Isso é uma arrogância! Por outro lado, a modéstia nos levaria a entender que a realidade é maior, é plenitude... Fora da realidade não há nada, apenas o vazio.
(...)
Na sequência Dubreuilh voltou-se para Anne, que bebia silenciosamente... Ele perguntou sua opinião a respeito do que conversavam... Ela respondeu que durante muito tempo acreditou em Deus, e é por isso que chegou a admitir que os “males menores” pudessem ser escolhidos como se fossem o bem. Obviamente a convivência com Robert a mudara, e é por isso que ela lhe deu razão no debate com Henri.
Perron ouviu e disse que podia ser que viesse a concordar com Anne... Dubreuilh voltou à carga e comentou que o que dizia era “com conhecimento de causa”, pois outrora ele também justificara sua indisposição para o engajamento alegando “a indignidade do mundo”.
Henri pensou que talvez naquele momento Dubreuilh estivesse “justificando suas más disposições a golpes de teorias”... Mas também considerou que ele mesmo pudesse estar desvalorizando tudo o que lhe era dito por conta de sua “má disposição”.
Serviu-se de mais bebida enquanto refletia sobre a situação... Por fim disse que os argumentos de Dubreuilh eram “algo pessimista”.
Robert respondeu que podiam ser considerados pessimistas se analisados à luz do que ele formulava no passado, quando era “mais empolgado”, com suas “ideias risonhas”... A História não é risonha! É preciso vivê-la... Escapar é que não é possível! Todos nós temos de procurar a melhor forma de viver a História... Seguramente a abstenção não pode ser a opção.
(...)
Henri pretendia fazer outras perguntas mais... Mas aconteceu que Nadine se aproximou do escritório a passos largos...
De repente a porta se abriu.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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