Henri não podia deixar de pensar o quanto aqueles tipos (os comunistas) haviam mudado em relação a ele... O texto de Lachaume o acusara de “salafrário, vendido, fascista”... No entanto apareciam estendendo-lhe as mãos.
Ele quis saber quem participaria do comitê... O rapaz respondeu que todos os que quisessem aderir... Não importava se a pessoa era mais ou menos importante... A causa era justa, mas muitos a evitavam, então a esperança era conseguir a sua participação para que outros se animassem.
Henri perguntou por que eles não convidavam primeiramente a Dubreuilh... Lachaume respondeu que Robert era “muito próximo aos comunistas” e era importante que as pessoas dissociassem o movimento do partido... O nome de Henri não despertava maiores suspeitas dos que criticavam o PC.
Henri ironizou a situação ao dizer que os tipos o entendiam como um “socialista traidor”, e era só por isso que consideravam seu nome útil.
Suas palavras irritaram Lachaume... O que ele queria dizer com “útil”? Útil a quem? Ao partido? Henri devia entender que a única finalidade do movimento era a de contribuir para a denúncia dos abusos contra os militantes pela libertação malgaxe. Inocentes estavam presos e sendo torturados! Diariamente chegavam cartas à França com as denúncias mais diversas... Elas pediam simplesmente que se falasse a respeito dos processos para despertar na opinião publica francesa a indignação...
Henri quis saber o que Lachaume pretendia no final das contas... Ele insistiu que entre os comunistas havia mistura de “mentiras políticas com verdadeiros sentimentos”, e isso o deixava confuso.
O rapaz respondeu que Henri e aqueles com os quais ele se entendia prejulgaram as iniciativas comunistas ao acusarem-nos de “maquiavelismo”... Lachaume citou o episódio de 1946 quando seus companheiros intervieram “em favor de Cristino Garcia*” e depois foram acusados de terem “tornado inevitável a sua execução”.
* espanhol das Astúrias, foi soldado do exército republicano durante a Guerra Civil Espanhola; participou da Resistência Francesa durante a Segunda Guerra; de volta à Espanha, lutou contra as tropas franquistas até ser capturado no final de 1945; foi executado em fevereiro de 1946.
Após o desabafo de Lachaume, Henri pediu ele que se acalmasse... O rapaz respondeu que já não tinha paciência para suportar tantos “ataques de desconfiança”.
Henri não possibilitou a continuidade da discussão porque não disse mais nada a respeito... Ele se lembrou de um dia ter ouvido desse mesmo Lachaume que “engoliria o que fosse necessário antes de deixar o partido”. O que se podia fazer? É verdade que já não podiam ser amigos como outrora, mas não havia motivos para não concretizarem parceria na causa malgaxe. É por isso que ele disse que “podiam tentar”.
Lachaume quis saber se poderia dizer a Lafaurie... Henri não discordou, mas quis explicações sobre o que tinham em vista.
A resposta foi decepcionante, já que Lachaume disse apenas que “discutiriam juntos”. De repente, e em pensamento, Henri lamentou-se de ter escrito o artigo na Vigilance... Depois concluiu que aquilo não seria por muito tempo.
(...)
Na sequência o texto
volta a fazer referências à Anne.
Um dia depois de sua chegada a vemos explicando seus “ares de estafa”
para Nadine... A viagem de avião é sempre cansativa, e há também a questão da
diferença do fuso...
Nadine havia coletado
várias flores e enfeitado o escritório... Apesar da iniciativa alegre e jovial,
o ambiente não era festivo... Parece que ninguém estava interessado em
prolongar uma conversa a respeito da estadia de Anne na América... Sua
aparência não era das melhores, pois aparentava envelhecimento fora do comum.
Além disso, a mulher não parava de bebericar uísque...
Dubreuilh notou e tornou-se preocupado. Nadine pôs-se a tricotar enquanto Henri
esclarecia a reunião do comitê sugerido por Lachaume.
Em síntese, Patureau e outros advogados se deslocaram de Madagascar a
Paris para a reunião... Henri demonstrou irritação ao concluir que nada podia
ser feito... Dubreuilh completou que todos esperavam que a Câmara “daria o
golpe decisivo”. Anne se intrometeu e disse que não esperava outra reação dos
políticos... Sua decepção era com a falta de reação das pessoas comuns...
Indiferença geral...
Anne quis saber se Robert considerava a situação
desanimadora... Ele respondeu que o evento provou que “a ação não se improvisa”.
(...)
Para Dubreuilh, o evento organizado pelo comitê havia “partido do zero”...
Não tinha grandes chances de produzir resultados... A partir de seu ponto de
vista, de tudo se tirava um proveito, uma lição... Ele entrou no comitê, mas
não se tornou militante de muitas ocupações... O que mais lhe interessava era a
retomada dos contatos políticos.
E tanto é verdade que ingressou também no “Combatentes
da Liberdade”... Participou de um comício... Não insistia para que Henri o
acompanhasse... Apenas eventualmente deixava escapar algumas palavras provocativas
sobre o semanário. De fato, já não insistia a respeito da ideia de trabalharem
juntos.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/12/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_14.html
Leia: Os
Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto