Helena atirou-se nos braços daquele que imaginava ser o marido... Tertuliano não a abraçou, mas também não a repeliu.
Ela perguntou o que havia acontecido... Com ares de abandonada, explicou que não conseguira suportar a solidão desde que a deixara.
Tertuliano não disse nada... Apenas deixou-se conduzir para dentro do apartamento.
(...)
Ele esperou que ela se sentasse no sofá... Depois lhe
entregou o jornal com a página do acidente em evidência... Sem demonstrar a
intimidade dos que são casados, apontou para a matéria.
Helena fez a leitura sem analisar a fotografia do carro destroçado...
Pronunciou um “que horror!” e seu lamento podia ser confundido com uma
expressão de alívio.
Como que a se corrigir, completou dizendo que aquilo
só podia ter sido uma infelicidade... Não se sentia alegre... Claro que não! Todavia
era certo que aquilo colocava ponto final à confusão.
Tertuliano permaneceu de pé... Esperava o momento certo para revelar
mais... Em seu entendimento, o que tinha para dizer era muito pior.
(...)
Um alívio...
Helena esperava mudanças no relacionamento com o marido... A morte do
tipo que era o “seu igual” traria tranquilidade aos dois.
Fechou o jornal e o deixou de lado.
O que interessava naquele
momento era permanecer ao lado dele e conversar a respeito do que ele fizera
desde a última tarde, quando a deixou... Queria participar de suas
preocupações, entendê-lo melhor... Essas coisas que uma esposa devotada busca
contemplar.
(...)
Tertuliano não podia “segurar
a barra”... Tinha de revelar os fatos de uma vez por todas! Se não fizesse isso
naquele momento teria de “calar-se para sempre”.
Ele disse que o tipo
que morrera no acidente não era o Tertuliano Máximo Afonso. Helena o olhou
boquiaberta e quis saber ao certo o que ele estava a lhe dizer... Ele repetiu o
que havia dito anteriormente.
A mulher se espantou e perguntou sobre quem seria... O jornal fornecia
informações erradas?
Tertuliano respondeu que o
homem morto no acidente com o caminhão era o marido dela, Antônio Claro.
(...)
E foi assim mesmo... O professor não ficou a dar meias-voltas
no assunto... Se não falasse de uma só vez teria sérios problemas depois.
Helena ficou transtornada... Com dificuldade, insistiu que o jornal
informava sobre os documentos do homem que conduzia o “veículo de turismo”...
Eles estavam em nome de Tertuliano Máximo Afonso!
Tertuliano passou-lhe o documento que carregava no
bolso do casaco... Ela observou a fotografia e olhou o portador... Entendeu no
mesmo instante o que havia ocorrido. Tanto pensou sobre a barbaridade que se
sentiu zonza... Ela começou a perder os sentidos e tudo indicava que desmaiaria.
Foi por isso que Tertuliano a segurou pelas mãos imprimindo alguma força para
que ela despertasse do delírio.
Helena não desmaiou, mas chorou copiosamente. Seu olhar era de horror...
Tertuliano lembrou que também ele havia ficado naquele estado quando
soube da morte de sua amada Maria.
(...)
Ofegante, Helena perguntou o que ocorreria a partir de então...
Tertuliano respondeu que desapareceria definitivamente de sua vida...
Manifestou que gostaria de pedir-lhe perdão, mas isso também lhe pesava como
uma ofensa.
A única coisa que podia
fazer era afastar-se o mais que podia de sua vida. E tudo o que podia dizer é
que lamentava o que ele havia provocado.
Não havia remédio...
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/12/o-homem-duplicado-de-jose-saramago_4.html
Leia: O
Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto