Três dias depois ocorreu o enterro do “falso Tertuliano”.
Dona Carolina compareceu e procedeu conforme havia combinado com o filho...
Helena também esteve presente, mas dava a entender que o morto era um desconhecido qualquer.
Tertuliano, agora na condição que resolvera assumir, permaneceu em casa aguardando o retorno da esposa.
Acomodou-se para ler o livro sobre as civilizações mesopotâmicas...
(...)
De repente o telefone tocou.
Ele atendeu sem o menor receio... Do outro lado um tipo disse “até que fim” com
uma voz que era idêntica à sua.
O diálogo que se seguiu foi de estremecer...
Tertuliano pensou que estava na mesma cadeira ocupada pelo verdadeiro Antônio
Claro no dia em que ele lhe telefonara.
O tipo quis saber se estava falando com Daniel Santa-Clara... Tertuliano
confirmou... O outro explicou que já fazia algumas semanas que o procurava...
Sentia-se aliviado por encontrá-lo finalmente.
Ele queria encontrar-se pessoalmente com o Santa-Clara... Tertuliano
procurou esquivar-se... Mas o tipo insistia... Como se podia observar, as vozes
eram idênticas... Mais que isso! Qualquer pessoa que os vissem juntos apostaria
que eram gêmeos!
Tertuliano prosseguiu com sua tática de fazer o outro crer que ele não
estava entendendo nada. Além disso, não acreditava “em impossíveis”, tinha mais
o que fazer e não podia perder o seu tempo com conversa fiada.
O desconhecido falou sobre uma série de características físicas suas (sinais
nos braços, cicatriz no joelho...) e apostava que o Santa-Clara também as
tivesse.
Tertuliano disse que aquilo
não provava nada, mas quis saber de onde o tipo estava falando.
Ele explicou que estava
numa cabine não muito longe da casa do Santa-Clara... Tertuliano quis saber
onde podiam se encontrar... O tipo explicou que devia ser num local isolado e
sem que pudessem avistá-los... Tertuliano concordou e emendou que não eram “fenômenos
de feira”.
O outro falou sobre
um parque na periferia da cidade... Tertuliano concordou. Como não podiam
entrar com os veículos no parque, caminhariam até um bosque localizado “depois do
terceiro lago”... O encontro ocorreria em uma hora e Tertuliano admitiu que
talvez fosse o primeiro a chegar ao local.
Depois de desligar o aparelho, Tertuliano escreveu um recado para
Helena... No papel grafou apenas “voltarei”.
(...)
Palavras do próprio
Saramago para o encerramento do romance:
“Depois foi ao quarto, abriu a gaveta onde
estava a pistola. Introduziu o carregador na coronha e transferiu um cartucho
para a câmara. Mudou de roupa, camisa lavada, gravata, calças, casaco, os
sapatos melhores. Entalou a pistola no cinto e saiu”.
Leia: O
Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto