sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

“Rei do Congo – A mentira que virou folclore”, de José Ramos Tinhorão – D. Álvaro I, sucessor de D. Diego; luta contra os jagas e auxílio de D. Sebastião; início da União Ibérica, enfraquecimento de Portugal e implicações para o Congo; de Angola, as pressões do donatário Paulo Dias de Novais; tentativa de aproximação diplomática com a Santa Sé; Mpangu a Nimi, o D. Álvaro II da proposta de tornar o Congo um feudo do papa; agravamento das condições humanas no território africano


Como sabemos, os jagas, que eram um belicoso povo nômade, invadiram a capital do Cango, São Salvador. Houve destruição e o então rei, D. Diogo, tornou-se exilado com outros parentes na ilha dos Cavalos. Entre esses, estava Nimi Lukeni lua Mbemba, que viria a se tornar rei em 1567 e ficou conhecido por seu nome cristão, D. Álvaro I.
Então o início de seu reinado foi marcado pela luta contra os jagas... Apenas em 1570 é que, graças ao auxílio militar enviado pelo monarca português D. Sebastião, D. Álvaro pôde deixar o exílio. Isso resultou em uma obrigação tributária devida pelos congoleses, o “preço da paz”, em pagamento a Portugal...
Tinhorão diz que o rei do Congo se tornou vassalo do monarca português... E como por ironia, D. Sebastião, que morreu em 1578 na batalha de Alcácer Quibir, levaria os portugueses a se tornarem vassalos dos reis espanhóis, a partir da formação da União Ibérica (1580-1640; união de Portugal e Espanha; governada pelos reis Felipes da Espanha).
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Com a União Ibérica, o “reino cristão” do Congo também sofreu conturbações políticas. Primeiro
porque o rei africano foi praticamente ignorado pelo “aliado europeu” que, com o domínio espanhol, havia se enfraquecido. Segundo porque teve início uma forte pressão dos traficantes de escravos em suas exigências por maior liberdade de ação... E mais... Desde Angola, o donatário Paulo Dias de Novais adotava postura agressiva que em pouco tempo fez da colônia mais ao sul uma adversária e significativa concorrente dos congoleses. Novais levou em consideração, e a consequências extremadas, as ações para destruir a importância do Congo.
Esse contexto de revezes levou D. Álvaro I do Congo a buscar apoio diplomático... Ele enviou embaixadores à União Ibérica com a expectativa de receber ajuda de Portugal, que estava, como sabemos, fragilizado e governado pelos espanhóis. Também enviou embaixadores a Roma esperando uma intervenção papal... Tais iniciativas deram em frustradas, já que seus delegados acabaram assaltados e mortos por corsários.
O reinado de D. Álvaro terminou com a sua morte em 1587. Sua sucessão foi marcada pelas tradicionais desavenças familiares. Mpangu a Nimi, filho do rei com uma escrava, tratou de derrotar um “irmão rival” e de combater com rigor a trama urdida por uma de suas irmãs.
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Este Mpangu a Nimi foi reconhecido rei e sucessor de D. Álvaro I, reinou sobre o Congo com o nome cristão de D. Álvaro II e, basicamente, procurou reforçar a “posição interna de independência”. Em relação a essa determinação, sofreu ataques dos comerciantes portugueses e de Angola. No campo externo, D. Álvaro II tomou a iniciativa de buscar um entendimento com Roma e sugeriu “tornar o Congo um feudo” da Santa Sé “com a garantia para ele do título de majestade”.
Sobre a tentativa de estreitamento dos laços do Congo com a Santa Sé, o livro destaca que D. Álvaro II determinou uma “embaixada diplomática ao papa”... Segundo o próprio rei, a missão não podia ser entregue a qualquer cristão, por isso decidiu que o “chefe religioso do Congo, Antonio Manuel ne Vunda” deveria seguir para Roma. Também isso resultou em frustrado...
Aconteceu que a comitiva enviada foi atacada por piratas no Mar Mediterrâneo... Além disso, por motivos não esclarecidos, demorou-se demasiadamente na Península Ibérica... A chegada a Roma deu-se apenas em 1608 e foi marcada pelo falecimento de Antonio Manuel ne Vunda dias depois do desembarque e algumas horas após ter sido recebido pelo papa... Registre-se que, apesar desse infortúnio, a missão apresentou-se ao papa Paulo V e falou-lhe sobre as propostas e pedidos de D. Álvaro II.
A respeito da iniciativa do rei do Congo em sua radical aproximação diplomática com o papa, podemos dizer que ela foi pouco produtiva. De positivo para o Congo, a Santa Sé nomeou “o cardeal de Santa Cecília como protetor” do país africano em 1613... Um ano depois D. Álvaro II morreu.
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O fim do reinado de D. Álvaro II ocorreu numa época em que, como podemos depreender, as iniciativas de tornar o Congo mais autônomo em relação ao aliado europeu e independente dos agentes portugueses envolvidos no comércio e tráfico de escravos fracassaram. Piratas franceses e holandeses atuavam na região e já não havia esperança de que Portugal (submisso à Espanha) pudesse enviar qualquer ofensiva...
Este quadro contribuiu para “a degradação social e violência humana” já marcada pelo comércio de escravos.
Leia: Rei do Congo. Editora 34.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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