Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/02/rei-do-congo-mentira-que-virou-folclore_17.html antes
de ler esta postagem:
Os registros da última postagem sobre “Rei do
Congo” mostraram que o Regimento outorgado por D. Manuel ao líder político do
Congo, além das orientações sobre a organização de uma Casa Real nos moldes das
que existiam na Europa*, trazia recomendações ao delegado português que, no
país africano, devia proceder de modo a manter a aliança política e a garantir
o projeto econômico.
O fragmento abaixo do
referido documento nos revela um pouco do exposto no parágrafo anterior:
“Item.
Trabalhareis de saber no trato que lá pode haver, e de que coisas, e se os
escravos, cobre e marfim e outras mercadorias que na terra houver se são todas
do rei ou há aí mercadores, e até que soma das ditas coisas se poderá haver de
tirar cada ano, e por que mercadorias; e se da mão do rei as ditas mercadorias
são, e o que delas nos poderá dar; e a tentar se ele se oferece a nos dar cada
ano alguma soma e quanto. Isto como de vosso; e de todo me avisai cumpridamente
por vossa carta para sabermos o proveito que de lá se pode tirar”.
* Nunca é demais lembrarmos que havia o interesse
português no “fortalecimento do poder central do Congo” e no reconhecimento do “rei”
local.
(...)
Assim como salientado
em postagem anterior, o autor selecionou trechos que foram organizados por
Antonio Luís Ferronha, “Alguns documentos da Torre do Tombo acerca das
navegações e conquistas portuguesas”. Os fragmentos seguem entre aspas.
(...)
Simão
da Silveira, o encarregado de entregar pessoalmente a D. Afonso do Congo o
regimento enviado por D. Manuel, recebeu orientações relativas à necessidade de
compensar os gastos portugueses no envio dos navios ao Congo... Isso devia ser
saldado pelo rei africano, e a recomendação era a de que o enviado deixasse
claro que o transporte tinha um custo considerável:
“A grande despesa que
fazemos com a enviada destes navios, fretes e clérigos, e coisas que lhe
enviamos; e que já antes de nós foram e assim a despesa que se cá fez na
manutenção e ensino de seus filhos”.
Silveira devia se
esforçar também em retornar ao país com algum carregamento, já que “não haveria
razão dos navios regressarem vazios”:
“Logo
que chegardes, começais a negociar com o rei, o mais honestamente que puderdes,
o aviamento dos navios que levais, e carga que para ele vos há de dar. Dizendo-lhe
como nós vos enviamos com os ditos navios os quais se não puderam escusar para
agasalho da gente e de todas as coisas que levastes, nas quais, e assim nos
fretes, mantimentos e soldos, nós gastamos muito”.
Ainda em relação às orientações ao enviado português ao Congo, D. Manuel
ressaltava a necessidade de ter em mente o “objetivo de servir a Nosso Senhor”...
Todavia notamos que prevalecia o interesse econômico:
“Trabalhareis como logo se comece a
entender na carga dos navios e porque ele para isso houver de dar assim de
escravos como cobre e marfim” (...)
O conteúdo das
orientações de D. Manuel a Simão da Silveira não escondia a estratégia de
mostrar ao rei africano que a ele devia “reciprocidade moralmente obrigatória”:
“por
onde (quer dizer, a partir do reconhecimento dos favores que lhe foram
prestados graças aos carregamentos desde Portugal), ele deve carregar os ditos
navios o mais abastadamente que puder, de maneira que nós tenhamos ainda mais
razão de fazer bem as suas coisas, como fazemos”.
O
rei português dissimulava, mas não escondia o interesse maior de sua relação
com o Congo... O principal “artifício” utilizado era o do fortalecimento da fé
cristã, que sempre era citado depois das orientações claramente mercantis.
Tinhorão destaca um trecho que evidencia o anteriormente afirmado: “posto que
vós saibais certo que nosso intento e lembrança não é de haver proveito de
fazenda, somente de acrescentamento da fé”.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/02/rei-do-congo-mentira-que-virou-folclore_24.html
Leia: Rei
do Congo. Editora 34.
Um
abraço,
Prof.Gilberto