Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/02/rei-do-congo-mentira-que-virou-folclore.html antes
de ler esta postagem:
Em
suas cartas ao monarca português, o rei cristão do Congo colocava-se sempre na
condição de humilde aliado “inferior” a espera de favores e como quem sabia da
necessidade e importância de tratá-lo com mesura. Influenciado pelo estilo
contido e formal de D. Manuel, o manicongo parecia se esforçar na observação do
rigor da formalidade.
Na sequência apresentamos pequenos fragmentos que nos revelam um pouco
dos tratamentos dispensados pelos monarcas em suas missivas.
(...)
* Início da carta de D.
Manuel (1512) por ocasião da apresentação de seu embaixador, Simão da Silveira,
para o Congo:
“Muito
poderoso e excelente rei do Manicongo. Nós D. Manuel pela graça de Deus rei de
Portugal, Guiné vos enviamos muito saudar”...
* Início da carta de D. Afonso (1514) por ocasião de suas denúncias
sobre a atuação nociva do governador da ilha de São Tomé:
“Muito
alto e poderoso príncipe e senhor. Nós. D. Afonso por graça de Deus rei do
Congo e senhor dos Ambundos, etc. (...) com aquele acatamento e reverência que
de rei a rei devemos fazer”...
(...)
Um estudo mais apurado das cartas de D. Afonso I ao rei português nos
revelaria que ele sempre se dirigia em tom subalterno. Talvez experimentasse
certa condição de paridade ao fazer referências aos deveres e “princípios
cristãos” que ele e o monarca português tinham em comum.
Tinhorão cita fragmento de carta de 1526 (a D. João III) em que o rei do
Congo relata ações de franceses na costa do país e a postura extremamente
inadequada de portugueses preocupados apenas em “mercadejar e vender suas
coisas mal havidas”. O fragmento corrobora o que citamos anteriormente:
“Por que pedimos a V. A. por amor de Jesus Cristo nos
queira ajudar e favorecer em tudo o que o dito e por muitas vezes pedido temos,
pois é tanto serviço de Deus e seu, e tudo carrega sobre sua consciência;
porque nós não é mais poder, que o qual de com tino (de contínuo) fazemos e
obramos. E o que a nós cabe recomendar podemos sem outro adjutório, nós o temos
feito e cumprido, mas aquilo que sem ajuda e favor de V. A. fazer não podemos,
disso lhe pedimos o remédio, como a quem de direito pertence”.
(...)
De 1511 a 1557 D. Afonso I
do Congo manteve correspondência com os reis de Portugal. D. Manuel e D. João
III receberam cartas suas que, de modo geral, manifestaram pedidos de apoio e o
interesse de firmar as trocas típicas dos tratados que visam o fortalecimento
das economias que fazem acordo.
Verifica-se
que o rei do Congo tinha consciência do quanto a ganância dos comerciantes
portugueses prejudicava a aliança dos africanos com o país europeu. Ao
colocarem seus interesses particulares acima dos da própria nação mostravam-se
preocupados apenas com o enriquecimento instantâneo, mesmo que para isso
tivessem de fazer acertos com espoliadores estrangeiros. De sua parte, Afonso I
do Congo fez tudo o que podia para evitar que o propósito inicial da aliança
com Portugal desse em fiasco.
O rei do Congo denunciou as tratativas dos portugueses aliados de Fernão
de Melo, governador da ilha de São Tomé, com os patrícios que chegavam para as
práticas comerciais. Esses, tão logo adentravam o continente, passavam a se
dedicar ao tráfico clandestino de escravos e a outras práticas que
inviabilizavam os negócios oficiais.
(...)
Para Tinhorão a relação Portugal-Reino cristão do
Congo estava mais para um “jogo de enganos” e as cartas trocadas entre os
monarcas apenas escancaravam as disparidades. A igualdade que o manicongo
imaginava na verdade era apenas artificial... Do lado português, a serenidade
superior; do lado africano “a agoniante exposição de queixas”.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/02/rei-do-congo-mentira-que-virou-folclore_14.html
Leia: Rei
do Congo. Editora 34.
Um
abraço,
Prof.Gilberto