Helena esclarece o que mais chamava a sua atenção nos dias de eleição.
As pessoas tomavam um partido, e isso significava basicamente apoiar este ou aquele candidato. Por ocasião da eleição todos sabiam quem votava a favor e quem votava contra os candidatos que apoiavam. Então “ninguém perdoava”.
Somos tentados a imaginar as gozações e discussões que ocorriam... A menina destaca a animação em torno da movimentação e falação dos adultos. Nessas ocasiões a cidade parecia não ter outra coisa que interessasse.
Mas depois que o dia de eleição chegava ao fim restava bem pouco do que se falar. Helena conta que o seu Cadete também se tornava centro de atenções... Ele distribuía roupa e botinas aos negros para que participassem da votação.
(...)
Como se sabe, apenas
os homens maiores de 21 anos e alfabetizados podiam votar. Então os candidatos
ou seus acólitos faziam de tudo para convencer os potenciais eleitores.
Helena
explica que, na chácara, os negros “que sabiam ler” eram apenas Marciano,
Roldão e Nestor. No dia da eleição, bem cedo, eles já se arrumavam com roupa
limpa e tudo. Dona Teodora dava-lhes a recomendação de não conversarem com
ninguém “nem aceitarem papel nenhum” que insistissem em entregar..
Então, o que deviam
fazer? A avó de Helena explicava que eles não deviam sair de perto do tio
Joãozinho. No momento de votar tinham de fazer o que ele mandasse. Os fiéis
agregados de dona Teodora se enchiam de importância e saíam todo orgulhosos.
Os registros do dia
1º de março de 1894 foram encerrados com a opinião de Helena a respeito de toda
aquela movimentação. A menina gostava de ver a animação de todos na cidade, mas
não acreditava sinceramente que a política pudesse “adiantar alguma coisa” para
aquela gente.
(...)
Nos registros de 15
de março de 1894 Helena ainda repercute a respeito do confronto entre as tropas
governistas, fiéis a Floriano Peixoto, e os “custodistas” (que apoiavam os
liderados pelo almirante Custódio de Melo na chamada Revolta da Armada).
Àquela altura todos
conheciam o resultado do conflito. Sem dúvida contou para a vitória de Floriano
a aquisição de embarcações de guerra nos Estados Unidos. A esquadra chegou ao
Brasil conduzida por mercenários daquele país.
(...)
Helena desabafa por não entender por que tinha um gênio tão diferente
dos demais parentes. Não suportava sofrer contrariedades, algo espantoso ante o
modo conformado dos pais e irmãos. Eles nunca discutiam e nem eram dados a se
intrometer em assuntos polêmicos!
Essa sua condição de não se resignar diante de certas adversidades a
levava a pensar que a educação que os pais transmitem não pesa muito na
formação do caráter da pessoa. Cada um é “como Deus o fez e assim terá de ser”.
A própria dona Carolina dizia algumas vezes que Helena
nem parecia ser sua filha. E nem mesmo podia ser comparada às primas. O seu
Alexandre era da opinião que ela se parecia muito com uma de suas irmãs. A
menina não conhecia essa “tia inglesa” chamada Alice porque há muito tempo ela
se casara com um doutor conhecido do “avô inglês”. Depois do casamento partiram
para São Paulo e nunca mais voltaram à Diamantina.
Talvez a grande
diferença entre o gênio de Helena e o de seus irmãos era o fato de ela prestar
atenção à conversa dos adultos e se interessar pelos assuntos. Ela gostava
disso e sempre tomava partido nas diversas questões.
Os irmãos eram pacatos. Mas o que ela podia fazer se, mesmo sabendo que
não devia se intrometer nos debates dos adultos, sempre acabava formando um
juízo?
(...)
Era
o que vinha ocorrendo desde que se iniciara os conflitos entre a Armada
liderada por Custódio de Melo e as tropas que defendiam Floriano e seu governo.
Helena sabia que o
pai e os tios eram “custodistas”, e de tanto ouvi-los a respeito das maldades
do presidente passou a sentir muita raiva dele.
A
menina confessa que todas as noites antes de dormir vinha pedindo a Deus que
lhe tirasse dos pensamentos o ódio e o desejo de que alguém matasse aquele “demônio”.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/05/minha-vida-de-menina-de-helena-morley_22.html
Leia: Minha
Vida de Menina. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto