Lewis despachou Maria...
Ao retornar, explicou para Anne que já fazia quatro anos que ela estava internada... Como se conheceram? Maria soube de seu livro e escreveu-lhe pedindo um exemplar... Aconteceu que desde então um vínculo foi criado e nem mesmo ele podia explicar... Era assim mesmo, ele e seu ambiente acabavam atraindo “gatos, loucos, viciados em droga”, enfim, tipos como Maria.
(...)
Anne organizou a mesa e distribuiu em dois copos
o que restava do chianti para fazerem a refeição... Brogan arranjou uns discos
no pick-up... Enquanto se alimentavam, ele sentenciou que não havia mentido a
Maria (estava fazendo referência ao fato de ter dito a ela que estava casado
com a francesa).
Anne considerou essa ocasião ideal para fazer o seu
desabafo... Começou a falar sobre a sua condição de esposa e mãe... Disse essas
coisas sem terminar as frases... Certamente estava bem insegura porque
acreditava que aquilo significava o rompimento definitivo... É por isso que
olhava o apartamento e suas instalações como se já não pertencesse ao local...
De sua parte, Brogan arrematou que não imaginava que o casamento
representasse tanto para Anne... Depois de um breve silêncio, sentenciou que a
cada instante ela se tornava a pessoa mais importante em sua vida... Disse isso
e sugeriu que fosse descansar.
(...)
Anne se deitou e ficou ouvindo o barulho provocado
pelos movimentos de Lewis na cozinha... Logo adormeceu... Quando despertou, viu
que ele estava dormindo ao seu lado. Restou-lhe imaginar o que teria pensado
sobre ela... E também por que não a acordou...
Novamente a lembrança de seu retorno (que se daria em dois dias) a
angustiou. Então pensou que poderia telegrafar para Paris comunicando que
permaneceria por mais uns dez dias... É claro que depois teria mesmo de partir
de um ou outro modo... E seria o fim...
Permanecer por mais tempo significava transformar a aventura em “amor
verdadeiro”... Isso a faria sofrer...
Lembrou-se de Paule...
Evidentemente não queria experimentar o mesmo sofrimento...
Por outro lado, Anne considerou que o tempo se
revela um “remédio eficaz”. Lewis também se esqueceria dela... Assim, importava
a consciência de que o esfacelamento da relação na memória do amado não poderia
ser atribuído a ela.
(...)
Brogan acordou e
quando a notou perguntou se ela não dormia... Anne sentou-se na cama e, em vez
de respondê-lo, perguntou o que ele pensava sobre ela permanecer por mais
alguns dias (uma ou duas semanas). O anfitrião demonstrou preocupar-se com os
compromissos que a aguardavam em Paris...
Anne revelou-se decidida e, como que a apresentar uma solução para a
situação, disse que isso se resolvia com uma simples mensagem telegráfica...
Brogan deixou claro que, de sua parte, permaneceria com ela por toda a vida.
Na sequência os dois se entrelaçaram... Seus
corpos pareceram formar um só elemento...
O casal vivenciou momentos de profundo êxtase...
Entre suspiros, Lewis e Anne trocaram confissões
apaixonadas...
(...)
Anne permaneceu por quinze dias em Chicago. Brogan também não se conteve
de felicidade e o tempo que passaram juntos foi muito prazeroso... Não se
cobravam e não se perdiam com questionamentos sobre o passado um do outro... O
tempo passou rápido e o americano falava sempre muito depressa, como quem
deseja não perder oportunidade de se revelar... Cada descoberta a respeito do
parceiro se tornava motivação no peito apaixonado dela.
Ela, que sempre fora um tipo inseguro a respeito dos
sentimentos que despertava nos demais, estava satisfeita em não se perguntar
por que Lewis a amava ou o que ela lhe oferecia de tão especial... Convencia-se
cada vez mais de que o desejo do amigo era apenas estar junto dela.
Brogan não conseguia esconder a sua satisfação em conviver com alguém
que, enfim, podia se entender... Ela não acreditava que um tipo como ele pudesse
afastar as pessoas... Ele também fazia questão de dizer que a francesa era
muito agradável e disposta a aceitar as suas sugestões.
(...)
Anne pensou sobre como teria sido se o encontro com Philipp tivesse
ocorrido... Concluiu que resultaria em fracasso e ainda por cima o amor entre
ela e Lewis não teria se tornado possível... O desprezo de Philipp
proporcionou-lhe grande felicidade, realmente.
(...)
Os últimos momentos do casal foram de namoro sob o céu estrelado... E
com direito a estrelas cadentes e desejos!Anne manifestou interesse de revê-lo na próxima
primavera... Ele fez questão de garantir que sua revisita transformaria qualquer
estação em primavera.
O derradeiro dia foi
reservado para compras e último jantar. À noite, Brogan deu-lhe uma flor branca...
De tão emocionada, Anne a mordeu.
(...)
Os dias ao lado de Brogan foram de uma vitalidade que Anne jamais
conhecera... A despedida foi pela manhã, numa esquina para onde o táxi foi
chamado... Era como se Anne estivesse morrendo... O taxista perguntou se o tipo
entristecido era seu marido...
Lewis seguiu “só para o seu quarto vazio”.
Anne subiu “só ao avião”.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/05/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir-o_22.html
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto