quinta-feira, 22 de maio de 2014

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – o retorno à austeridade parisiense e às preocupações do marido; crise política e dificuldades de manter a união das esquerdas; sectarismo do PC e avanço do MRP, de De Gaulle; Anne e seu conflito entre dois amores

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/05/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_21.html antes de ler esta postagem:

Perceberemos que a volta de Anne a Paris coincide com os episódios já narrados por aqui (críticas dos comunistas em L’Enclume a Dubreuilh; morte do pai de Lambert; affair  de Henri com Josette; o dossiê Peltov...).
(...)
Dezoito horas de voo... Anne chegou a Paris e era como se tivesse passado de um mundo para outro completamente diverso.
Seus pensamentos a levavam para os últimos momentos com Brogan e à perfumada flor da despedida... Foi de repente que se deparou com Robert e seu braço amigo disposto a conduzi-la...
Trocaram sorrisos e caminharam. O passado recente se petrificara e devia ficar para trás.
É claro que Anne trocou cartas com o marido enquanto esteve na América... Paris, familiares e amigos pertenciam ao seu “mundo real”. Era a ele que retornava. Então tudo se lhe apresentava como havia deixado...
E o que via enquanto caminhava? Vendedores ambulantes e seus artigos preciosos (aspargos e junquilho típico da primavera), mulheres e sua vestimenta empobrecida, veículos velhos e capengas...
A mesma austeridade do pós-guerra...
O seu interlocutor despejava frases sobre ela, que notava os seus ares de preocupação... “Não havia dúvida”, Anne retornara para casa.
(...)
Os Dubreuilh seguiram até Saint-Martin que, como sabemos, era o local onde o casal estabelecera um ambiente para descansos retirados da agitação da capital... Uma certeza tomou conta de Anne, Robert andava amargurado devido ao artigo de L’Enclume (detalhes em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/12/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_2.html) que o criticava duramente... Ela não concordava com a posição adotada pelos comunistas, pois considerava inclusive que o marido havia feito várias concessões a eles... Não, definitivamente não via em Robert um tipo identificado apenas com as posições do passado...
Conversaram a respeito desse assunto... Dubreuilh se mostrou desgastado e até admitiu que, de fato, estava envelhecido.
(...)
Anne concluiu que o SRL não tinha o que fazer até as eleições... O MRP estava eufórico (De Gaulle estava agitado e convicto de que o Movimento Republicano Popular não poderia contar com as fileiras comunistas, pois, em sua opinião o PC francês era simplesmente um braço de Moscou, e a seu serviço, na conquista da Europa)... O “partido americano” mantinha-se firme (atraindo muitos católicos) e ávido pela aventura política...
A intenção de Robert era reagrupar a esquerda sem prejudicar os comunistas... Mas eles permaneciam sectários...
(...)
Os dois primeiros dias após o retorno de Anne foram de desabafos de Robert a respeito de suas diferenças em relação ao PC... Ao ouvir o marido, ela percebia o “seu lugar” e em quê era importante para ele.
No entanto, ainda que estivesse gozando de plena saúde e pudesse percorrer a calma e florida floresta, sabia que não estava em paz consigo mesma... Não foram poucas vezes em que parou durante as caminhadas para pensar em Lewis... Nessas ocasiões sentia-se estremecer e “tinha vontade de gemer”.
As madrugadas tornaram-se pesadas demais para ela... Na escuridão sentia que abrigava a respiração, a voz e o sorriso do amado sobre o qual não podia falar...
Sua amargura aumentava na medida em que refletia que provavelmente não o amava devidamente nem suficientemente... Ao menos conseguiria retomar a sua vida... Estava de volta a Robert... Mas também se perguntava se o merecia, já que não sabia se o amava como devia...
(...)
O seu conflito incluía essas reflexões... Sim, porque mesmo estando ao lado do marido tinha vontade de chorar pelo americano... Afinal, seria o “amor físico”, o de Lewis, o que valia? Então “um amor que não é físico nada representa”?
A verdade é que o fato de ter conhecido Lewis não diminuía o seu interesse em viver junto a Robert... Todavia, estar junto ao marido, “não supria a ausência do outro”.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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