domingo, 18 de maio de 2014

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – Anne sabe que não poderá envolver-se totalmente com Lewis e sente a necessidade de falar a respeito de sua condição; novo passeio por Chicago e sua história; a intromissão de Maria, conhecida de Brogan, interna em um asilo psiquiátrico

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/05/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_15.html antes de ler esta postagem:

À noite, Anne foi tomada por vários temores...
Não podemos dizer que os episódios sobre a indisposição de Lewis no “Delisa” não tivessem sido superados, mas a reconciliação lhe trouxe novas reflexões.
Ele garantiu que a amava, e ela bem sabia que isso era algo que não poderia corresponder.
De modo algum pretendia envolver o seu amado em uma crise emocional.
É por isso que, ao amanhecer, decidiu que deveria falar-lhe a esse respeito.
(...)
Porém, aconteceu que Brogan despertou disposto a passear pela cidade e a contar-lhe sobre a história que ele conhecia tão bem... Então Anne não quis ser motivo de nova desavença e permitiu-se ser conduzida por ele.
Logo após o café, seguiram pelas ruas onde se viam casebres antigos com carros luxuosos estacionados... Depois passearam de canoa e beberam Martini no alto de uma torre. Brogan falava com tanta autoridade sobre o passado de Chicago que dava a impressão de que ele mesmo teria vivenciado todos os eventos que narrava...
(...)
Logo entardeceu e ele quis saber onde ela gostaria de jantar... Anne deixou-o à vontade para decidir.
Quando Brogan disse que jantariam “em casa”, ela sentiu um aperto no coração, pois foi como se tivesse feito referência ao lar de um casal... Nesse mesmo momento também se lembrou de que devia falar a respeito da relação. A rigor tinham pouco tempo para viverem juntos. E ainda pesava-lhe a possibilidade de ele não aceitar ou não compreender a sua condição.
Depois de comprarem o necessário para a refeição (“presunto, salame, uma garrafa de chianti e pão de ló ao rum”) encaminharam-se para a escada próxima ao letreiro que vermelhejava... Ao iniciarem a subida, ele a abraçou com força e mais uma vez declarou que a amava demais...
Nesse momento, Brogan viu que na sacada havia alguém e apressou-se para saber quem era... Logo ele estava apresentando Maria, uma “velha amiga”, para Anne.
Ao ver que ele estava acompanhado, Maria foi dizendo que não pretendia atrapalhá-lo... Enquanto Brogan esclarecia que a presença da outra não representava nenhum incômodo, Anne viu que Maria era um tipo jovem, só que notava-se que estava bem descuidada... Sua voz era rouca e seus braços apresentavam equimoses...
(...)
A francesa queria saber o que aquela intromissão significava exatamente, já que ela apresenta-se de modo muito familiar... A conversa entre os dois fluía amigável... Enquanto abria a garrafa, Lewis quis saber se ela teve de aguardar muito tempo e se não passou por alguma necessidade enquanto o esperou... Maria respondeu que os vizinhos de baixo a trataram bem e ofereceram café... Ela parecia fazer questão de dizer que era por causa da consideração que tinham por ele.
Maria tomou de um só trago um copo cheio de chianti e falou que tinha coisas importantes a dizer... Brogan esclareceu que não havia motivos para não falar ali mesmo na presença de Anne. A mulher deu de ombros ao ouvir que a outra vinha de Paris... Bebeu mais do vinho e emendou que precisava da ajuda dele...
Enquanto esvaziava copos, foi falando de uma história um tanto confusa que girava em torno de casamento, divórcio e “vocação contrariada”... Então Anne entendeu que Maria era uma escritora (ou tentava escrever) que estava com dificuldade de finalizar um livro, e estava ali para que Lewis a auxiliasse... Reclamava que no lugar onde vivia não teria condições de terminar o trabalho...
Anne não compreendia a paciência de Lewis... Ele bem sabia que não teriam muito tempo mais para ficarem juntos... No entanto, conversava pacientemente com a intrusa e quis saber se a família dela não poderia auxiliá-la... Maria deixou claro que só poderia contar com ele... Enquanto dizia isso, organizava o ambiente colocando os papéis que estavam espalhados num cesto de lixo.
(...)
Brogan demonstrava sua preocupação... Perguntou se ela não queria jantar com eles porque era isso o que fariam... Maria disse que comera sanduíches de queijo... Depois ele quis saber onde ela dormiria, e ela respondeu que passaria a noite acordada porque tinha tomado muitas xícaras de café... Maria emendou que só passaria a noite ali se a companhia estrangeira fosse mandada embora...
Ele divertiu-se com a exigência estapafúrdia... Mas Anne ficou pensando sobre como ele ficaria livre para curtir várias mulheres livres que o admiravam depois que ela se fosse...
(...)
Maria voltou-se para Anne e pediu que ela fosse embora, pois já fazia dez anos que eles não se viam... Lewis acabou com a graça ao dizer que Anne não sairia porque ela morava ali, já que eram casados... Depois disso, Maria bebeu do chianti abocanhando o gargalo da garrafa e pediu uma navalha... Depilou pernas e axilas ali mesmo enquanto dizia que estava pronta para se casar com um negro, pois “trabalhava como um deles”.
(...)
Maria terminou a tarefa a que se impôs... Brogan fez questão de acompanhá-la.
Logo ele estaria de volta... Tempo suficiente para Anne fumar um cigarro e pensar naquele tipo estranho, evidentemente egresso de algum asilo psiquiátrico... A francesa arrumou a mesa e ficou a imaginar como seria a sua conversa com Lewis...
De fato, Brogan retornou dizendo que colocou Maria num táxi que a levaria ao manicômio de onde tinha saído à tarde daquele dia.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço
Prof.Gilberto

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