sexta-feira, 2 de maio de 2014

Considerações sobre “Os caminhos da luxúria”, de Milena Fernandes Maranho para a Revista de História da Biblioteca Nacional, nº 93 – a colônia tropical, lugar de pecado; livro V das Ordenações Filipinas; inquisição e confissões de mulheres e padres. Parte II

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/05/consideracoes-sobre-os-caminhos-da.html antes de ler esta postagem:

Vimos que a liberdade sexual na colônia portuguesa incomodava os religiosos jesuítas, que entendiam que a libertinagem precisava ser contida... Depreende-se que ela significava séria ameaça ao poder institucional que se pretendia estabelecer e à Igreja Católica... Assim, não é por acaso que a missão jesuítica colocava-se para além da catequese.
Maranho afirma que, apesar das sérias ameaças (inquisição podia resultar em remoção para a metrópole e morte na fogueira), “os primeiros colonos se deliciaram”.
A professora cita Ronaldo Vainfas e o seu Trópicos do pecado (livro lançado em 2010) para destacar que o juízo que se fazia era dos mais aterradores... Já que para os padres tudo o que representasse “modo indígena de viver” era demoníaco, os colonos não podiam se assemelhar a eles.
Os jesuítas entendiam que “o pecado estava em todas as gentes e lugares”. O quadro que vislumbravam evidenciava “ameríndios luxuriosos, colonos insaciáveis (...) senhores desregrados”.
A Igreja demonstrava que tinha poder de intimidar...
Para os índios, o teatro montado pelas autoridades não tinha significado algum... Os padres e os inquiridores exigiam que os colonos impuros confessassem as suas práticas sexuais (e elas eram diversificadas). Mas também esses se sentiam apartados da jurisprudência vigente em ultramar.
(...)
Os caminhos da luxúria esclarece que havia mesmo uma legislação que tratava dos chamados crimes sexuais. O texto destaca que as Ordenações Filipinas (1604; época da União Ibérica) compilou leis de épocas passadas e destacou situações específicas que mereciam investigação e punição severa.
Os trechos da revista que esclarecem delitos e punições previstos no livro V das Ordenações valem o destaque:

O livro V previa punições para os que cometessem o “pecado de sodomia” (sexo anal), o cristão que dormisse com infiel (judeus muçulmanos ou outros “não católicos”), aqueles, incluindo padres, que entrassem “em mosteiro” e tirassem “freira para dormir com ela”, e os que dormissem com suas parentas, como mulheres casadas, virgens, viúvas honestas, além dos bígamos, entre outros casos. As punições variavam: confisco de bens ou sua perda total, tortura até a morte, prisão, degredo ou queima, até os culpados serem “feitos por fogo em pó”. Mas tudo dependia da condição social dos envolvidos.

(...)
Já que no início da ocupação portuguesa em terras no continente americano faltavam mulheres brancas entre os aventureiros, os padres eram condescendentes com a prática do sexo com prostitutas ou escravas índias e negras... Esse tipo de relação “era até permitido”.
Há documentos que revelam confissões e pedido de clemência de mulheres brancas que vieram para o Brasil até o fim do século XVI. Os padres obtinham confissões e a revelação de nomes de outras pessoas envolvidas em “seus ajuntamentos torpes” e suas intimidades pecaminosas. Os caminhos da luxúria dá conta de que normalmente as mulheres queriam fazer crer que haviam sido “falsamente enganadas” por tipos que “lhes queriam mal”.
A Inquisição, através do visitador Heitor Furtado de Mendonça, conseguiu a confissão de Paula Siqueira que, mesmo casada, teria recebido “cartas de amores e requebros” de uma outra, também casada. Os detalhes dão conta de que as duas tiveram um “ajuntamento carnal (...) como se propriamente [fossem] homem e mulher”... Paula Siqueira revela que Filipa de Souza, com quem tivera tais relações, contou-lhe que havia pecado daquela mesma maneira com diversas mulheres “e também dentro de um mosteiro”.
O visitador Mendonça também se escandalizou quando soube de pecados daqueles que deveriam dar exemplo e combater excessos: os próprios padres... O vigário Frutuoso Álvares, que vivia na região do Recôncavo Baiano, por exemplo, cometeu “tocamentos desonestos com algumas 40 pessoas pouco mais pouco menos”.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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